Há mais de 80 anos, questões relacionadas ao aumento do nível médio do mar (NMM) começaram a intrigar cientistas. Em busca de padrões que pudessem comprovar a elevação ou redução do volume de água oceânico, estudiosos fundaram organizações científicas não governamentais e desenvolveram métodos de pesquisa responsáveis por construir um enorme banco de dados acerca do tema — que continua sendo alimentado até os dias de hoje. Utilizando-se das informações e contribuindo com uma gama de outras, pesquisadores do Instituto Oceanográfico (IO) da USP especializaram-se em estudar as variações do NMM no litoral sudeste do Brasil, indicando suas mudanças e as consequências geradas por estas.
Em 1931, criou-se a Associação Internacional para Ciências Físicas dos Oceanos (Iapso). Pertencente à União Internacional da Geodesia e Geofísica, foi o primeiro órgão oficial responsável por organizar o recebimento e distribuição de dados médios anuais (NMA) em relação ao nível do mar. Três décadas depois, a Comissão Oceanográfica Intergovernamental apresentou o programa GLOSS (Global Observing Sea Level System), em português, um sistema global de observação do nível do mar. Desde então, ambos projetos são grandes fornecedores de dados sobre a elevação oceanográfica à comunidade internacional — a primeira delas, com conteúdos anuais; a segunda, com dados médios horários.
O Instituto Oceanográfico da Universidade, em 1954, instalou estações maregráficas nas cidades de Cananéia (1964) e Ubatuba (1967), mapeando, assim, o litoral Norte e Sul da região Sudeste. Em pouco mais de seis décadas de pesquisa, foi possível registrar variações diurnas (períodos de 24 horas), semidiurnas (12 horas) e terdiurnas (8 horas) sobre o nível médio marítimo, por conta de marés e oscilações de Chandler — conhecidas por identificar as alternâncias cíclicas dos Polos terrestres.
“Nossas atividades também identificaram oscilações na ordem decadal e interdecadal, associadas às mudanças relativas ao efeito do El-Niño”, comenta o professor Afranio Rubens de Mesquita, do Instituto Oceanográfico. “De mesma forma, foi possível coletar dados refletidos por conta do regime das chuvas na cidade de Fortaleza, Ceará. O volume dos temporais são responsáveis por alternâncias intra-decadais e variações na ordem de 13, 26 e 65 anos, correspondentes aos períodos das chuvas do Nordeste brasileiro.”
Os riscos da elevação do nível médio marítimo
Nas bases oceanográficas, as medições do NMM são feitas de diversas formas: utilizando-se de marégrafos — aparelhos que emitem e recebem ondas eletromagnéticas nos atracadouros que permitem o cálculo em precisão de milímetros —; GPS para aplicação da técnica da gravimetria, buscando variações do terreno segundo meridianos, latitudes e, no caso, principalmente a direção vertical para estimar o nível absoluto do mar local e também fatores meteorológicos; através da pressão atmosférica, velocidade e direção dos ventos, permitindo, assim, a correção dos valores do nível do mar proveniente destes efeitos.
Segundo o professor Mesquita, de maneira geral, os dados relacionados ao nível do mar estão se tornando muito confusos. Tanto pesquisadores que defendem o aumento do volume oceânico, quanto aqueles que são contra esta teoria possuem razões e informações razoáveis para defesa de suas posições. Complementando esse debate, há estudiosos com dados capazes de provar que o NMM estaria diminuindo — em suas próprias percepções, o docente confirma possuir experiências positivas e negativas sobre o tema.
Vale ressaltar que o nível do mar não é de todo constante, variando em função das marés, da ondulação, da pressão atmosférica, da temperatura dos oceanos e de diversos outros fatores cíclicos que sobre ele atuam em períodos que variam de segundos até décadas.
“No que se diz respeito às costas brasileiras, o nível relativo do mar — aquele que não leva em conta o movimento do manto em direção aos polos — aponta que até o final do século 21, alcançaremos um valor de elevação na ordem de 40 centímetros por século. Essa é a nossa realidade. Dependemos apenas da obtenção de recursos financeiros para poder confirmá-la, pois executamos todas medições possíveis na busca para que sermos conclusivos. Entretanto, é impossível dizer se há algum risco real em nossa costa — em particular na região Sudeste do Brasil.”
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