USP conduz instalação do único radiotelescópio capaz de enxergar o Sol

Em parceria com a Argentina, projeto vai inserir o Brasil em um novo patamar da observação astronômica

Telescópio APEX, modelo que similar ao desenvolvido pelo Llama. AUN/Llama
Telescópio APEX, modelo que similar ao desenvolvido pelo Llama. AUN/Llama

A USP lidera um projeto de colocação e uso de um moderno radiotelescópio (chamado Llama), em parceria com instituições argentinas e com financiamento da Fapesp. Com previsão de funcionamento já para o fim de 2017, o equipamento será instalado do lado argentino da fronteira com o Chile e deve proporcionar melhoras no conhecimento e pesquisa astronômicos brasileiros.

O equipamento funciona como uma grande antena parabólica, que capta sinais do espaço em sua superfície, concentra-os em seu meio e em seguida as informações são passadas a um computador.

Diferentemente dos telescópios tradicionais, os radiotelescópios captam as impressões do céu através de ondas das mais variadas formas, passando por frequências de rádio ou até mesmo luz visível. Os telescópios óticos, por sua vez, limitam-se a essa última faixa, projetando as imagens que somos capazes de ver.

O radiotelescópio não é, propriamente dito, um formador de imagens reais. É possível produzi-las, desde que utilizemos um conjunto desses aparelhos e cruzemos seus dados relacionados a frequências e faixas de luz. Entretanto, na maior parte do que é gerado por esses telescópios, as cores são criadas por computadores, a partir da voltagem das ondas captadas, simplesmente ilustrando outros parâmetros que não o mero aspecto visual”, explica o professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP (IAG) e coordenador do projeto, Jacques Lépine.

Com custo orçado em US$ 10 milhões, além das reservas técnicas, o radiotelescópio será bancado exclusivamente pelo Brasil, já que a Argentina está cedendo o espaço e a logística necessária, com a construção de estradas, por exemplo.

A grande antena foi produzida na Alemanha e aguarda a resolução de trâmites burocráticos para chegar à América do Sul. A instalação será no deserto argentino, próximo ao trópico de Capricórnio e ao território chileno. Em uma altitude de 4800 metros acima do nível do mar, o local é propício para observações astronômicas, visto que há pouca interferência humana, climática ou atmosférica.

Mapa compara localização do radiotelescópio, na fronteira entre Chile e Argentina. AUN/Llama

Além de Brasil e Argentina, a Holanda é outra parceira do Llama, pois fornece aporte científico e financeiro para os coordenadores. Para Lépine, embora os europeus não sejam sócios, “a tendência é que eles possam também usufruir do radiotelescópio, por uma questão de cortesia”.

 

Perspectivas

O projeto possibilitará ao Brasil expandir sua visão no campo astronômico, assim como já fazem diversos países desenvolvidos. Segundo Lépine, o conhecimento é, antes de tudo, o grande objetivo de todo o esforço para a instalação do telescópio.

A ciência anda por caminhos que se juntam. Primeiramente, o telescópio é importante para possibilitar que observemos, pesquisemos e elaboremos ou confirmemos hipóteses no campo astronômico. Estamos trabalhando com uma enorme faixa de frequência, que há de ter muito a nos revelar”.

Sobre a expectativa de descobertas, o coordenador destaca dois pontos principais em que o telescópio será útil. “As duas grandes perspectivas que temos são a de estudar um possível buraco negro no centro da nossa galáxia, a Via Láctea, conforme prevê a Teoria da Relatividade de Einstein, e a de detectar moléculas presentes no Universo, a partir de cálculos prévios de suas frequências, ou de descobri-las, caso não conheçamos nada que emita uma frequência similar”.

Outro ponto de destaque do Llama é que ele será o único radiotelescópio capaz de “enxergar” o Sol. Normalmente, os equipamentos do tipo não podem ser voltados para nossa estrela, já que refletem e concentram sua luz, elevando a temperatura do aparelho, comprometendo-o e chegando a derretê-lo.

No caso do Llama, ele foi construído com uma superfície boa para comprimentos de onda não visíveis, captando-as com muita eficiência, mas ruim para a frequência de luz visível, o que o faz captar uma quantidade menor desse tipo de onda, favorecendo o funcionamento do telescópio e evitando seu desgaste”, conta Lépine.

Detalhe da superfície do telescópio, produzido na Alemanha. AUN/Llama

Embora ainda de maneira incerta, projeta-se que o Llama deve trazer benefícios para outras áreas da ciência brasileira que não a astronomia. Os receptores do telescópio, por exemplo, que convertem a radiação recebida em informações eletrônicas, estão sendo produzidos no país e podem ser usados em campos diversos da sociedade, como medicina e segurança pública. O potencial de aplicação da ciência sempre existe, embora ele seja posterior ao intuito primário, que é o conhecimento”.

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