“Nenhum deles tinha a menor ideia do que era”, relembra Bruno Mezencio, doutorando da Escola de Educação Física e Esportes (EEFE) da USP. Ele, que fora nadador em sua infância, decidiu verificar os efeitos em rendimento na natação através de uma abordagem biomecânica deste esporte.
Para isto, estudou a atuação do Número de Strouhal, um parâmetro adimensional fundamental na mecânica dos fluídos, utilizado na caracterização do escoamento – isto é, do fluxo. “Como envolve coisa muito complexas, o adimensional é um grupamento que reúne várias informações dentro de uma variável só”, explica.
O parâmetro consiste na associação entre frequência, comprimento característico, velocidade do fluido e geração de vórtices. Vórtice nada mais é do que um redemoinho, que se movimenta espiralmente ao redor de um centro de rotação.
“De acordo com determinados valores do número de Strouhal, chega-se a uma proporção geométrica”, esclarece Mezencio. “Dependendo dessa proporção, a água ou o vento que passa entre dois vórtices criados é sempre acelerado”, revela.
“Então isso pode ser uma questão de eficiência”, completa. Portanto, ele decidiu avaliar essa relação no aproveitamento e performance de nadadores, reunindo uma amostra bastante heterogênea. Juntou 144 voluntários, dentre homens e mulheres, desde os que mal sabiam nadar até nadadores profissionais.
A inspiração da pesquisa
A relação do Número de Strouhal no movimento de animais foi objeto de estudo de um artigo publicado pela revista científica Nature. Analisando vários tipos taxonômicos de animais aquáticos e aéreos, foi constatado que o deslocamento dessas espécies seguia sempre um mesmo padrão: entre 0,2 e 0,3 de Strouhal.
“E essa proporção é um número adimensional, ou seja, é a mesma tanto para um mosquito quanto para uma baleia”, exemplifica. “Todos esses animais, então, fazem esse movimento por meio de um fluido entre 0,2 e 0,3 de Strouhal”, reforça.
“O estudo chegou à conclusão de que essa foi a maneira como estes animais evoluíram biologicamente para lidar com as características inerentes aos fluidos, seja o ar ou a água”, analisa.
Diante disso, ele pensou: “será que a nossa anatomia e fisiologia permitiria que fizéssemos proveito desse tipo de mecanismo?” Em sua tese, buscou saber se essa relação proporcional também afetaria os seres humanos.
0,5 como meta
Apesar do ser humano não ter evoluído para voar ou, necessariamente, para nadar, apresenta duas estruturas de geração de propulsão: o braço e a perna. Diferente dos peixes e aves, que movimentam suas caudas e asas, respectivamente.
Para evitar que certas características influíssem no resultado (como força, habilidade, tamanho, gênero ou idade), Mezencio buscou trabalhar com um perfil variado de participantes. Assim, chegou à constatação de que os nadadores mais rápidos convergiam para um Strouhal de 0,5.
“Não está dentre o 0,2 e 0,3 daquelas espécies, mas isso já era esperado justamente por causa da questão de braço e perna”, comenta. Ele enfatiza que, tendo o ser humano essas duas estruturas que geram os vórtices, a sincronização delas é essencial para alcançar a proporção e que a consciência corporal dos nadadores pode ser modificada.
Eles também fizeram análise em uma situação de perturbação. Com a utilização de um paraquedas, diminuíam a velocidade dos participantes e observavam se estes iriam alterar a técnica de nado visando buscar a relação proporcional. “E os nadadores mais habilidosos foram os que tentaram adaptar e manter essa faixa de 0,5”, indica.
“Parece que este é o valor ideal para a espécie humana. Mas, para confirmar se realmente é, ou se os participantes só estão o mais próximo possível disso, teria que visualizar o vórtice”, revela. Para isto, seria necessário utilizar uma técnica que ainda não foi aplicada para este propósito, chamada de Particularly Image Velocimetry (PIV), conforme explica o pesquisador.
Número de Strouhal?
Mezencio menciona que nenhum dos nadadores sabia o que era o número de Strouhal, muito menos dos efeitos que a relação causa. Ele aponta que, inconscientemente, os mais experientes ajustavam seu Strouhal para baixo. “Talvez na intenção de corrigir algum movimento, tentativa e erro, ou por muito treino, estes perceberam que de certo jeito funciona melhor”, pontua.
“E tentam ajustar a coordenação deles para que as coisas funcionem segundo essa maneira”, complementa. “Mas quando só se aprende a nadar, não consegue ter esse tipo de coordenação para se beneficiar desse mecanismo”, conta.
Portanto, a importância de se ter conhecimento dessa proporção para o rendimento e performance dos nadadores pode ser essencial no treinamento. Com a orientação acerca de coordenação objetivando um Strouhal baixo, e consequentemente uma maior eficiência, garante-se que tal benefício não seja aproveitado (mesmo que inconscientemente) somente por alguns nadadores.
“Talvez se deixasse que descobrissem pela cabeça deles, cerca de 10% ou 15% apenas daqueles nadadores descobririam isso e elevariam o nível do seu nado”, argumenta. “Sabendo disso, pode-se dar esse feedback para eles, e então não depende mais só deles descobrirem sozinhos como as coisas funcionam”, acrescenta.
Como calcular o seu Strouhal
É bem tranquilo”, adianta Mezencio sobre como saber qual é o número de Strouhal de cada pessoa. Ele começa alegando que, primeiro, deve-se saber a frequência de geração de vórtice. Para isto, basta cronometrar o tempo que se leva desde o momento em que a mão do nadador passa pela linha do seu ombro, até quando o movimento de pernada chega no seu ponto mais baixo.
Então, faz-se a divisão de um (1) por aquele tempo para se obter a frequência. É necessário também saber as posições em que a movimentação aconteceu. Ou seja, a distância, em centímetros, da mão (quando passa pela linha do ombro) e da perna (no seu momento mais baixo) até a superfície da água.
“Basicamente, a diferença entre esses dois valores é a diferença de altura da geração do vórtice”, explica. Além disso, deve-se saber a velocidade média do nadador. “São com essas três informações que se calcula o número de Strouhal”, sintetiza. Basta multiplicar a frequência pela diferença de altura e dividir este valor pela velocidade média em que se estava nadando.
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