Egoísmo empresarial e falta de controle do poder público dificultam destinação adequada do lixo

Pensar apenas em iniciativas de reciclagem não é suficiente (Imagem: Andrew Redington/GettyImages)

A destinação adequada do lixo brasileiro, além de benéfica para o meio ambiente, poderia poupar bilhões de reais e inclusive gerar energia. Na Suécia, 99% dos resíduos são reciclados ou incinerados. No Brasil, menos de 4% de todos os resíduos gerados são reciclados – mesmo que 30% tenham este potencial – e as iniciativas de aproveitamento energético do lixo, como a captura de biogás e a incineração, são quase inexistentes. 

O pesquisador Marco Tsuyama, do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEE) da Universidade de São Paulo estuda o caso sueco e busca propor soluções para o cenário brasileiro. O principal destinatário do lixo por aqui são os aterros, quase inexistentes na Suécia. “Os aterros são um desperdício do material e de energia”, ele fala, para em seguida complementar que, mesmo assim, eles são a opção menos danosa de descarte do lixo brasileiro. Mais de 40% das cidades sequer destina os resíduos para aterros adequados e os lixões a céu aberto continuam sendo comuns e numerosos, mesmo que a lei previsse fechá-los até 2014. 

Os fatores que levaram ao sucesso no tratamento do lixo sueco, são também os principais desafios brasileiros nesta questão. A falta de “decisões integradas” por parte das empresas é um destes desafios, ou seja, as tomadas de decisão levam em conta apenas os custos individuais, ignorando custos sociais ou ambientais. O pesquisador explica: “Se os outros impactos forem ignorados, o custo imediato pode ser menor para a empresa, porém será maior para aqueles que são afetados diretamente e para as gerações futuras.” 

Os predominantes aterros e a persistência dos lixões são bons exemplos desta mentalidade. São as opções com o custo imediato mais baixo, porém também são as que oferecem menor vantagem ambiental (ou prejudicam de forma ativa o meio ambiente), além de gerarem gastos posteriores. Um estudo feito pela Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais mostrou que o país gasta mais de 3 bilhões por ano com a saúde de pessoas que adoecem graças a contaminação provocada por lixões.

A existência de lixões é proibida por lei desde 2014, mas eles seguem existindo numerosamente (Imagem: Reprodução/Pixabay)

Outro impasse é a discussão entre reciclagem e geração de energia. De acordo com Marco, esta conversa acontece com um enfoque errado, se baseando no mito de que deveríamos investir em reciclar os resíduos ao invés de reaproveitá-los energeticamente. “Não é possível reciclar tudo. Na Suécia, as próprias recicladoras levam resíduos para os locais de incineração”, ele fala. A reciclagem é a melhor opção dentre os destinos do lixo, mas ao comparar os aterros (destino majoritário) e a incineração, deveríamos dar prioridade à opção que oferece retorno energético.

A maior pedra no meio do caminho para o aproveitamento dos resíduos, no entanto, se mostra na falta de controle econômico do governo brasileiro, aliada à falta de confiança do povo no poder público. Apenas com a aplicação de impostos e taxas que desincentivem as práticas de destinação inadequadas o cenário dos resíduos pode mudar. Marco considera os instrumentos econômicos aplicados pelo Estado o fator de sucesso mais importante: “Só o governo consegue ter uma visão ampla do que é benéfico para a sociedade como um todo, as visões individuais são egoístas.” Aspectos relacionados à sustentabilidade só serão considerados seriamente pelas empresas quando os danos ambientais se converterem, de fato, em dinheiro perdido.

A deficiência no controle econômico exercido pelas instituições brasileiras é indissociável da falta de confiança da população. Marco explica que, quando o governo sueco propõe regulamentações ou impostos sobre alguma prática, estes são prontamente atendidos. A tensão existente entre Estado e povo no Brasil faz com que decisões como estas sejam contestadas e demorem mais do que o necessário. Os fatores culturais não podem ser ignorados ao analisar diferentes países.

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