Localizados no Oriente Médio — com a presença de grandes quantidades de petróleo no subsolo da região e confluência entre os continentes asiático, europeu e africano —, a Arábia Saudita e o Irã possuem um histórico de tensão geopolítica, que se expande para além da questão religiosa.
À Agência Universitária de Notícias (AUN), José Antonio Lima, autor da tese de doutorado Arábia Saudita, Irã e as transformações do Complexo Regional de Segurança do Oriente Médio (2003-2020), orientada pelo professor Pedro Dallari e defendida no Instituto de Relações Internacionais, deu detalhes sobre a complexa relação entre as duas nações, mostrando o agravamento da rivalidade regional nos últimos anos e a influência de potências que atuam no cenário local.
Segurança no Oriente Médio
Em março de 2003, após acusações do presidente George W. Bush, a invasão dos Estados Unidos ao Iraque para depor Saddam Hussein aconteceu sob o pretexto de que o líder iraquiano possuía armas de destruição em massa e ligações com a Al-Qaeda.
No Golfo Pérsico, com a “rivalidade triangular” entre Irã, Iraque e Arábia Saudita, havia a demonstração de inimizade entre as nações, apesar de nenhuma delas subjugar as demais. A segurança no Oriente Médio ainda se mantinha estável.
Com as intervenções norte-americanas no Iraque e no Afeganistão, o Irã interpretou a possibilidade que poderia ser o próximo país na “lista”. Nesse cenário, buscou se defender de ofensivas e adotou a política para retaliação de interesses provenientes de Washington e seus aliados, como a Arábia Saudita e Israel.
A Primavera Árabe — onda de manifestações e protestos que aconteceram no Oriente Médio e no Norte da África a partir de dezembro de 2010, reivindicando a derrubada de ditadores e a realização de eleições — fez com que Teerã expandisse a sua influência. “A partir de 2011, provocam-se aberturas democráticas e várias reações a elas, além de grande instabilidade tanto para o regime iraniano quanto para o saudita. É um momento de oportunidades para fazer avançar os seus interesses, mas também um temor por conta da possibilidade dos interesses do adversário”, explica o pesquisador José Antonio Lima.
A atuação norte-americana em territórios iraquianos permitiu o avanço iraniano no país. A ascensão de Teerã foi interpretada como ameaçadora por Riad. Em 2009, com a eleição de Barack Obama, sauditas demonstraram receio com acordos que não levavam em consideração suas preocupações securitárias para, então, privilegiar os iranianos.
“A gente sai desse triplo pilar de segurança no Oriente Médio para um cenário que só há o Irã e a Arábia Saudita como forças significativas que passam a disputar a hegemonia. É a disputa entre esses dois regimes que acaba por aglutinar uma série de dinâmicas na região”, aponta.
Rivalidade entre Irã e Arábia Saudita
Com a reconfiguração securitária no Oriente Médio, a relação entre a Arábia Saudita e o Irã tornou-se ainda mais delicada na disputa pelo domínio da região e a rivalidade se acentuou com o rompimento das relações diplomáticas em 2016.
Entre 2003 e 2020, segundo Lima, os países exploraram diversos eventos para expandir suas influências, principalmente na Síria, Bahrein e Iêmen, o que ampliou a desconfiança entre ambas nações, com o financiamento de milícias e grupos rebeldes em conflitos.
Para o pesquisador, o antagonismo se dá em várias dimensões, como a posição geográfica dos países, onde ficam frente a frente no Golfo Pérsico. “Outra tensão existia mesmo quando Irã e Arábia Saudita estavam no mesmo lado, aliado aos Estados Unidos, no período pré 1979″, conta. “Com a Revolução Islâmica, há um cisma total entre os dois regimes em larga medida, porque a ideologia do regime iraniano passa a deslegitimar o saudita sistematicamente.” Os países seguem ramos distintos do islã: a Arábia Saudita é, majoritariamente, composta por sunitas enquanto os xiitas predominam no Irã.
“Essa é uma região muito estratégica não apenas pelas questões religiosas, mas também pelo comércio e geopolítica mundial. Todas as grandes forças, como Europa, Estados Unidos, China e Rússia têm interesses no Oriente Médio. Quanto mais a sociedade compreender o que acontece na região, melhores e mais adequadas serão suas atuações.”
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