
No começo deste ano, a Agência USP de Inovação entrou com um pedido de patente junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi) para um remédio desenvolvido por pesquisadoras da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo. Seu diferencial é ser um anti-inflamatório para cães composto por nanocristais.
Em 2021, Luiza de Oliveira Macedo, farmacêutica pela UFRRJ (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro), começou seu doutorado na Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP (Universidade de São Paulo), orientada pela professora Nádia Araci Bou Chacra, que já pesquisava a área de nanotecnologia para fármacos. Elas receberam uma proposta da iniciativa privada, a Laboratórios Duprat, indústria farmacêutica veterinária, para aplicarem essa tecnologia em um de seus remédios: o firocoxib.
Esse medicamento é um comprimido oral mastigável feito a partir de um princípio ativo anti-inflamatório usado no tratamento das dores causadas pela artrose em cães. Luiza explica que essa é uma doença crônica, ou seja, que não tem cura, associada ao envelhecimento dos animais e que prejudica muito sua qualidade de vida: “Esse fármaco tem ganhado destaque porque hoje em dia os tutores têm cuidado mais dos seus cães, que estão envelhecendo, então é um tratamento que o animal utiliza para o resto da vida. O problema é que ele não é muito solúvel no organismo”.
De acordo com a pesquisadora, essa baixa solubilidade faz com que o processo de dissolução e absorção no organismo seja mais lento, o que significa que os efeitos também demoram mais para ocorrer. Por isso, a Laboratórios Duprat trouxe essa demanda para Nádia e Luiza: aumentar a solubilidade do firocoxib por meio da nanotecnologia.
Essa técnica consiste em reduzir o tamanho de determinada partícula até a escala nanométrica. “Normalmente você tem os fármacos na faixa de 20 a 50 micrômetros. Aí você reduz isso para escala nanométrica. No nosso caso, 250 a 270 nanômetros”, explica Nádia. “Quando você faz isso, algo surpreendente acontece: algumas características do fármaco se alteram, como, por exemplo, a solubilidade de saturação e a velocidade de dissolução.”
Metodologia, resultados e expectativas futuras
Além da Laboratórios Duprat, a pesquisa contou com apoio da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e da Capes (Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior). A primeira etapa foi transformar o firocoxib em cristais nanométricos. Para isso, foi utilizada uma espécie de moinho de laboratório que reduziu o tamanho da partícula inicial em aproximadamente 90 vezes. Luiza explica que, como tal processo nunca havia sido feito com esse fármaco, essa etapa levou quase um ano entre tentativas e erros para encontrar substâncias e concentrações corretas que mantivessem os nanocristais estáveis.
A segunda etapa foi testar o produto em microrganismos vivos, como larvas de insetos, a fim de garantir que os nanocristais de firocoxib não apresentassem nenhuma toxicidade. Só depois foram realizados testes em cães, o público alvo do estudo. Os resultados dos testes foram surpreendentes até para Luiza: “Não teve nenhum efeito adverso e, comparando com a dose do produto convencional, o nanocristal atingiu o dobro de concentração no sangue em metade do tempo.”
Isso significa que, por serem partículas menores, os nanocristais conseguem se dissolver no organismo de forma mais acelerada do que o firocoxib tradicional, o que garante uma concentração maior do princípio ativo anti-inflamatório na corrente sanguínea do animal, propiciando um alívio mais rápido da dor.
“Esses resultados indicam que os nanocristais de firocoxib podem melhorar significativamente a qualidade de vida dos cães, representando um avanço importante na medicina veterinária.”
Luiza de Oliveira Macedo
Enquanto aguarda a patente, Luiza vem trabalhando para a transferência de tecnologia para a Laboratórios Duprat, aumentando sua pesquisa de laboratório para a escala industrial, com o objetivo de que, daqui alguns anos, os nanocristais de firocoxib já estejam disponíveis nas farmácias. Ela também acredita no potencial da nanotecnologia para todo o mercado farmacêutico, inclusive em diferentes medicamentos para humanos.
Faça um comentário