A regulação de plataformas digitais tem sido um tema cada vez mais discutido no Brasil devido ao aumento da disseminação de notícias falsas e discursos de ódio nas redes sociais. Esse debate permeou as eleições de 2022, quando muitas fake news se espalharam na internet sobre candidatos e o processo eleitoral, e se intensificou ainda mais após os repetidos ataques a escolas pelo país nos últimos dois meses.
Nesse contexto, a tramitação do Projeto de Lei 2.630, conhecido como PL das Fake News, foi acelerada no Congresso Nacional, em especial na Câmara dos Deputados, onde o texto estava parado a quase três anos.
Para Francisco Laux, embora o diálogo entre o Poder Público e as plataformas seja benéfico, as iniciativas legislativas precisam ser cuidadosamente analisadas, de modo que não resultem em leis com normativas pouco específicas. Laux é doutor pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FD-USP) e escreveu sua tese a respeito dos “limites da jurisdição e das decisões jurisdicionais estatais no âmbito da internet”
“A lógica mais generalista pode ensejar disfunções perigosas para a liberdade de expressão, especialmente quando a iniciativa legislativa parte de Estados com visões mais restritivas a respeito do tema”, argumenta o advogado especialista em direito digital. Ele defende a criação de regras específicas para cada temática que envolve os discursos fraudulentos e de ódio na redes, como a do art. 21 do Marco Civil da Internet, que trata do combate à pornografia de vingança.
“É bom quando se tem uma regra específica, porque todos sabem o que pode e o que não pode. Agora, se fica uma iniciativa muito ampla, que será regulamentada depois por uma agência reguladora, não se sabe onde isso vai parar. Você não tem certeza”, explica Laux ao exemplificar que leis generalistas podem ser interpretadas de maneiras muito distintas por diferentes juízes e tribunais.
O pesquisador ressalta ainda a dificuldade de alinhar a conduta de redes sociais a respeito do tema com a realidade brasileira, já que elas, em sua maioria, foram criadas à luz do conceito de liberdade de expressão estadunidense.
“As visões a respeito do que pode ou do que não pode ser falado são muito diferentes. Temos basicamente uma internet só e diversos estados soberanos com leis diferentes, tentando de alguma maneira fazer com que a visão de mundo deles valha naquele ambiente”, destaca Laux.
Os problemas para além da regulamentação
Ainda que as iniciativas legislativas prosperem adequadamente, Laux destaca que ainda restará um dos principais desafios na aplicação do direito nas redes: a lentidão do processo judicial, dificultando a remoção rápida de conteúdo prejudicial que viraliza rapidamente nas redes.
“A dificuldade se dá quando a pessoa prejudicada ou o Estado, por intermédio da AGU [Advogacia Geral da União], MP [Ministério Público], etc., precisam valer-se de um processo judicial para inibir danos que são vivenciados imediatamente e em grande escala”, explica.
Ele ressalta que o conteúdo infringente pode ser acessado e compartilhado por muitas pessoas assim que é postado, enquanto a obtenção de uma ordem judicial de remoção leva tempo, desde a contratação de um advogado até a comunicação de uma eventual decisão à plataforma.
Nesse contexto, o doutor em Direito Processual sugere a criação de um modelo de denúncia de conteúdo parametrizado, semelhante ao mantido pelas próprias plataformas e acessível em cada postagem, como alternativa para agilizar a remoção de conteúdos prejudiciais. “Enfim, a dinâmica da aplicação efetiva do direito nas redes precisa ser pensada de maneira diversa da lógica dos ‘arrazoados'”, afirma.
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