Lei do Ventre livre não tinha reais intenções abolicionistas

Segundo pesquisadora, crianças livres contempladas pela lei permaneciam trabalhando nas lavouras nas mesmas condições dos escravizados

Na época em que a lei foi promulgada, havia no Brasil cerca de 1,5 milhão de escravos. Foto: labrys.net/Reprodução

Por Victoria Damasceno – damascenovictoria@gmail.com

Uma pesquisa realizada pela mestre em Educação Daniela Portela revelou que o governo paulista não cumpriu com as obrigações impostas a ele por meio da “Lei do Ventre Livre”. Também conhecida como “Lei Rio Branco”, foi assinada em 28 de setembro de 1871 pela princesa Isabel, como resposta às revoltas abolicionistas brasileiras vindas de correntes internacionais.

O objetivo da lei era possibilitar o processo de abolição da escravidão de forma lenta e gradual. Portela conta que as crianças nascidas a partir daquela data teriam uma condição “jurídica” diferente das outras crianças negras, o que tornou necessário ajustes do Estado para “compor esta nova categoria da infância brasileira”.

Histórico

A medida veio da pressão inglesa pelo fim do tráfico de escravos, que desde a proclamação da independência do Brasil, os ingleses exigiam que o governo tomasse medidas para acabar com o tráfico e consequentemente com a escravidão.

A lei permitia que crianças negras nascidas de mulheres escravas a partir da data de publicação da lei não poderiam ser escravizadas. Sendo livres, a partir dos 8 anos de idade a criança poderia ser entregue aos cuidados do Estado ou permaneceriam sob os “cuidados” dos escravocratas.

Para isso, foi realizado o Congresso Agrícola de 1878, que oito anos depois da promulgação da lei se propôs a discutir como inserir formas “de socializar este novo sujeito social de forma que a hierarquia presente no sistema escravista fosse mantida”, afirma Portela.

Na época, toda a economia brasileira estava diretamente voltada para a produção agrícola. A pesquisadora conta que era necessário discutir como adequar as crianças negras livres a trabalharem na produção agrícola.

No Congresso também foi discutido quais mecanismos seriam utilizados para a educação dessas crianças, bem como quem seria responsável por isso.

Direitos

Portela afirma que pouco foram as iniciativas de caráter público destinadas ao atendimento das crianças negras livres vindas famílias escravizadas. “Na província de São Paulo, os dados angariados apontaram a inexistência de iniciativa públicas”.

As únicas iniciativas existentes não partiam de instituições do Estado ou com relação direta com o governo. Segundo Portela, os atendimentos públicos eram sempre realizados por meio iniciativas privadas, que variavam entre a esfera “individual, religiosa ou comercial”.

A pesquisadora conclui que as crianças negras livres permaneceram trabalhando nas lavouras nas mesmas condições das crianças escravizadas. “É possível identificar uma omissão do Estado Brasileiro que assegurasse a nova condição jurídica dessas crianças [negras] que nasciam livres”, afirma.

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