Pesquisa da Poli-USP pretende utilizar programa de computador como tecnologia assistiva para reabilitação motora

Programa criado pelo doutorando Gabriel Chaves de Melo seria capaz de auxiliar nos casos médicos em que há a necessidade de reabilitação motora a partir da análise dos sinais de um eletroencefalograma

Exame de eletroencefalograma (EEG) [Foto: Freepik]

Com o aumento do investimento em tecnologia nas últimas décadas, a integração entre humanos e máquinas se mostra maior a cada dia. Aparatos como videochamadas, impressoras 3D e carros autônomos, que antes eram vistos apenas em filmes de ficção científica, hoje estão presentes no dia a dia da sociedade mundial. 

A chamada Interface Cérebro-Computador, ou Cérebro-Máquina (ICM), em inglês Brain Machine Interface (BMI), é outro exemplo de tecnologia inovadora que, até alguns anos atrás, era apenas vista como fantasia. Esse tipo de instrumento funciona como uma ponte comunicacional entre o cérebro humano e algum dispositivo, como um robô. Tal transmissão ocorre com base nos sinais elétricos emitidos pelo órgão cerebral, que podem ser analisados de maneiras não invasivas com uso do eletroencefalograma (EEG), exame em que se colocam eletrodos no couro cabeludo da pessoa; ou de formas invasivas, com a implementação  dos eletrodos diretamente na massa cinzenta por meio de cirurgia.

As ICMs podem ter diversas aplicações, mas são utilizadas principalmente na área da saúde, em neuroreabilitação. Com o objetivo de desenvolver uma nova tecnologia assistiva por meio do uso de uma Interface Cérebro-Máquina, o pesquisador Gabriel Chaves de Melo é autor da tese de doutorado Análise de sinais de eletroencefalograma para Interface Cérebro-Computador visando aplicação em reabilitação motora, orientada pelo professor Arturo Forner Cordero. 

“O eletroencefalograma é um equipamento que mede a atividade elétrica do cérebro. Já a Interface Cérebro-Máquina, como o próprio nome diz, faz uma conexão entre o cérebro e o computador. Do computador, você pode utilizar o que foi medido [pelo eletroencefalograma] para comandar qualquer coisa que você queira, qualquer dispositivo robótico por exemplo”, explica o pesquisador.

De forma simplificada, a ideia da ICM é detectar o que uma pessoa está pensando e traduzir para o computador. No caso do estudo de Gabriel, o objetivo é identificar a vontade do indivíduo de mexer o braço. “Se alguém por algum motivo perdeu o movimento do braço, ao conseguir ‘ler’ o cérebro dela, o computador vai identificar a vontade da pessoa de mexer o braço e fazer com que ele mexa, por exemplo, com um robô”. O doutorando relata que isso pode levar o cérebro a se adaptar e criar novas formas de executar o movimento perdido. Esse fenômeno de adaptação do cérebro é chamado de neuroplasticidade.

Ou seja, um sistema de interface é composto por algum aparelho de medição da atividade cerebral (no caso do estudo de Gabriel, o eletroencefalograma), um computador e, geralmente, algum outro dispositivo, como um robô — que pode ser comandado a partir do computador.

O pesquisador afirma que medir os sinais cerebrais pelo eletroencefalograma é fácil, já que consiste apenas na distribuição de eletrodos na cabeça da pessoa, os quais detectam a atividade elétrica do cérebro. Entretanto, o problema do estudo está na variabilidade do sinal do eletroencefalograma. 

“Os sinais são uma bagunça, têm muitas informações, mas também coisas que nem são informação, são ruídos, ou seja, que não dizem nada. Então eu tenho que fazer um código, um algoritmo, para conseguir, no meio dessa loucura, achar as informações que têm a ver especificamente com a vontade da pessoa de mexer o braço”, explica o pesquisador. Assim, o papel da interface é “limpar” o sinal do eletroencefalograma, realizando contas e operações matemáticas para tentar achar o que é útil.

Outro desafio encontrado por Gabriel foi na resolução espacial do sinal do eletroencefalograma. “Quando você põe o eletrodo em um certo ponto da cabeça, se espera que ele meça o sinal gerado no cérebro naquela posição exata, mas tem um espaço entre o lugar em que o sinal é gerado (superfície do cérebro) e o couro cabeludo, no qual os sinais de diferentes partes do cérebro se misturam”, explica.

Apesar de o trabalho ter sido encerrado na fase da detecção do sinal e não ter sido aplicado, o pesquisador afirma que a ideia de sua tese foi exatamente lidar com esses desafios básicos da área. “Minha ideia foi focar nos problemas mais básicos das ICM. Quis mostrar que, mesmo sem usar recursos tão sofisticados, como inteligência artificial, pode-se ter eficácia na abordagem desses problemas, desde que a estratégia seja bem fundamentada. Como um próximo passo da pesquisa, especialistas em inteligência artificial podem aplicar esses conhecimentos na estratégia proposta e obter avanços ainda maiores”.

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