Rede ativista de mulheres negras e periféricas é retratada em estudo da USP

Pesquisadora aborda vivência e militância de mulheres negras das periferias sul da cidade de São Paulo

Vista do Jardim Ângela, periferia da zona sul da cidade de São Paulo — Foto: reprodução / Mateus Cerqueira

Dissertação de mestrado defendida recentemente, na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), por Alessandra Kelly Tavares de Oliveira, e intitulada Gritos e silêncios: um mergulho no cotidiano e na intimidade de mulheres negras ativistas da periferia sul de São Paulo, analisa como as redes de ativismo compostas por mulheres periféricas produzem conhecimento e sentidos políticos.

Após 4 anos de aprofundamento, a pesquisadora, nascida no Jardim Ângela, na década de 80, decidiu escrever sobre temas pessoais e coletivos, que se entrelaçam ao longo da dissertação, pois ela também se encaixava nos adjetivos dos corpos que procurava estudar, ou seja, mulher, ativista, negra e moradora da periferia sul da capital paulista.

Ao participar de redes de debates realizados por mulheres negras dentro da periferia, a autora percebeu que as ideias produzidas por essas figuras eram uma forma de conhecimento e militância: “Conforme os movimentos foram se formando, principalmente em 2011, quando a sociabilidade de gênero se fortaleceu, eu tinha uma hipótese que aquelas coletividades estavam produzindo conhecimento”, afirma Alessandra.

Por ser parte dos objetos de estudo, ela teve o desafio de saber se distanciar para coletar materiais relevantes para a dissertação. “Foi muito interessante escrever com pessoas que sabiam o que estava produzindo e que se colocavam no direito de também guiar o meu texto. Então fiz essa costura, entre essas ideias externas, a antropologia e os meus desafios pessoais”.

O entrelaçamento de ideias desenvolvido pela autora transpassa anos ao apresentar uma linha do tempo em que importantes movimentos sociais vão se desenvolvendo dentro das periferias da zona sul. O nascimento de saraus, associações culturais, publicações literárias, espetáculos, ocupações e amostras culturais são alguns dos marcos históricos importantes que Alessandra aponta como fundamentais para a constituição da rede de mulheres negras da zona sul de São Paulo.

Mulheres dançando e tocando instrumentos- Fotografia de José Cícero – Cortejo Periferia Segue Sangrando, 2018

E ao ser questionada sobre o impacto dessa união feminina dentro das periferias, Alessandra pontua: “Essas mulheres periféricas contribuíram direta ou indiretamente com candidaturas políticas. Além disso, o acúmulo de experiência que elas possuem ajudou para a comunicação de diversos temas, como tecnologias, ensino e até assuntos sensíveis, como abuso sexual”.

Além do impacto político, as redes de ativismo também formam novas imagens sobre o que ocorre dentro das periferias de São Paulo ao mostrar figuras femininas periféricas produzindo conhecimento e resgatando o poder da troca de pensamento para enriquecer debates democráticos. Essa imagem mostrada por Tavares ajuda a romper com o imaginário social, que relaciona a cultura periférica com a criminalidade e violência.

Sobre a importância de corpos negros e femininos como protagonistas de pesquisas acadêmicas, Alessandra responde: “Acredito que as pessoas negras sendo protagonistas das próprias histórias acrescenta muito na forma que as questões são abordadas nas ciências. Após as cotas raciais, vemos mais pesquisas sobre classes populares, negros e indígenas sendo produzidos nos espaços acadêmicos”.

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