Estudo revela vulnerabilidades de imigrantes venezuelanas prostituídas no Brasil

Novo estudo realizado pela Universidade de São Paulo comenta o impacto da crise socioeconômica venezuelana, expondo a complexa realidade das imigrantes que se prostituem no Brasil e destacando as formas de violência que enfrentam

Em Boa Vista, rota de entrada de imigrantes venezuelanos, muitos deles vivem em situação de extrema vulnerabilidade social. Imagem: Reprodução/Adobe Stock

Estudo da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo analisa as consequências do fenômeno de feminilização do processo emigratório venezuelano. Há uma alta de mulheres jovens e solteiras deslocando-se de seus lares com destino ao Brasil, em busca de trabalho. Porém, de acordo com a pesquisa, ao se deparar com a escassez de empregos formais, parte dessa população recorre à prostituição para sobreviver.

A crise socioeconômica e política na Venezuela da última década resultou em fenômenos como hiperinflação e escassez de alimentos, levando muitos em busca de melhores condições no Brasil. Uma das rotas mais movimentadas passa por Boa Vista, no estado de Roraima, onde a chegada em massa de imigrantes sobrecarrega serviços básicos, como saúde, educação e moradia. Apesar da presença de abrigos para alocar parte do contingente de venezuelanos, muitos vivem nas ruas e praças em situação de extrema vulnerabilidade social.

A parcela feminina dessa população acaba enfrentando não apenas fragilidade econômica, mas também preconceito e estigmatização, xenofobia e misoginia.

“Fizemos essas entrevistas, e os resultados mostraram quais eram os principais tipos de violência que elas sofriam, um pouco do cotidiano delas”, conta o professor e pesquisador Loeste de Arruda Barbosa. A pesquisa é sua tese de pós-doutorado na área de saúde coletiva, com orientação da professora Maria Amélia de Campos Oliveira, da Escola de Enfermagem da USP.

“É não só um recorte de gênero, mas um olhar interseccional, uma análise em cima de raça, etnia, e questão social. Todas essas categorias se sobrepõem em muitos momentos e contribuem para os tipos de violência que elas sofrem”, conta o pesquisador Loeste de Arruda Barbosa. Imagem: Reprodução/Adobe Stock

O estudo, que incluiu entrevistas com 15 mulheres imigrantes dependentes da prostituição como fonte de renda, revela que a maioria delas não se sente satisfeita com a atividade, mas vê nela uma solução para a pobreza extrema. “Um dia, não aguentei mais. Meus filhos me diziam: Mamãe, estou com fome. Era tanta que lhes doía o estômago. Eu não tinha nada para dar a eles. Eu consigo aguentar, mas eles não”, relatou uma das entrevistadas na pesquisa. O ganho mensal das trabalhadoras ouvidas é de cerca de R$ 1.600, embora muitas tenham relutado em discutir sua renda.

Simultaneamente, foi realizada uma pesquisa documental em portais de notícias reconhecidos, como UOL, G1, R7 e Folha de S. Paulo, e também no jornal local Folha de Boa Vista, abrangendo publicações de 2015 a junho de 2022, ano em que a migração venezuelana para Roraima aumentou. 

Las ochentas

Em Boa Vista, as trabalhadoras venezuelanas são pejorativamente chamadas de “las ochentas” devido ao preço médio de R$ 80 por programa sexual. Acabam sendo vistas como intrusas, em um estado que apresenta altas taxas de feminicídio e violência de gênero. A opressão contra profissionais do sexo em Roraima reflete um padrão global, com realidades semelhantes observadas em outros países.

As falas das entrevistadas e o conteúdo das reportagens revelam que os agressores são, na sua maioria, homens brasileiros. Os dados mostram que essas mulheres enfrentam diversas formas de violência – verbal, financeira, psicológica; a violência física em destaque como a mais temida, e a exploração sexual por terceiros, como proprietários de casas noturnas, é uma preocupação constante.

O professor Loeste aponta na pesquisa para a necessidade de uma análise interseccional que considere classe social, gênero e raça-etnia para entender a origem desses problemas. Reconhecer essas complexidades contribui para oferecer cuidados de saúde mais adequados para esta população vulnerável. 

O estudo na íntegra está disponível no link.

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