Pesquisador da USP analisa problemas e contradições do direito à cidade

Entender as questões do conceito de direito à cidade, cada vez mais presente nos debates políticos mundiais, é tema de pesquisa de mestrado

Prédios de luxo e periferias dividindo o cenário do centro urbano da cidade do Rio de Janeiro [Imagem: Reprodução/Leonardo Martins: Flickr]

O pesquisador Gabriel Alvarez, de 29 anos, apresentou, em outubro de 2022, a sua pesquisa de mestrado intitulada A problemática do direito à cidade: as contradições políticas do direito à cidade no urbano contemporâneo. A dissertação, realizada na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, expõe o pensamento crítico do autor sobre um planejamento urbano que reivindica uma atuação politizada do planejador.

Iniciada em 2017, a pesquisa lida com os diferentes pontos de vista que se desenvolveram após a publicação do livro “O direito à Cidade”, em 1968, pelo autor Henri Lefebvre. Segundo Gabriel: “Busquei no meio da mobilização política quais são as contradições que o direito à cidade tem entre as diferentes concepções que o conceito adquiriu em poucas décadas, pois ele sai de uma concepção filosófica, para uma ideia que tem participação no mundo inteiro.” 

E o Brasil é um dos palcos que o desdobramento desse pensamento filosófico ganhou espaço, por aqui o direito à cidade está presente nas discussões acadêmicas, sociais e, principalmente, políticas. Exemplo disso está descrito no artigo 2º do Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001), que trata sobre o direito à cidade, o qual garante que “a política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana”. Esse estatuto regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal de 1988 referentes à política urbana no âmbito federal. 

Para Gabriel: “O Brasil está no epicentro da problemática do direito à cidade, pois entende-se que o país conseguiu institucionalizar esse direito,  já que ele está na Constituição, no estatuto das cidades e na elaboração dos planos diretores, ou seja, colocamos esse direito na lei.” No entanto, a institucionalização desse direito não foi suficiente para resolver as problemáticas dos centros urbanos. 

Como aponta o estudo divulgado pelo Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat), em 2020, entre as dez cidades mais desiguais da América Latina, cinco são brasileiras: Goiânia (GO), Fortaleza (CE), Belo Horizonte (MG), Brasília (DF) e Curitiba (PR). Além disso, segundo o Boletim de Desigualdade nas Metrópoles, no primeiro ano da pandemia do Covid-19, as pessoas mais pobres tiveram uma redução de cerca de 32% em sua renda, enquanto os mais ricos tiveram uma perda menor que 4%.

O caso brasileiro é justamente uma das contradições que Gabriel busca estudar no mestrado: “A piora da vida nas cidades pode ser explicada pelo aprofundamento das contradições que envolvem a transformação do espaço social em mercadoria, tornando-o um elemento central da reprodução do capital em detrimento da realização da vida”,  aponta o pesquisador.

No Dia Mundial dos Sem Teto,em 2015, movimentos protestam por moradia em Porto Alegre
[Imagem: Reprodução Licenças Creative Commons Google]
Segundo Gabriel, um exemplo da valorização da mercadoria em detrimento da vida humana pode ser visto nas políticas públicas que, na teoria, deveriam ajudar a população, mas acabam por prejudicá-la. Como o fato de a produção de moradias populares estar aquecendo o mercado formal de moradias e aumentado o preço dos imóveis, o que distancia as pessoas de baixa renda de adquirir a casa própria e se livrar do aluguel.

Diante desse conturbado cenário urbano, o pesquisador aposta em uma ideia radical do direito à cidade para tentar tornar a vivência urbana mais justa. “Penso que um caminho seria o de começar explorando e reivindicando formas de autogestão dos espaços urbanos. Um dos sentidos da radicalidade do direito à cidade aponta ao fim da democracia representativa e da propriedade privada do solo. Para isso, novas formas de uso do espaço devem ser exploradas”, conclui Gabriel.

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