Alto consumo de aminoácidos de origem animal pode causar doenças cardiovasculares

Estudo relaciona alta ingestão dos nutrientes a fatores de risco cardiometabólicos, como hipertensão e hipertrigliceridemia

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Uma pesquisa realizada na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP) analisou a relação entre a ingestão de aminoácidos de cadeia ramificada (ACR), nutrientes muito presentes nas proteínas de origem animal, e a possibilidade de se desenvolver doenças cardiometabólicas, como hipertensão e hipertrigliceridemia (nível elevado de triglicéridos no sangue), as quais são fatores de risco para doenças cardiovasculares. O estudo, de autoria da pesquisadora Ana Carolina Pallottini, encontrou uma relação positiva entre o alto consumo do grupo de aminoácidos e a presença dessas doenças. Na dieta da população analisada, a carne vermelha foi a principal contribuinte na ingestão desses nutrientes.

Em sua pesquisa, a nutricionista avaliou os dados de 591 indivíduos adultos e idosos –  escolhidos de forma aleatória – fornecidos pelo Inquérito de Saúde do Município de São Paulo (ISA Capital 2008). Esse estudo é realizado pela Secretaria Municipal de Saúde e avalia, entre outros aspectos, condições de vida e situação de saúde dos moradores do município. A pesquisadora associou essas informações aos resultados de sua pesquisa de campo, que consistiu em entrevistas sobre a dieta dessa população, coleta de amostras de sangue e medida de dados antropométricos (peso, estatura, circunferência de cintura e pressão arterial). Os resultados mostraram que os indivíduos analisados consumiam uma mediana de 175 mg por dia dos aminoácidos em questão. Além disso, 36,4 % possuíam pontos de corte para a presença de hipertrigliceridemia e 57,7%, pontos de corte para a presença de hipertensão arterial. Após análises estatísticas, Ana encontrou uma associação positiva entre os indivíduos que consumiam maiores quantidades dos aminoácidos e a presença dessas doenças.

Os aminoácidos são nutrientes biologicamente importantes, pois desempenham papéis metabólicos e fisiológicos nos seres humanos, além de serem parte fundamental na estrutura das proteínas. Dentre os vinte principais, nove são considerados essenciais, incluindo os três de cadeia ramificada: a leucina, a isoleucina e a valina. Em relação a esses, que foram a base da pesquisa, seus principais papéis são a síntese de proteínas musculares, a produção de energia e de diversos neurotransmissores. Como não são produzidos naturalmente pelo organismo humano, eles devem ser adquiridos através da dieta, e suas principais fontes são as proteínas de origem animal.

Em seu estudo, a nutricionista descobriu que, na população analisada, o alimento que mais contribuiu na ingestão desses aminoácidos foi a carne vermelha. De acordo com referenciais teóricos que serviram de base para sua pesquisa, 75% dos indivíduos de São Paulo consomem em média 73,4 gramas de carne por dia, excedendo a recomendação do American Institute of Cancer Research de 500 gramas por semana. Entretanto, para ela, a população não deve evitar seu consumo, mas tomar cuidado com o excesso: “a carne vermelha tem nutrientes fundamentais, chaves para a saúde humana, mas o excesso pode ocasionar várias doenças importantes e que têm gastos em saúde pública altíssimos.”

Quando as proteínas entram no sistema digestivo humano, elas são quebradas em aminoácidos, que entram para a circulação sanguínea. Logo, quanto maior o consumo de proteínas, maior a concentração de aminoácidos no sangue. A pesquisadora explica que a alta concentração de aminoácidos de cadeia ramificada pode estar associada à alta produção de células adiposas, que podem desencadear o aumento de triglicérides no sangue, levando à hipertrigliceridemia. Isso contribuiria para a oxidação dessas células e um subsequente desarranjo dos vasos sanguíneos devido à destruição das estruturas das membranas celulares, aumentando, assim, as chances de surgimento de hipertensão arterial. Essas condições podem levar a doenças cardiovasculares mais graves, como infarto e o AVC (acidente vascular cerebral). Contudo, a nutricionista ressalta que o processo descrito não é, obrigatoriamente, uma relação de causa e consequência: “a nossa hipótese é que o alto consumo leva a essas condições, mas pode ser que essas disfunções metabólicas já estejam presentes no organismo”, afirma.

Para Ana, a importância de seu estudo se deve, entre outros motivos, à escassez de pesquisas relacionadas ao tema. “Esses aminoácidos só têm sido estudados com outro tipo de população, como desportistas e atletas. Então, quando começamos a analisá-los na dieta da população, já temos algo inovador. E se a carne vermelha é o alimento de maior contribuição na ingestão desses aminoácidos na dieta dos residentes de São Paulo, verificar o quanto a população em geral consome desse alimento pode prevenir essas doenças.”

A pesquisadora afirma que os indivíduos não possuem conhecimento sobre os riscos de se consumir carne vermelha em excesso, e que políticas públicas se tornam necessárias para mudar esse cenário: “É importante alertar a população, porque as pessoas não tem noção do que é consumir esse alimento em excesso todos os dias. Faz parte do padrão alimentar brasileiro. Logo, é necessário fazer um incentivo através de informação, trazendo esse alimento não como um vilão, e sim como um contribuidor para a saúde, mas a ser consumido com moderação”, conclui.

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