Quando um município realiza iniciativas na área de habitação, ele pode custeá-las com recursos próprios, receber verba por transferência estadual ou federal ou até por repasses das três esferas ao mesmo tempo. Isso acontece devido ao pacto federativo, que, entre outras coisas, dita como serão distribuídos os recursos orçamentários do país.
Gabriela Terentim dedicou seu mestrado na Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP a descobrir como acontece esse financiamento das políticas públicas de habitação dentro dos municípios, considerando o pacto federativo.
A escolha dessa temática aconteceu porque muito se estuda sobre o produto final das políticas públicas de habitação, mas pouco sobre como isso se dá no orçamento dos municípios. Assim, Gabriela deu início a dissertação intitulada “Financiamento municipal para habitação social: análise do arranjo federativo e suas fontes a partir de três estudos de caso no estado de São Paulo”.
Para realizar o estudo, foi feita uma pesquisa quantitativa a partir, principalmente, de dados do Tribunal de Contas, para analisar como se deu a composição dos gastos em moradia nas cidades selecionadas. Já a escolha dos municípios aconteceu a partir de dois critérios: ter gasto constante com habitação (ou seja, moradia não deveria ser um problema pontual) e uma alta despesa per capita com essa política. A pesquisadora também procurou estudar lugares que não costumam receber muita atenção. “Eu não queria saber como era o orçamento em cidades que estão fazendo coisas muito legais, eu queria estudar os municípios que ninguém está olhando”, conta Gabriela. A partir disso, Mombuca, Oswaldo Cruz e Cubatão foram escolhidas como objetos de estudo.
A partir da pesquisa, Gabriela concluiu que o Estado é muito importante no financiamento de habitação dos municípios menores, como Mombuca e Oswaldo Cruz. Já Cubatão tinha problemas grandes com moradia e financiamentos muito complexos, então utilizava repasses das três esferas. Com isso, ela constatou que a cooperação entre União, estados e municípios é fundamental. “A parceria no financiamento, para todas as políticas, é importante. Mas com habitação, em especial, é ainda mais – porque é muito caro”, explica.
Outra grande contribuição da dissertação foi o que Gabriela percebeu quanto às anulações, ou seja, quando o município anula a verba repassada pelo governo federal. A pesquisadora notou que os municípios fazem isso com frequência e, então, criou uma hipótese. Ela acredita que essa anulação grandiosa decorre da falta de capacidade de prestação de contas por parte dos municípios, uma vez que os sistemas federais são muito sofisticados e exigem prestações complexas.
Gabriela também explica que isso acontece em outros setores sem ser o de financiamento. Muitos municípios não aderem ao Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social, por exemplo, porque não conseguem produzir um plano de habitação – um requisito do Sistema. Isso tudo mostra que muitas capacidades municipais não existem, e então a cidade deixa de se beneficiar com repasses e planos do governo. “É interessante olhar os municípios pequenos por isso. Porque, em tese, são os menos capacitados, e então os que conseguiriam menos recursos”, conta.
A pesquisadora acredita que estudar o quanto as políticas de habitação custam ao poder público e constatar casos como os de anulação são ações importantes para diagnosticar as falhas desse setor – o que é fundamental para quem não consegue ter acesso à moradia via mercado. Além disso, pensa que é preciso ter um olhar crítico quanto a especulação imobiliária: “As pessoas não conseguem comprar uma casa para subsistir. Não existe um incentivo para elas terem um teto através do mercado devido às condições de financiamento. Os programas de habitação são uma forma de ajudar quem não consegue competir com aqueles que estão acumulando imóveis”, conclui.
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