Grupo de pesquisas busca entender ciclos de hormônio humano

Pesquisadora do ICB estuda efeitos de Síndrome de Smith Magenis em diversos ritmos do organismo

A pesquisa de Clarissa é realizada no Instituto da Criança do Hospital das Clínicas

Um projeto coordenado pelo professor José Cipolla Neto, do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP), busca estudar mais os aspectos metabólicos ligados à produção de substâncias e hormônios no corpo humano. Em estudos desenvolvidos em ratos e outros animais, foram encontradas alterações no perfil metabólico ligadas à baixa produção de melatonina.

Caracterizada como um hormônio produzido pela glândula pineal, a melatonina apresenta diversas funções no organismo. Além da função endócrina, característica dos hormônios, possui também uma ação antioxidante na célula. “A sua ação mais evidente, porém, é que ela pode funcionar como marcador temporal interno, alertando o organismo para que ele saiba quando se está de dia e quando se é noite”, afirma Clarissa Bueno, do Serviço de Neurologia Infantil do Hospital das Clínicas e uma das pesquisadoras dentro do projeto, que também conta com a parceria de muitos outros institutos dentro da USP, como a Faculdade de Medicina e o Instituto de Psicologia. Segundo ela, o hormônio pode  exercer essa função porque a sua produção é fortalecida durante a noite e inibida nas horas claras. “Dessa forma, o corpo fica sabendo, através da quantidade de melatonina no corpo, em qual período do dia ele se encontra”.

De maneira mais particular, o estudo de Clarissa se voltou mais para os pacientes que apresentaram a chamada Síndrome de Smith Magenis, uma doença geneticamente determinada que afeta o Cromossomo 17, levando o portador a apresentar deficiência intelectual, distúrbios comportamentais e distúrbios do sono. Segundo ela, estudos anteriores já haviam comprovado que pacientes com essa síndrome apresenta alterações no ciclo da melatonina. “Normalmente, a produção ocorre durante a noite e, durante o dia, ocorre uma fotoinibição que torna os níveis do hormônio pequenos ou quase inexistentes”, explica. “Nos pacientes, a produção permanece durante a fase clara do dia, podendo, inclusive, ocorrer uma inversão e a inibição ocorrer durante a noite”. A produção de melatonina na fase clara, segundo estudos, é a principal causadora dos distúrbios de sono, levando a um sono fragmentado, despertares noturnos e levando as pessoas a dormirem durante o dia.

A pesquisa de Clarissa é realizada no Instituto da Criança do Hospital das Clínicas. Fonte: http://hcfmusp.org.br/portal/wp-content/uploads/2012/12/fachada_icr_hc.jpg

Devido à função da melatonina de marcar o tempo do organismo, a pesquisa de Clarissa acredita que a substância esteja associada à alteração no cromossomo 17 causada pela Síndrome de Smith Magenis, que já se sabe, afeta os mecanismos de sinalização intracelular. O trabalho dos pesquisadores, então, tem sido procurar o mecanismo que associa a mutação no cromossomo à mudança no ciclo do hormônio e, a partir disso, se tal problema pode comprometer outros ciclos naturais do organismo. “Já sabemos, mediante um outro estudo, que a síndrome não afeta o ciclo do cortisol, mas queremos fazer testes para alterações em ciclos como o da temperatura, secreção de substâncias, entre outros ritmos”, exemplifica a pesquisadora.

Para determinar se os pacientes com Síndrome de Smith Magenis possuem possuem distúrbios nos ciclos naturais, uma série de testes é realizado. O primeiro deles é o da reflexão pupilar, na qual o olho é submetido a um repouso no escuro, seguido por um flash de luz vermelha. Um segundo repouso é imposto, e então acionam um flash de luz azul. Após cada flash, mede-se a contração da pupila. “O objetivo é verificar a reação da pupila, o que é útil para entendermos o porquê de a produção de melatonina ser mantida durante o dia”, afirma Clarissa. O segundo teste é a monitorização de outros ritmos biológicos através de um sensor colocado no pulso do paciente, para garantir que a síndrome não afetará esses outros ciclos. No terceiro passo, coleta-se melatonina salivar para análise, com o objetivo de saber o quanto seu ciclo está afetada. A etapa final consiste na polissonografia, estudo que mede a atividade durante o sono e avalia por que os indivíduos não possuem redução do hormônio durante o dia. “Nossa melhor hipótese  é de que não ocorra fotoinibição nos pacientes afetados”, afirma a pesquisadora. “Suspeitamos de que haja uma alteração na via entre a retina e a glândula pineal que impede a inibição”.

 

Apesar de a Síndrome não possuir uma cura conhecida, Clarissa está confiante de que os avanços no entendimento de como a doença opera e afeta os ritmos do organismo pode levar a uma melhoria dos tratamentos existentes. “Atualmente, dá-se melatonina durante a noite para suprir a carência e betabloqueadores durante o dia para inibir a substância”. Ela afirma que quanto melhor entendermos as alterações nos ritmos do indivíduo, melhor chance temos de buscar melhores formas de inibir os sintomas da doença ou mesmo de saná-la por completo, mas esse processo ainda está longe de acontecer e depende de muita pesquisa ainda por ser realizada.

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