Professores de creches têm condições piores comparado aos demais

A baixa valorização da educação infantil contribui para o quadro e afeta diretamente os estudantes

Foto: Marcos Santos/Imagens USP

O final da carreira de professoras de creches é praticamente o mesmo do começo de professores em outras etapas. Isso tem a ver com o fato de que a educação infantil está no cenário brasileiro da educação há pouco tempo em relação ao ensino fundamental. Desde o TCC e o mestrado, Ana Paula Santiago do Nascimento — professora de Educação Básica, Técnica e Tecnológica no Núcleo de Educação Infantil – Paulistinha da Universidade Federal de São Paulo — tem tratado de educação infantil. E em discussão com um professor, percebeu uma discrepância da maneira pela qual a lei abarca a carreira de professoras nas creches.

Ana Paula participou de uma pesquisa sobre carreira docente durante oito anos. A pesquisa envolveu doze redes estaduais, em suas distintas capitais, além de ser ampla e não ter um recorte definido. Nas discussões dessas pesquisas observou-se um problema de profissionalização e de carreira; um exemplo, foi o caso de São Paulo. Notou-se também que havia uma precarização maior dos professores de creches aos demais professores.

A decisão de analisar as capitais em sua tese de doutorado na Faculdade de Educação, era de que são os locais que têm maiores recursos, capacidades técnicas, e a circulação de conhecimentos mais técnicos.

Apesar de Paulo Freire não ter dedicado seus estudos à educação infantil, Ana Paula ressalta a importância dele em sua pesquisa à medida que ele marca o espaço de educação enquanto conscientizadora. Em conformidade com essa ideia a pesquisadora destaca a necessidade dos professores em entender o seu papel como um profissional, não de uma mãe ou tia, mas intelectuais conscientes e responsáveis pela formação da criança. A pesquisa também cita Gramsci e o conceito de intelectual orgânico: “Nem todo professor é intelectual orgânico, só é se tiver esse papel na sociedade”. O intelectual orgânico é pessoa que se destaca e consegue organizar a classe a que ela pertence.

Plano de carreira

Há uma obrigação federal para que exista plano de carreira, o estatuto sempre existiu.  O plano de carreira pensa a organização possível de uma carreira para pessoas que ingressam no funcionalismo público (como fazer essa carreira para que a pessoa permaneça na educação pública). O Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) obriga a ter piso salarial e plano de carreira; os municípios, ou sindicatos e grupos de trabalhadores, contratam empresas que constroem esses planos.

Quanto às carreiras docentes, as professoras, que são a maioria, estão inseridas nos planos de carreira, ao contrário do que a hipótese previa. Uma vez dentro da carreira, há uma diferença de tratamento entre professores que estão na creche os que não estão. O salário é menor e o tempo de estudos é feito, às vezes, com as crianças. Atualmente, é perceptível uma melhora, mas ainda tem problemas.

Fora isso, a professora tinha a hipótese de que era exigido somente o magistério para atuar em creches, mas muitas capitais exigem, para o ingresso, nível superior. Há lugares que demandam para chegar no final da carreira, um doutorado ou pós-doutorado, como é o caso do Rio de Janeiro. Isso pode ser feito para inviabilizar que se chegue ao fim da carreira. E a pesquisadora discorda desse requerimento, pois 78% desse corpo docente possui graduação em Pedagogia, mas são poucos os que possuem mestrado ou doutorado.

Os impactos nos discentes

Ana Paula defende que a educação de qualidade se faz necessária desde os primeiros anos de vida. “Conhecer novas pessoas, novos modos de viver. A criança dando primeiros passos num mundo público, que é dela por direito”, diz. Só é possível isso com qualidade: quem está lá deve ter consciência de que é um lugar público, letrado, com importância da história, dos materiais, organização do pensamento dentro do imaginário infantil. Esse processo acontece aos poucos, com ajuda de museus, ambientes culturais. Se não for de qualidade, é só um local onde o filho pode ser deixado.

Atualmente, o corpo docente encontra-se fragilizado, pouco aprofundado em geral; trabalhadoras com acúmulo de funções, sem muito tempo de pensar a educação e a profissão delas. Todo esse cenário já era ruim, mas estava dentro de uma proposta política progressiva. Hoje, constata Ana Paula, a ascensão de grupos conservadores no governo, e na opinião pública em geral, potencializa as fragilidades da educação à medida que milita pelo desmonte do caráter público da educação.

Como consequência, perde-se a noção da coletividade dos espaços da educação, e, nesse sentido, a educação passa a ser apenas transmissão de conhecimento, distante de uma formação crítica.

Ana acredita na educação por conta disso, como um dos principais meios de se atingir uma sociedade mais justa e consciente de seus direitos. “Plantar a sementinha” – despertar o senso crítico, a pluralidade de ideias e pontos de vista: primeiro passo da transformação social.

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