Tecnologias permitem reciclagem de fósforo a partir do esgoto

Mineral em escassez é importante para a produção de fertilizantes

Algumas estações de tratamento de esgoto já utilizam água de reuso, mas ainda é possível reaproveitar outros subprodutos de valor importante. Imagem: Portal Tratamento de Água

O esgoto é um sistema destinado a escoar e tratar os dejetos de diversos aglomerados populacionais. Ele é classificado em diferentes tipos e, quando não tratado, possui diversos resíduos tóxicos e nutrientes. Pensando nisso, a pesquisadora Mariana Cardoso Chrispim começou a desenvolver sua pesquisa de doutorado na área de saneamento ambiental, focando na recuperação de recursos no processo de tratamento de esgotos. O estudo, que está sendo elaborado através de um convênio entre a Universidade de São Paulo e a Universidade de Lund, na Suécia, demonstra que já existem tecnologias, inclusive no Brasil, para reaproveitar substâncias do esgoto e convertê-las em um produto de valor. 

Mariana explica que existem vários exemplos de subprodutos que podem ser recuperados a partir do esgoto, dentre eles o biogás e o lodo. Sua pesquisa, porém, foca em alguns recursos específicos, principalmente no fósforo, analisando quais são as tecnologias disponíveis atualmente para esses processos e como é possível avançar na transição do sistema convencional de tratamento de esgoto para um sistema circular. Nesse segundo seriam aproveitados todos os recursos possíveis com uma visão do saneamento orientado em recursos. 

Para o estudo, a doutoranda está fazendo uma revisão da literatura sobre os processos e as tecnologias de tratamento e realizando estudos de caso, no qual investiga a área da macrometrópole paulista, analisando dados reais de estações de tratamento de esgoto e verificando quais são as possibilidades de melhoria dessa realidade. Ela afirma que existem várias tecnologias utilizadas para o processo de recuperação. Uma das mais conhecidas é a cristalização de estruvita, um cristal que pode ser utilizado como fertilizante na agricultura por possuir altas concentrações de fósforo e magnésio. Dessa forma, em uma estação de tratamento, esse processo de cristalização pode ser aplicado em uma das etapas que gera um efluente com maior concentração de nutrientes para obtenção do produto. 

De acordo com Mariana, países como Holanda, Alemanha e Suécia já utilizam esses recursos para recuperação de nutrientes. Em alguns dos países já existem até legislações sobre como deve ser a qualidade dos fertilizantes gerados a partir do processo, já que os produtos serão reinseridos na agricultura e é necessário avaliar a qualidade deles. No Brasil, entretanto, ainda existem barreiras para a aplicação dessas tecnologias. Para a pesquisadora, a principal delas está relacionada à falta de incentivo, tanto por parte da legislação quanto por parte das políticas públicas, para que as estações possam mudar suas realidades e começar a pensar em como aprimorar os processos já existentes.

Ela acredita que a comunicação dos resultados da pesquisa pode contribuir fornecendo as justificativas necessárias para que o poder público busque essas novas estratégias, mostrando que os processos já estão sendo aplicados em outros lugares, não sendo algo impossível de ser colocado em prática. Ademais, demonstra a importância disso para a sociedade. “As pessoas têm uma visão negativa do esgoto como algo sujo, que gera mau odor e não como um conjunto de recursos”, afirma.

Para Mariana, o estudo, principalmente do fósforo, é muito importante, já que as rochas fosfáticas, principais reservas do mineral, estão se esgotando: “Precisamos de fertilizantes para produzir alimentos e alguns nutrientes são essenciais para as plantas. Alguns deles, como o fósforo, são limitados, então é preciso buscar fontes alternativas pensando de forma sustentável e a longo prazo”. 

Além disso, a pesquisadora espera que, com os resultados da pesquisa, mais estudiosos possam comparar resultados e avançar mais em questões relacionadas ao assunto. “São bem poucos os trabalhos no Brasil com essa abordagem do saneamento orientado em recursos. Espero que isso possa embasar a criação de projetos de recuperação de nutrientes, porque tem um potencial muito grande. Como pesquisadores, nosso papel é tentar contribuir para mudanças positivas considerando a situação local”, conclui.

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