Sociologia muitas vezes é vista como uma disciplina teórica com muito conteúdo no mesmo estilo de lousa, giz e explicação dos professores que outras matérias. Buscando gerar novas experiências às aulas, Tiago Lazzarin Ferreira, que lecionava a disciplina na escola estadual Professor Gualter da Silva, decidiu realizar a sua pesquisa de doutorado no local.
Defendida em 2017, na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, a pesquisa Rap e jazz na escola pública: um estudo sobre a formação cultural e o engajamento estético de jovens do ensino médio, teve o objetivo de analisar se a experiência formativa realizada nas aulas de sociologia do ensino médio, através do rap e do jazz, promoveria o engajamento dos estudantes.
O pesquisador destaca que ambos estilos musicais possuem algumas características em comum como, por exemplo, uma das matrizes do jazz, assim como do rap, é a matriz africana. Ambos estilos também se caracterizam pela improvisação, antifonia — jogo de perguntas e respostas e swing.
Tiago constatou que esses estilos possuem elementos de caráter emancipador e são capazes de promover o engajamento dos alunos. Mesmo com essas características próximas, ele destaca que cada estilo possui suas próprias especificidades e “não podem ser utilizadas como sinônimos”.
O lugar do conhecimento
Apesar do colégio Gualter da Silva ter muitos problemas com relação ao rendimento em avaliações institucionais, o pesquisador diz que não teve dificuldades em inserir as iniciativas da pesquisa na escola. “Era uma escola que qualquer tentativa de ressignificar aquele espaço seria bem-vinda”.
Entre as atividades sugeridas aos estudantes estavam atividades de apreciação musical, debates, produção de relatos em textos e desenhos, além da prática com instrumentos musicais de percussão. As aulas foram montadas junto com as propostas da disciplina de Sociologia, de desenvolver a reflexão e pensamento crítico dos estudantes, de acordo com as Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional — leis que regulamentam todo o sistema educacional público e privado no Brasil.
Nos trabalhos exigidos, os estudantes relataram mudanças de pensamento, transformação na relação deles com a escola e com as outras pessoas. De acordo com o pesquisador, na criação desse “espaço público”, os jovens vivenciaram novas experiências que geraram reflexão e possibilitaram o comprometimento deles a partir do ensino com os estilos musicais de rap e jazz.
Além de desnaturalizar ideias construídas sobre o ensino como, por exemplo, o discurso que alunos devem aprender sentados em sala de aula. Segundo Ferreira, ao propor atividades inovadoras nas aulas, os alunos conseguiram “desprogramar esse tipo de discurso através de gestos artísticos” com o equilíbrio entre prática e teoria.
Além disso, conseguiram extrapolar o conteúdo presente no Caderno do Aluno disponibilizado pelo Governo do Estado de São Paulo. “Durante a aula, o estudante tocando o instrumento e se movendo ele está se desprogramando, olhando e engajando o seu olhar. Assim, ele pode ver os problemas da sociedade”.
O pesquisador relata que a relação com os alunos mudou muito do início da execução do projeto até a sua finalização. Muitos estudantes são vulneráveis socioeconomicamente e a ideia de realizar o trabalho nessa escola era para “desconstruir o discurso que essa escola era a pior”, onde os estudantes eram rotulados e estereotipados o que afetava o aprendizado deles.
A formação cultural por meio do rap e jazz promoveu engajamento, pois proporcionou aos estudantes o contato e envolvimento com músicas, principalmente o rap que já era presente no cotidiano dos jovens. “A escola é o lugar da possibilidade de se engajar, mudar sua visão sobre as coisas, mudar a si próprio, se transformar”. Justamente por constatar esse comprometimento, o pesquisador diz que sua pesquisa abre caminhos de mostrar a outros docentes que é possível realizar outros tipos de atividades em salas de aula da rede pública.
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