Ondas de calor serão responsáveis pelos maiores impactos em algas marinhas

Análises do Laboratório de Algas Marinhas da USP mostram que 2ºC acima do ideal seria suficiente para diminuir fotossíntese e desregular cadeia alimentar das algas, bioindicadores das mudanças climáticas

Imagem: Reprodução

Aumento de temperatura no cenário das mudanças climáticas será um dos fatores mais preponderantes de impacto nas algas marinhas, base da cadeia alimentar dos ambientes aquáticos. As algas têm um maquinário mais tolerante à oscilação de nutrientes, à acidificação e à incidência solar, mas um aumento de 2ºC, que pode ocorrer com as ondas de calor resultantes das mudanças climáticas, por períodos de vários dias, poderia ter consequências negativas para as espécies e toda a comunidade em volta.

“A previsão de ondas de calor para algas vai ser extremamente drástica”, alerta Fungyi Chow, professora do Departamento de Botânica do Instituto de Biociências da USP e coordenadora do Laboratório de Algas Marinhas, à AUN. Dias de invernos muito quentes são exemplo das ondas de calor, quando as temperaturas sobem muito em um espaçamento curto de dias.

Os pesquisadores do laboratório têm desenvolvido nos últimos anos uma série de análises e simulações de possíveis impactos do estresse climático nas algas, que funcionam como bioindicadores mudanças climáticas. O cenário é tido como preocupante porque, com a diminuição de algumas espécies de algas, haverá uma mudança ecológica na cadeia alimentar e também na comunidade marinha.

“Por serem bastante sensíveis à mudança de temperatura, 2ºC acima da temperatura ideal para que elas vivam já seria suficiente para diminuir toda a fotossíntese, o que diminuiria, consequentemente, o desenvolvimento e a reprodução”, afirma a professora.

O mundo atualmente está 0,75ºC mais quente do que durante a Revolução Industrial (ocorrida entre os séculos 18 e 19). Segundo projeções do Painel Intergovernamental das Mudanças Climáticas (IPCC), o aumento da temperatura pode ultrapassar 1,5ºC em 2030.  

Aumento da temperatura desfavorece fotossíntese

As ondas de calor podem desfavorecer o processo de fotossíntese, prejudicando a nutrição das algas. Isso compromete a energia necessária para sobrevivência, reprodução e crescimento, podendo ocasionar a morte — a depender do tempo de duração das ondas de calor — ou perda da capacidade biológica de sobrevivência. Elas ficariam mais suscetíveis a outros fatores, como doenças ou pequenas variações de luminosidade que não exerceriam tanta influência caso estivessem saudáveis. 

Estudos do grupo de pesquisa incluíram simulações das condições ambientais, agregando fatores como presença de nitrogênio, acidificação (pH) e temperatura em três tipos das principais macroalgas: vermelhas, pardas e verdes, com a escolha de um representante de cada um dos tipos. O principal fator com incidência negativa, afetando o desempenho das algas foi justamente a temperatura, sendo que as espécies de algas mais próximas à maré foram as mais vulneráveis.

Um outro estudo de mesocosmo (que simula um ambiente em menor escala), foi feito por um consórcio de pesquisadores. Foram feitas simulações com CO2 (produto da acidificação), nitrogênio e temperatura para os mesmos três tipos de algas. “Para todas essas espécies se mostrou que o aumento da temperatura seria um dos efeitos mais drásticos”, relata a professora Fungyi Chow, que é uma das autoras do estudo.

A simulação foi feita com uma onda de calor, em dois dias, de quatro a cinco graus, considerando o cenário mais negativo do IPCC. Ele prevê que caso não se consiga mobilizar o planeta, a temperatura global ultrapasse 4ºC até o fim do século.

Base da cadeia alimentar

As algas são a base da cadeia alimentar dos ambientes aquáticos, principalmente marinhos, e constituem também um ambiente de proteção. Caso ocorra desestabilização de certa comunidade ou espécie, a tendência é que faltem recursos, tanto de alimentação quanto para controle de situações adversas no ambiente marinho. Muitas algas atuam como barreiras físicas contra eventos extremos e ressacas, proporcionando tanto a estabilização ambiental quanto o impacto físico.

“A onda não impacta com tanta força quando existe uma grande floresta de algas. É um impacto maior em uma rocha toda nua”, exemplifica a pesquisadora. “Assim como uma árvore fornece sombra, alimento, refúgio e lugar para reprodução, as algas ocupam o mesmo papel dentro do ambiente marinho.”

Elas também exercem influência na própria cadeia produtiva de alimentação humana. Um exemplo está na base de carne. “Para alimentar galinha porco e gado, usamos proteína animal, que pode ser, muitas vezes, à base de peixe e camarão, que são alimentados pelas algas”, exemplifica Chow. A cadeia, então, está conectada e não se restringe ao ambiente aquático.

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