Palestra “Indígenas e a Psicologia” aborda as barreiras entre a ciência e os povos originários

A mesa debateu sobre a necessidade de descolonizar a profissão e garantir a inclusão de pessoas indígenas na psicologia por meio do conhecimento a respeito da espiritualidade, cotidiano e lutas

A semana de psicologia aconteceu do dia 20 a 24 de maio, aberto ao público e gratuito [Imagem: Beatriz Garcia]

No último dia 24, a mesa intitulada Indígenas e a Psicologia promovida pela Semana de Psicologia da USP, recebeu Julieta Paredes Carvajal e Leandro Karaí Mirim, indígenas envolvidos ativamente na luta social dos povos indígenas originários e da descolonização. O evento foi organizado por uma comissão organizadora formada exclusivamente por alunos do Instituto de Psicologia.

Os convidados expuseram questões a respeito das consequências da história dos povos indígenas na ciência do comportamento e processos mentais humanos. “A Psicologia não excluiu os indígenas por completo, mas nos usou e nos estudou nas tradições da medicina de onde nasceu. “Ela cumpriu a função de fazer a dissociação do que é o ‘ser indígena’ porque era vista a partir de uma branquitude”,  explicou Karaí.

A partir dessas perspectiva, o acadêmico indígena e bolsista da Rede de Atenção à Pessoa Índigena, contou a história desse serviço. Diretamente do Departamento de Psicologia Experimental do IPUSP, a Rede busca articular pessoas e pontos de vista envolvidos em comunidades indígenas por meio de projetos de cultura e extensão universitárias. “A Rede Indígena decidiu atuar na extensão porque não está somente dentro da Universidade, mas presta atenção no que há fora dela também”, explicou Leandro, que atua desde 2018 na Rede Indígena e acredita que é importante o encontro entre indígenas para garantir espaços de diálogo e identificação.

O tema da psicologia e os indígenas é abrangente, já que, somente no território brasileiro, existem cerca de 270 povos indígenas com culturas e línguas diferentes. Por isso, eles expuseram questões importantes a respeito do olhar colonialista da ciência e como ele limita os profissionais e os distancia dos pacientes indígenas na Psicologia Clínica, por exemplo.

“Utilize de sua vida e juventude na universidade para acalmar a dor do mundo – Julieta Paredes”

Diante da diversidade que existe na cultura indígena, a ignorância sobre a realidade de uma pessoa indígena revela uma barreira entre os indígenas e a psicologia. “Já procurei psicólogos e, quando me via de frente para um psicólogo não indígena, virava o wikipédia” relatou Karaí. “Precisava ficar explicando tudo porque o profissional não tinha noção nenhuma do que era uma pessoa indígena, e não é isso que estou buscando.”

Em seguida, Julieta Paredes provocou a reflexão dos alunos a respeito do conhecimento dos povos indígenas originários e a ideia de que o conhecimento científico é exclusivamente europeu: “Antes da invasão colonial, nós, povos indígenas originários, já tínhamos conhecimento científico e tecnologia, como a desidratação dos alimentos e a tecnologia astronômica”.

Julieta Paredes, mulher indígena do povo Aymara da Bolívia. Atualmente é responsável pelas relações internacionais do movimento e organização social “Feminismo Comunitário de Abya Yala”, e cofundadora do movimento anarcafeminista “Mujeres Creando” [Imagem: Beatriz Garcia]

Por isso, Julieta defende que os estudantes psicólogos precisam descolonizar as diversas áreas da psicologia para ter elementos de intervenção que sejam encarnados na história e vida dos territórios. “Vocês têm que ter cuidado com a forma que a visão acadêmica transforma vocês, incentivando-os a escreverem teses para adornar as bibliotecas, e não que sirva para a luta dos nossos povos.”

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