Falta de dados dificulta precisão na área de economia ambiental

Efeitos do Choque China no desmatamento e na saúde da população não podem ser mensurados por falta de métricas da poluição brasileira

(Referência ao grande número de produtos vendidos no Brasil e origem chinesa - arte por Gabrielle Torquato)

O Brasil vem aumentando consideravelmente seu comércio com a China. As indústrias brasileiras têm o País como forte comprador de soja e o principal importador de minério de ferro. A fim de analisar os impactos dessas transações na qualidade ambiental, o pesquisador Victor Simões, da Faculdade de Economia, Administração Contabilidade (FEA-USP), buscou métricas para verificar como o crescimento desse comércio se reflete no desmatamento e na saúde da população. 

Na área de economia ambiental é muito comum se utilizar o termo “Choque China” para se referir à expansão chinesa. Há mais de 50 anos, o país vem se desenvolvendo e aumentando suas taxas de importação e exportação. Todas essas variáveis tornaram a China a nação com o maior crescimento econômico dos últimos 25 anos, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI). 

Made in China

Em 2015, o IBGE divulgou dados de uma pesquisa ambiental que analisava o período de 2000 a 2010, década de alto crescimento do Choque China. Segundo os resultados, nesse intervalo de tempo, o Brasil apresentou altos índices de devastação de áreas florestais, cujo o principal responsável era a expansão de atividades agrícolas. 

Todos os dados indicavam para uma forte influência chinesa. No entanto, quando a pesquisa teve início, Victor percebeu que a principal dificuldade seria fazer a comprovação, pois muitas informações não eram divulgadas. “Inicialmente ela [pesquisa] era muito mais ousada, porque a gente acreditava que ia encontrar base de dados pra tudo. E conforme se vai descobrindo que as coisas não existem, é necessário se adaptar”, comenta o pesquisador. 

Para averiguar os impactos no desmatamento o método usado foi comparativo. O pesquisador analisou os biomas Cerrado e a Amazônia, antes e depois da presença chinesa. “É claro que só fazer isso não prova a influência da China, isso seria ingênuo. Então, pra tentar dar credibilidade ao nosso argumento, nós olhamos ao nível de município e tentamos criar um perfil econômico desses lugares”, explica Victor.

Basicamente o pesquisador identificou o principal meio de produção de cada cidade. Para os locais que tinham forte influência de agricultura e mineração, Victor os classificou como mais sensíveis à influência do Choque China. “Eles provavelmente seriam afetados caso houvesse um aumento na exportação chinesa, pois os agricultores teriam que desmatar um maior número de terras para atender a essa demanda”. 

Na perspectiva da saúde pública, o objetivo era provar que o aumento dessas produções poderia estar diretamente ligado ao nível de enfermos. Através do banco de dados do SUS, o pesquisador selecionou pessoas que tiveram problemas de saúde relacionadas a poluição, como por exemplo doenças pulmonares. “Comparamos o nível de pacientes afetados nos lugares que achávamos que eram mais sensíveis ao Choque China com aqueles que já havíamos constatado que não tinha influência”. 

Para tentar discernir ainda mais esse efeito, o estudo buscou pessoas que eram mais sensíveis a doenças respiratórias. Logo foi detectado que seria plausível analisar os impactos da poluição em crianças. “É difícil mensurar quando você não tem o histórico da pessoa, porque se um adulto tem uma doença respiratória pode ser por poluição, mas também vai ver ele fumou a vida inteira. Agora quando uma criança desenvolve uma doença pulmonar, é mais fácil de argumentar que são fatores ambientais do que algo que ela se causou”, explica. 

Nada a declarar, por enquanto 

Mesmo com todo o levantamento de dados, não foi possível afirmar com certeza se houve uma influência chinesa nos aspectos analisados. O principal problema identificado pelo pesquisador está na pouca divulgação de dados sobre as métricas de poluição brasileira. “As empresas não são obrigadas a declarar um inventário de poluição, como acontece na China e nos EUA. Nesses países por lei as empresas têm que declarar quanto elas estão emitindo na natureza”. 

Apesar de não ter evidências que suportem suas teorias, Victor acredita que o problema é estrutural. “A leitura que eu faço dos meus resultados é que é uma limitação metodológica. Então eu não falo que a China não está causando o desmatamento no Brasil, eu falo que nós não podemos afirmar com estudos feitos aqui”, comenta. 

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