A formiga é um dos insetos mais populares do mundo. Conhecida por marcar presença em ambientes variados, sua diversidade é outro fator que chama atenção: até o momento, 18 mil espécies de formigas foram descobertas por pesquisadores. Entretanto, poucos sabem, que além de sua grandiosa população, as pequenas são consideradas seres extremamente complexos e detentoras de um alto grau de organização social em suas colônias. A fim de compreender melhor o funcionamento dos formigueiros, a mestra em Biologia pelo Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (IB-USP), Mila Barbosa, investigou de que maneira o ritmo biológico pode afetar as atividades da formiga-cortadeira (Atta sexdens).
Ritmo biológico diz respeito a um conjunto atividades realizadas pelos seres vivos que se repetem periodicamente e que estão alinhadas com os ciclos da natureza. “Existe uma sincronização entre fatores ambientais para otimizar o uso de recursos. As abelhas, por exemplo, possuem uma atividade maior no início ou final do dia porque é o horário em que diversas flores estão abertas”, explica a pesquisadora. Nesse sentido, a pesquisa revelou que o formigueiro atua majoritariamente no período noturno. Outro importante elemento observado foi a alta taxa de resposta da colônia a possíveis mudanças e perturbações.
Metodologia de pesquisa
Para alcançar esses resultados, Barbosa analisou duas atividades desempenhadas pelas formigas-cortadeiras: o forrageamento, que são as pequenas trilhas feitas para a exploração de recursos alimentares, e o corte de folhas. “Primeiro eu mantive o formigueiro em condições constantes por 15 dias para ter a certeza de que tudo estava estabilizado. Depois, realizei um experimento de deslocamento de fase, que é quando você altera o tempo de claro e escuro. Basicamente, eu fiz as formigas passarem por um jet lag porque eu criei uma desorientação temporal”, conta a pesquisadora. Na primeira fase, Barbosa deixou a fase clara das 06:00 até as 18:00; na segunda, das 12:00 até a 00:00. Para sua análise, a pesquisadora utilizou recursos como a produção de vídeos e fotos para quantificar o número de formigas que estavam trabalhando e a proporção de folhas sendo retalhadas. O software YOLO, comumente empregado na detecção de objetos, foi usado para auxiliar na contagem e identificação das formigas.
Ao projetar essa perturbação, a pesquisadora conseguiu ter acesso a informações fundamentais relacionadas à eficiência e ao custo energético do formigueiro para realizar as tarefas de forrageamento e de corte de folhas, principalmente após esse período de desacordo com o ritmo biológico. “Quando olhamos para uma escala mais macro, pode até parecer que elas se sincronizam. Inclusive, é possível ver uma recuperação dos padrões de quantas formigas foram alocadas mais ou menos em cada hora do dia para cortar folhas. Porém, quando observamos mais de perto, vemos que, na verdade, o padrão anterior não se recupera, ele apenas se adequa a fase clara”, destaca.
Por dentro de um formigueiro
Um formigueiro de formigas-cortadeiras é considerado um sistema complexo, devido às diferentes funções atribuídas a seus habitantes. Além da rainha, que desempenha um papel puramente reprodutivo, existem as operárias que cuidam dos ovos, aquelas que defendem a colônia e as chamadas “agricultoras”. Essa espécie possui uma relação mutualística (benéfica para ambos os lados) com fungos da família Lepiotaceae. As “agricultoras” são responsáveis por cultivar esses fungos, oferecendo a eles as folhas frescas, para no final, as formigas se alimentares deles. Elas também consomem a seiva oriunda das folhas. Além disso, as pequenas se comunicam por meio da quimiorecepção. As informações são passadas pela liberação de determinados feromônios que se traduzem em diferentes mensagens, sentidas pelas suas antenas. |
Sobre as perspectivas futuras, Barbosa quer buscar explicações biológicas para as reações apresentadas pelo formigueiro. “O que acontece no cérebro dessas formigas, que manda essa resposta? Será que tem alguma coisa? Será que tem algum hormônio que muda sua sensibilidade e elas conseguem alterar seu comportamento? Eu queria explorar um pouco mais disso”, relata. A pesquisadora segue com sua pesquisa em seu doutorado que está em produção na Universidade de Stanford, na Califórnia.
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