Pesquisadores da USP analisam diferentes níveis de infecção por bactéria em espécies de carrapato

De acordo com pesquisadora do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, os resultados podem ajudar no desenvolvimento de estratégias de controle dos carrapatos e da febre maculosa brasileira, causada pela bactéria

Carrapatos Amblyomma sculptum e Amblyomma aureolatum - Fotos: Museu do Carrapato

Pesquisas conduzidas no Departamento de Parasitologia do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) investigam a diferença na suscetibilidade dos carrapatos Amblyomma sculptum (carrapato-estrela) e Amblyomma aureolatum (carrapato-amarelo-do-cão) à infecção pela bactéria Rickettsia rickettsii

Segundo a professora Andréa Cristina Fogaça, coordenadora do Laboratório de Bioquímica e Imunologia de Artrópodes do ICB, os estudos podem ajudar na identificação de alvos para o controle da febre maculosa brasileira (FMB), causada pela bactéria. Os carrapatos podem ser infectados quando se alimentam do sangue de um animal que está servindo de hospedeiro para as riquétsias, isto é, as bactérias.

Nos humanos, a doença é transmitida pela picada do carrapato. Os sintomas iniciais são febre, dores de cabeça e no corpo e o aparecimento de manchas avermelhadas na pele. O tratamento é feito com antibióticos, porém atrasos no diagnóstico podem gerar complicações graves e resultarem no óbito do indivíduo enfermo.

Os dois carrapatos são capazes de transmitir a bactéria causadora da FMB às pessoas, mas a bactéria não possui a mesma capacidade de infectá-los, explica a professora. “Enquanto um grande número de A. aureolatum adquire R. rickettsii quando se alimenta de um hospedeiro vertebrado, apenas um pequeno número de A. sculptum se infecta”.

Para identificar os componentes do intestino dos carrapatos responsáveis por essa diferença, o grupo de pesquisa analisou a microbiota através de análises de amostras de DNA. De acordo com Andréa, não existem carrapatos com infecção apenas no intestino, sugerindo que se a bactéria consegue se esquivar dos efeitos das proteínas que a controlam nesse órgão, os demais são colonizados.

A microbiota é composta por microrganismos, como vírus, protozoários e bactérias, que não são danosos ao organismo do carrapato e o beneficiam. O intestino de A. aureolatum abriga uma microbiota composta por muitas bactérias e o de A. sculptum, poucas. Os dados do estudo detectaram que as bactérias do intestino de A. aureolatum podem dessensibilizar seu sistema imune e o tornar mais suscetível à infecção pelas riquétsias. Além disso, o intestino de A. sculptum pode ser mais inóspito para as riquétsias e outras bactérias se comparado ao da outra espécie de carrapato.

Os efeitos da infecção na expressão dos genes do intestino dos carrapatos também foram objetos de estudo. Genes são segmentos de material genético que produzem as proteínas do organismo. Quando os carrapatos estão infectados, a expressão dos genes pode aumentar ou diminuir e, consequentemente, aumentar ou diminuir a quantidade das proteínas. Foi observado que os genes que fabricam as proteínas do sistema imune têm sua expressão muito aumentada em A. sculptum, o que não ocorre em A. aureolatum.

Estudos adicionais são necessários para determinar os mecanismos moleculares envolvidos nas diferentes taxas de infecção das duas espécies de carrapato à bactéria Rickettsia rickettsii. De qualquer forma, a professora conta que a pesquisa é inovadora por “buscar compreender o papel de cada componente do sistema, ou seja, do patógeno, do carrapato vetor, do hospedeiro e da microbiota no estabelecimento da infecção”, bem como por possibilitar o avanço de estratégias de controle dos carrapatos e dos patógenos que eles transmitem.

Os próximos estudos têm como objetivo determinar os efeitos que a diminuição das proteínas do sistema imune tem na infecção de A. sculptum e o potencial da microbiota de A. aureolatum como alvo vacinal. Em futuras pesquisas, também busca-se eliminar a microbiota para explorar seus efeitos sobre a infecção por R. rickettsii e a biologia dos carrapatos.

Os estudos foram feitos pelo ICB-USP em colaboração com o National Institute of Allergy and Infectious Diseases, dos Estados Unidos, o Instituto Nacional de Tecnología Agropecuaria (INTA), da Argentina, o Instituto de Matemática e Estatística e a Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, ambos da USP.

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