Laboratório da USP participa de projeto sobre a vigilância de febre amarela em macacos bugios

Desenvolvido pela FAPESP e pela Secretária de Saúde do Estado, o trabalho consiste na implementação de tecnologia de monitoramento acústico dos animais

Considerado como um "sentinela para a doença" para órgãos de saúde especialistas em endemias, o bugio é a espécie de primata não humano mais sensível à febre amarela. [Imagem: Reprodução/Leonardo Merçon]

Entre 2018 e 2019, o estado de São Paulo passou por uma epidemia de febre amarela, doença infecciosa febril aguda, que é causada por um vírus do gênero Flavivirus, da mesma família de agentes virais que causam a dengue. Transmitida por mosquitos infectados, não há contaminação direta de pessoa para pessoa, porém sua importância epidemiológica se deve pela gravidade clínica e potencial de disseminação massiva em áreas urbanas infestadas pelo Aedes aegypti.  

Passível de notificação compulsória imediata, todos os eventos suspeitos devem ser prontamente comunicados à população, como o falecimento de primatas não humanos e casos em pessoas que apresentem compatibilidade com a sintomatologia da doença.

 À época, a morte de certos tipos de macacos, tendo os bugios (Alouatta guariba) como os mais afetados, chamou atenção de especialistas. Por serem muito suscetíveis à febre amarela, a espécie tornou-se então um “alarme”. “Quando os macacos começam a cair das árvores, infelizmente, pode ser um sinal de que a febre amarela está sendo transmitida naquela região e é preciso reforçar a vacinação populacional”, afirma Linilson Rodrigues Padovese, professor e coordenador do Laboratório de Acústica e Meio Ambiente (LACMAM) da Escola Politécnica (Poli) da USP, que desenvolveu a implementação do monitoramento acústico nos macacos bugios, no Parque Estadual da Cantareira, localizado na região norte da cidade de São Paulo.

O pesquisador, especialista em epidemiologia e médico veterinário pela USP, Adriano Pinter dos Santos, em conjunto com a Superintendência de Controle de Endemias (SUCEN) do estado de São Paulo, submeteu um projeto à FAPESP para entender as consequências da doença nesta população de macacos; incluindo uma tentativa de vacinação animal a fim de prevenir futuras novas infecções e dizimação da espécie. Além disso, o projeto possui também atividades interdisciplinares, como análise veterinária e ecológica, além de vigilância em saúde, controle epidemiológico e proteção ambiental. 

A colaboração do LACMAN no projeto nasceu por conta do estudo de doutorado da bióloga e pesquisadora Bruna Campos Paula pelo Departamento de Engenharia Mecânica (PME) da Poli-USP. Para contornar estas dificuldades, os conhecimentos de biologia de Bruna se uniram aos de acústica ambiental de Padovese e ambos investiram no desenvolvimento de uma tecnologia para monitoramento acústico da população de bugios. “Desenvolvemos um pequeno equipamento, relativamente barato, autônomo e similar a um gravador de áudio que capta a vocalização dos bugios – que é muito potente e parecida com um rugir, principalmente quando juntam-se vários machos da espécie”, comenta o professor. Quando há baixa captação desses sons na natureza, existe um indicativo de que tais macacos possam estar adoecendo.

Padovese contextualiza que a escassez de trilhas para o acesso humano e a enorme densidade do Parque Estadual da Cantareira dificulta a identificação desses animais. Além disso, a existência de obstáculos causados por fenômenos naturais, como chuva, alagamentos e empoçamentos, muitas vezes pode interditar a ida de ecólogos e biólogos que objetivam visualizar e/ou ouvir os sons específicos que a espécie produz. Há ainda o fator de coincidir o encontro dos especialistas com os macacos, que embora não sejam avistados ou ouvidos em todas as visitas, não significa que não estejam possivelmente presentes nas localidades e redondezas. 

Inicialmente, dez aparelhos foram semeados em áreas designadas ao longo do Parque Estadual da Cantareira. Os dispositivos possuem autonomia para funcionar durante todo o tempo médio de atividade do bugio, entre 5h30 às 19h30. Após um período de 3 a 5 meses, é possível coletar os dados armazenados e, por meio de avaliações feitas por softwares, identificar a presença e características do animal conforme sua vocalização em áudio.

O professor espera que ao longo de 2022, as captações do estudo possam trazer resultados mais consolidados acerca da importância de monitoramento da vida animal para a saúde pública como um todo e, em particular, a vida dos macacos bugios.

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*