Na dissertação Desafios para implementação de mosaicos de áreas marinhas protegidas: estudo de caso do Mosaico de Ilhas e Áreas Marinhas Protegidas do Litoral Paulista, o mestre Caio Tancredi, do Instituto Oceanográfico (IO) da USP fez um balanço dos acertos e erros na implementação das Áreas Marinhas de Proteção Ambiental (APAs) e do Mosaico de Ilhas e Áreas Marinhas Protegidas.
Através de relatos de especialistas, servidores públicos e grupos que foram diretamente afetados pelo projeto, o estudo avaliou os impactos positivos que iniciativas como essa podem ter para o ambiente marinho costeiro e comunidades locais, desde que sejam feitas com participação popular. As APAs marinhas possuem uma área mais abrangente e um foco maior na comunidade e no uso sustentável dos recursos marinhos do que outras unidades de proteção.
Em 2008, a Secretaria de Meio Ambiente do Governo do Estado de São Paulo começou a colocar em prática o projeto das APAs e do Mosaico de Áreas Marinhas Protegidas, que à época gerou muita polêmica e discussão entre as comunidades do litoral paulista e grupos econômicos que atuam na região. As audiências públicas que ocorreram para discutir o tema foram marcadas por muitos conflitos.
“Ao longo da história, as Unidades de Proteção Integral [mais restrições à comunidade] foram priorizadas com relação à implementação das Unidades de Uso Sustentável [permissão de atividades econômicas que estimulam a conservação]. Isso foi um motivo de muito temor”. Segundo Tancredi, grupos econômicos de influência na região, como o setor náutico e de pesca, fizeram forte campanha para impedir a construção das APAs marinhas.
Para o pesquisador, problemas como esse poderiam ser mitigados se as políticas públicas fossem implementadas de baixo para cima, com ampla participação popular e das instituições e não como meros projetos “de gabinete”. Ele usa o exemplo dos pequenos pescadores, que no início eram contra as APAs e depois passaram a apoiar as medidas: “Os trabalhadores da pesca artesanal começaram a entender que a implementação do projeto ia favorecer eles, justamente porque seus concorrentes da pesca industrial [que gera maiores impactos ambientais) sofrem mais restrições.”
Importância das redes de áreas protegidas
Caio Tancredi afirma que o diferencial do ambiente marinho é uma interdependência ainda maior entre as diferentes regiões do que no ambiente terrestre. Ele utiliza o exemplo da enorme quantidade de lixo que é encontrado em Santos: “O lixo que é encontrado na praia não necessariamente é aquele deixado pelo turista na própria praia, mas, muitas vezes, é o lixo que é descartado em outras regiões (como nas regiões de mangue que contornam a cidade) e que acabam sendo levados pelo movimento da maré.”
Para o pesquisador, isso é um indicativo da conexão do ambiente marinho e de que não adianta preservar algumas áreas e, ao mesmo tempo, destruir outras. Por isso, ele defende que se pense uma forma de proteção integrada para as áreas costeiras e marinhas e não apenas se importe os modelos que existem nas áreas terrestres: “A gestão marinha tem de ser sistêmica e em larga escala.”
Tancredi afirma que é difícil dizer se houve um avanço na preservação no litoral paulista desde 2008 (quando o projeto das APAs foi proposto). Para ele, ao mesmo tempo que houve o desenvolvimento de novas formas mais sustentáveis de gestão, a pressão “do outro lado” também aumentou, com a ampliação de obras – muitas vezes sem contrapartidas de mitigação de impactos – , crescimento da população, a extração do pré-sal e a falta de saneamento básico.
O pesquisador afirma que o resultado principal de seu estudo foi constatar a importância da participação da sociedade na implementação de políticas públicas e na gestão da biodiversidade: “Quando não tem participação, acaba-se dando mais voz aos conflitos do que aos objetivos do projeto”. E ressalta a importância da integração entre as Unidades de Conservação marinhas e costeiras por meio do Mosaico de Áreas Protegidas para atingir os objetivos de conservação, uma ideia que acabou não sendo levada adiante.
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