Cientista da USP identifica microplásticos no cérebro

Pesquisa realizada com a Faculdade de Medicina encontrou fibras e partículas do polímero em 8 das 15 amostras coletadas

Microplásticos podem entrar no cérebro através das vias olfatórias. Crédito: Pexels

Os plásticos estão presentes em tudo que os humanos consomem, como em embalagens de alimentos, garrafas e em vestimentas. Após o descarte, resíduos desses materiais sofrem com a ação da chuva, do sol e do vento. Como consequência, essa degradação faz com que os polímeros se infiltrem no meio ambiente na forma de microplásticos — partículas de plásticos que medem menos de 5 milímetros.  

Uma pesquisa liderada por Thais Mauad, da  Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), em parceria com o pesquisador Luis Fernando Amato-Lourenço, da Universidade Livre de Berlim, detectou microplásticos no cérebro humano. 

O estudo publicado na Jama Network, revela que fragmentos de microplásticos foram encontrados no bulbo olfatório — região que desempenha a função de processar os odores no sistema nervoso central. 

Para realizar a pesquisa, foram analisados os cérebros de 15 indivíduos falecidos, que tinham em média 69,5 anos. “Estudamos o cérebro de pessoas que moravam em São Paulo e que iam ser submetidas a rotina de autópsia. Solicitamos o consentimento das famílias e do comitê de ética, para analisar o bulbo olfatório que é um órgão do cérebro responsável pelo processamento dos odores”, disse Mauad. 

“A gente acreditava que nesse órgão, muito conectado com o nariz e localizado na base do crânio, poderia ter uma translocação de microplásticos pela via inalatória”, acrescenta. Durante a análise, foram identificadas 25% de fibras e 75% de  partículas de microplásticos em 8 das 15 amostras coletadas dos cérebros. O tipo de plástico mais encontrado, foi o polipropileno (43,8%) — material rígido e resistente. 

O estudo ainda não é capaz de identificar se os microplásticos que chegam ao bulbo olfatório são responsáveis por agravar ou contribuir com casos de doenças neurodegenerativas, como Parkinson e Alzheimer, que também afetam áreas olfatórias. Por outro lado, foi possível analisar suas implicações nos animais. 

“O que a gente sabe que em animais o  microplástico tem um potencial neurotóxico. Através da comida, ele consegue chegar no cérebro, pela barreira hematoencefálica, se acumulando em vários locais, gerando algumas alterações neurotóxicas nesses animais”. Evidências das implicações neurotóxicas nos animais, mostraram possíveis alterações no comportamento e em enzimas que regulam os neurotransmissores.  

A pesquisa não contempla as implicações dos microplásticos no cérebro na saúde a longo prazo, mas Mauad citou um estudo publicado no New England Journal of Medicine, que aborda essa relação. 

“Um grupo de italianos, que estudaram placas aterosclerose que tem nas artérias carótidas, pois devido a obstrução, essas placas são retiradas para desobstruir o fluxo para o cérebro e eles acharam microplásticos nas placas. Acompanharam essas pessoas durante 30 meses e viram que elas tinham mais chance de ter infarto agudo do miocárdio, acidente vascular cerebral (AVC) e até mesmo morrer por qualquer causa. É a primeira associação adversa encontrada, dos microplásticos em relação a humanos”, explica Mauad. 

Devido ao cercamento de plásticos que todas as pessoas estão inseridas, Mauad alerta: “A indústria alimentícia nos oferece comida embrulhado em plástico, a gente não tem muita escolha. Mas tente tirar o plástico da cozinha, evitar tupperware, tomar cuidado com o que coloca no microondas e no lava-louças porque as embalagens soltam microplásticos”. 

“Cada vez que você compra uma comida embrulhada em plástico, ela está fazendo mal para a sua saúde, além de estar gerando um tipo de lixo que não é reciclado. A maioria dos plásticos que estão na nossa vida não são recicláveis. O plástico é mais uma das falácias que a indústria impôs, assim como do cigarro e das mudanças climáticas, então, a pessoa acha que ao reciclar a consciência ambiental dela está limpa e não é isso.”, afirma Mauad. 

Além disso, a pesquisadora reforça a necessidade da intervenção dos órgãos governamentais para mudar o cenário do uso excessivo de plástico. “A população precisa forçar políticas públicas de redução de plásticos. A indústria obviamente não vai fazer nada, mas o poder público pressionado pela opinião pública pode fazer. Em muitos lugares do mundo, o plástico de uso único já foi abolido, mas aqui em qualquer lugar tem isopor e plásticos. Temos que pensar nas consequências a nível ambiental, nos animais, nos oceanos que já está aterrorizante e que vai culminar em sequelas nos humanos inevitavelmente”. 

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