Estudo da USP revela fatores de prevalência dos casos de demência em países latino-americanos

Cerca de 50% dos casos de degeneração cerebral na América Latina poderiam ser evitados; causas têm relação com o envelhecimento populacional e a baixa escolaridade

Um estudo publicado no The Lancet Global Health e conduzido em conjunto com a Faculdade de Medicina da USP (FM), tentou descobrir a proporção de incidência de 12 fatores de risco evitáveis associados à demência na América Latina. No mundo, 40% dos casos da doença estão ligados a essas condições. 

Para realizar o estudo, os cientistas coletaram dados de sete estudos contendo medições de 12 fatores de risco evitáveis de demência: menor escolaridade, perda auditiva, hipertensão, obesidade, tabagismo, depressão, isolamento social, inatividade física, diabetes, consumo excessivo de álcool, poluição do ar e traumatismo cranioencefálico. 

A amostra de dados analisados incluiu entre 5.995 e 107.907 participantes maiores de 18 anos oriundos da Argentina, Brasil, Bolívia, Chile, Honduras, México e do Peru. 

“Baseado em dados de estudos realizados principalmente em países ricos, como Estados Unidos e países da Europa, em 2020, a Comissão Lancet elencou 12 fatores de risco modificáveis para demência”, conta Claudia Suemoto, líder da pesquisa e professora de Geriatria da FM. 

“Neste trabalho, foram utilizadas técnicas de metanálises (que são estudos bem robustos) e encontradas evidências da associação entre esses fatores e a demência”, expõe Suemoto. A metanálise é um método estatístico que combina resultados de diferentes estudos feitos. “O que fizemos foi analisar os dados de sete países latino-americanos de forma conjunta, que não tinham sido estudados antes”, acrescenta. 

No Brasil, a proporção de casos de demência relacionados com os 12 fatores modificáveis é de 48,2%. Nos sete países latino-americanos, os principais fatores de risco para o desenvolvimento de demência estavam relacionados com os fatores de obesidade, inatividade física e depressão. A concentração de problemas cognitivos em países em desenvolvimento está relacionada com o envelhecimento populacional. 

“Uma grande parte da população idosa ou que está envelhecendo vive em países populosos como Brasil, México e Índia”, afirma Suemoto. 

“Ao contrário dos países ricos, que passaram por um processo de envelhecimento ao longo de muitas décadas, o Brasil enfrentará um envelhecimento acelerado nos próximos anos”, salienta Suemoto. “Embora o envelhecimento seja uma conquista, ele também traz alguns problemas, especialmente quando ocorre rapidamente, como é o caso do aumento significativo dos casos de demência”. 

Para contornar esses fatores de risco, ações individuais e governamentais podem ser feitas. Segundo Suemoto, o indivíduo pode melhorar os índices de obesidade através de uma dieta equilibrada e com o aumento da realização de atividade física. Mas ela ressalta que no caso da depressão um médico deve ser procurado. 

“Do ponto de vista das ações governamentais, várias medidas podem ser tomadas. No que se refere à inatividade física, já houve no passado campanhas que estimularam a população e forneceram informações sobre os níveis ideais de atividade física, incentivando a prática de, pelo menos, 150 minutos de atividade moderada por semana”, explica Suemoto. “Outra ação importante é a criação de espaços públicos, especialmente em regiões como São Paulo, que possibilitem a prática de atividades físicas, já que muitas pessoas não se exercitam por falta de locais adequados”. 

A baixa escolaridade é um dos fatores que podem contribuir com o desenvolvimento de demência. A condição está relacionada com questões cognitivas e com a baixa renda. De acordo com Suemoto, a escolaridade está relacionada ao que chamamos de “reserva cognitiva”, o que significa que para desenvolver demência, existe uma relação entre a quantidade de reserva cognitiva e as lesões acumuladas ao longo da vida, como as associadas à doença de Alzheimer. “Quando você tem mais lesões do que reserva cognitiva, acaba tendo os sintomas de demência. Portanto, quanto maior a reserva cognitiva, maior a tolerância às lesões”, ressalta a pesquisadora. 

“Além disso, a baixa escolaridade está frequentemente ligada a um menor poder aquisitivo e menor acesso aos serviços de saúde de qualidade”, evidencia a especialista. “Ou seja, também está relacionado a níveis socioeconômicos mais baixos e menor acesso ao diagnóstico e tratamento dos fatores de risco”. 

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