Cientistas da USP desenvolvem nova técnica de detecção de drogas pela saliva

Método permite identificar o uso recente de canabinóides sintéticos com amostras de fluido oral de forma rápida, não invasiva e sustentável

Os novos testes toxicológicos por saliva são mais simples e rápidos, podendo representar  avanços para a polícia e para a saúde pública [Imagem: Freepik/Drazen Zigic]

A luta contra as drogas sintéticas ganhou um aliado relevante: a saliva. Pesquisadores da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da Universidade de São Paulo desenvolveram um método inédito para detectar canabinoides sintéticos, conhecidos como drogas K, a partir da saliva. 

A descoberta é fruto do Inspeqt (Investigação de Novas Substâncias Psicoativas em Química e Toxicologia Forense), laboratório que reúne cientistas da USP e de outras universidades do estado, como Unicamp e UFCSPA. 

Criado em 2021, o Inspeqt tem como objetivo desenvolver metodologias na área de química e toxicologia para permitir a detecção das Novas Substâncias Psicoativas (NSPs) de forma eficaz. O projeto é uma parceria da academia com a perícia científica e é financiado por órgãos como Capes, Senad, Fapesp e o Ministério da Justiça. 

Em 2025, o projeto foi renovado como Inspeqt 2.0, com financiamento assegurado até 2029. A nova fase incentiva o desenvolvimento de tecnologias toxicológicas e amplia a formação de profissionais ao oferecer bolsas de estudo para alunos de graduação, mestrado e doutorado. 

Ameaça de difícil detecção

As Novas Substâncias Psicoativas (NSPs) são drogas sintéticas que imitam o efeito de substâncias tradicionais como maconha, cocaína e LSD, mas com pequenas modificações químicas que as tornam mais difíceis de detectar.

Maurício Yonamine, professor da FCF e coordenador do Inspeqt, explica em entrevista à Agência Universitária de Notícias (AUN) que “as drogas K são o exemplo mais conhecido dessas novas substâncias. Elas são canabinóides sintéticos com nomes como K2, K4, K9 e Spice”. Essas drogas são muito mais potentes e imprevisíveis que a maconha natural. Pequenas alterações em sua estrutura química podem causar desde alucinações intensas até parada cardíaca.

Desde a década de 2010, o mercado dessas substâncias vêm crescendo exponencialmente. Hoje, já são mais de 1.300 compostos identificados no mundo inteiro. O problema, segundo Maurício, é que, como essas drogas são novas e modificadas constantemente, os testes laboratoriais convencionais têm dificuldade para detectá-las. Isso afeta diretamente tanto o trabalho policial quanto a resposta da saúde pública.

“Se não detectamos com eficiência a droga apreendida, traficantes não são presos. Se não detectamos nas amostras biológicas, não sabemos o real impacto dessas drogas na saúde pública.”

Maurício Yonamine

Alternativa rápida, eficaz e sustentável

Para enfrentar esse desafio, o Inspeqt apostou em uma abordagem inovadora: o uso da saliva como matriz biológica para detectar canabinóides sintéticos. Tradicionalmente, exames toxicológicos são feitos com sangue ou urina, mas essas amostras têm limitações. A urina, por exemplo, indica apenas uso mais antigo; o sangue, por sua vez, exige coleta invasiva e processamento mais complexo e demorado. 

“Desenvolvemos uma metodologia que peritos podem aplicar no laboratório para detectar canabinoides sintéticos em saliva de usuários de forma eficiente. A saliva informa que o uso da droga foi bem recente”, explica Maurício. A metodologia foi validada em laboratório e está pronta para ser aplicada em larga escala pela polícia científica. 

Para isso, os resultados da pesquisa e a descrição detalhada da metodologia já foram publicados em um artigo e estão disponíveis para os laboratórios periciais de todo o país. O Inspeqt também prevê ações de capacitação e treinamento voltadas para profissionais da área forense. 

Outro diferencial importante do projeto é a preocupação com a sustentabilidade no laboratório. “Todas as metodologias que desenvolvemos utilizam o conceito de Química Verde”, conta Maurício. Isso significa que os processos evitam o uso de grandes volumes de solventes tóxicos, o que reduz os riscos à saúde dos profissionais e o impacto ambiental.

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