A aparência das roupas utilizadas pelos comissários de voo é uma grande preocupação das companhias aéreas. As empresas recorrem até a grandes estilistas para a produção dos uniformes, uma vez que essas roupas são uma importante identificação dos funcionários. O aspecto visual é sempre priorizado, mas, com isso, o quesito segurança passa despercebido.
Ao contrário do que é exigido dos materiais têxteis que ficam dentro das cabines de passageiros, os uniformes dos comissários das aeronaves não passam por nenhum tipo de teste. Visando aplicar questões de segurança nas roupas desses funcionários, então, Márcia Cristina Silva, mestre em ciências pela Universidade de São Paulo, realizou seu mestrado na Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP, intitulado “Análise da inflamabilidade de têxteis de uniformes de aeronautas”.
A única regulamentação que existe em relação às roupas dos comissários é a obrigação de entrega de uniformes por parte das empresas de aviação civil. Na portaria número 6, de 7 de janeiro de 1963 do Ministério de Trabalho e Emprego, tem-se: “Art. 1º – Serão obrigatoriamente fornecidas pelas Empresas de Aviação Civil a seus Aeronautas, sem ônus para os mesmos, as seguintes peças de Uniformes: Boné Completo, Distintivos, Gravatas, Camisas, Distintivos Hierárquicos, Paletó, Calça, Meias, Sapatos, Capote de Frio, Capa de Chuva, Luvas e Bolsas (para Comissárias)”. Nenhuma menção é feita a questões de segurança.
Márcia diz que é necessário entender o trabalho dos comissários além do serviço de bordo, atividade mais conhecida pelos passageiros. Esses profissionais realizam funções relacionadas à segurança do voo, que raramente são percebidas por quem viaja de avião. “Os comissários são os agentes de segurança a bordo, qualificados para realizarem as funções da cabine em situação de emergência, incluindo eventos com fogo e fumaça e, quando necessário, podem decretar procedimentos para garantir a segura e ordenada evacuação dos passageiros”, explica a pesquisadora.
Junto a sua orientadora Júlia Baruque Ramos, professora no curso de Têxtil e Moda da EACH, Márcia analisou o comportamento dos têxteis utilizados nos uniformes da tripulação. Para isso, elas observaram a velocidade de queima dos tecidos em relação às suas características físicas, como gramatura (quantidade de gramas em um metro quadrado de tecido), densidade linear, diâmetro do fio, espessura dos tecidos, fator de cobertura, composição de fibras dos tecidos e direção dos fios de trama e urdume.
Como resultado, as pesquisadoras constataram que uma peça feita de material 67% poliéster e 33% algodão – tecidos mais usados nos uniformes profissionais – têm maior velocidade de queima. Já uma peça confeccionada com material 50% lã e 50% poliéster, com uma gramatura pesada, apresenta o menor valor de velocidade de queima. Isso acontece devido à característica físico-química da lã que, entre as fibras naturais, apresenta a maior resistência à queima.
Os uniformes são geralmente feitos de material composto de poliéster e algodão pois são tecidos relativamente baratos para a indústria de vestuário, segundo as pesquisadoras. “[Esse material] proporciona o conforto e a respirabilidade do algodão, com a força e durabilidade do poliéster. Entretanto, estas fibras e misturas apresentam baixa estabilidade térmica e alta inflamabilidade”.
Casos de focos de fogo em aviões não são comuns, mas são passíveis de ocorrer. Em 1995, uma aeronave que partia de Atlanta, nos Estados Unidos, com destino a Miami, apresentou um incêndio que causou queimaduras de segundo grau nas pernas de uma comissária que tentou combater o fogo. Depois do episódio, a FAA (Federal Aviation Administration), órgão responsável pelos regulamentos da aviação civil nos EUA, divulgou a seguinte nota às Companhias Aéreas: “Especialistas em segurança concordam que, a fim de diminuir a chance de queimaduras, é melhor usar mangas compridas e calças, do que usar mangas curtas e calças curtas. Além disso, os tecidos naturais, tais como lã e algodão, são melhores que os tecidos sintéticos”.
O pronunciamento, de toda forma, não trouxe grandes contribuições à segurança dos comissários, tanto pela sua pouca profundidade quanto pela desatenção das empresas. “Ainda que raros acidentes como esse, é importante sempre buscar aprimorar a segurança nos voos, incluindo também o zelo pela segurança dos combatentes – nesse caso, os comissários de voo”, dizem as pesquisadoras.
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