
Um terremoto de magnitude 7.7 atingiu Myanmar, no fim de março, causando mais de 3.000 mortes e 4.000 feridos, segundo dados da junta militar do país. Os abalos também foram sentidos em outros países do Sudeste Asiático, como China e Tailândia, sendo este último o segundo país mais afetado.
Em Bangcoc, capital tailandesa, um prédio em construção desabou depois da sua estrutura colapsar, deixando 15 pessoas mortas e 72 desaparecidas. Ao todo, 22 mortes foram confirmadas no país. A tragédia ocorreu a mais de 1.500 km de distância do epicentro.
Esses efeitos amplificados do sismo chamaram a atenção de especialistas. Segundo Bruno Collaço, sismólogo do Centro de Sismologia da USP, eventos como esse revelam não somente a força da natureza, mas também sua complexidade.
O que causou o terremoto
O abalo aconteceu na região de junção entre a placa tectônica da Índia e a placa da Eurásia, onde há um constante atrito da crosta terrestre. A placa indiana está se movendo para o norte em direção à placa eurasiática, o que forma, por exemplo, a cordilheira do Himalaia e também causa terremotos na região. “O sudeste asiático é geologicamente propício a tremores fortes. Já é o sétimo terremoto com magnitude acima de 7 ocorrido na região”, aponta Collaço.
O epicentro, situado na superfície diretamente acima do foco do sismo, foi registrado a cerca de 10 km de profundidade. Porém, como explica Collaço, esse sismo não aconteceu somente em um ponto específico. “Essa ruptura se iniciou num ponto mas se estendeu por uma falha de cerca de 200 km”, afirma. “Isso significa que um enorme bloco de rochas se rompe em poucos segundos, liberando grande energia”. Em outras palavras, a extensão da falha é proporcional à magnitude do evento, que neste caso foi de 200km.
Por que foi sentido tão longe
Apesar da distância, os efeitos do terremoto chegaram à Tailândia, onde um prédio em construção desabou. Isso se deve, segundo Collaço, ao tipo de rocha presente em áreas costeiras, geralmente formadas por sedimentos. “Rochas sedimentares têm a propriedade de amplificar as ondas sísmicas”, explica. Isso significa que mesmo a quilômetros de distância, um tremor pode ser intensificado por características geológicas locais.
Além disso, quanto mais próximo da superfície for o epicentro, maiores as chances do sismo ser sentido com intensidade pela população e de causar danos.
Eventos de grande magnitude como esse de Myanmar tendem a gerar tremores secundários que podem durar dias, semanas ou até meses. “Essa falha de 200 km pode continuar se movimentando em vários trechos, o que explica por que os tremores continuam ocorrendo após o sismo principal”, diz o especialista.

Ainda assim, segundo Collaço, esses sismos são independentes entre si, mesmo que tenham a mesma origem geológica. “Eles não são uma sequência previsível. Mesmo com as réplicas, cada terremoto é um evento singular”, pontua.
Não é possível prever um terremoto
“Precisamos que o terremoto aconteça para emitir qualquer alerta. Quem está perto do epicentro será o mais afetado, infelizmente”, aponta o sismólogo. Sistemas de alerta eficientes existem apenas para tsunamis, já que as ondas oceânicas levam cerca de 20 minutos para atingir a costa, permitindo evacuações, conforme aponta Collaço.
Apesar do avanço das tecnologias de monitoramento, Collaço explica que ainda se conhece pouco sobre as camadas profundas da Terra. “O maior furo já feito pelo ser humano tem 13 km, e estamos falando de estruturas que vão até pouco mais de 700 quilômetros de profundidade”, afirma. Mais fundo que isso já não ocorrem mais terremotos, pois as rochas, submetidas a pressões e temperaturas extremas, tornam-se tão maleáveis que não conseguem mais se romper. Basicamente, “conhecemos mais sobre o universo do que sobre o interior do nosso planeta”, complementa o sismólogo.
Sistemas de monitoramento
Desde 2010, o Centro de Sismologia da USP, localizado no Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG), utiliza um sistema que recebe, em tempo real, dados de sismômetros espalhados pelo mundo, o SeisComP. “É uma rede internacional. Mesmo que nem os dados estejam disponíveis para todos os países, as informações essenciais chegam via satélite e podem ser analisadas em tempo real”, explica Collaço. O foco do centro brasileiro está nas atividades sísmicas do País, mas os tremores globais também são monitorados.
Planeta vivo
Apesar dos riscos e da destruição que os terremotos podem causar, Collaço lembra que os sismos fazem parte da dinâmica natural da Terra. “Eles são sinais de que o planeta está vivo. A Terra tem uma movimentação interna que não existe na Lua, por exemplo. É essa movimentação que molda o planeta onde vivemos”, completa.
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