
Cientistas mapearam a incidência de embarcações não autorizadas no Refúgio de Vida Silvestre do Arquipélago de Alcatrazes, no litoral norte de São Paulo. O uso de técnicas de monitoramento ambiental acústicas, preferidas pela equipe, pode aprimorar e baratear o custo da pesquisa e do policiamento de áreas de proteção ambiental marinhas.
Sob orientação do professor Marcos César Santos, coordenador do Laboratório de Biologia de Conservação de Mamíferos Aquáticos (LabCMA), o artigo publicado por Ana Marini descreve a utilização de hidrofones fixos – microfones que aguentam a submersão na água – para “fotografar” a paisagem acústica da região. Essas “fotografias” criadas a partir do som do ambiente são chamadas de “espectrogramas” e elas ajudam a visualizar os diferentes agentes do local – de embarcações em passagem aos seus moradores.
Os resultados, publicados na revista científica Ocean and Coastal Research, sugerem que a passagem de cetáceos, como baleias e toninhas, ocorre com maior frequência quando não há trânsito de barcos. Além disso, foi observado o deslocamento de veículos motorizados fora do horário de funcionamento da reserva.
O parque, que teve acesso turístico liberado em dezembro de 2018, conta com rondas de vigilância promovidas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, o ICMBio. O órgão gestor da unidade tem como dever o controle da visitação, que deve ter como única finalidade o lazer. Ou seja, é vetada qualquer atividade extrativista, como a pesca ou a caça.
Apesar disso, embarcações não registradas pela entidade são captadas pelos hidrofones durante o horário de fechamento do parque, nas madrugadas quando não há rondas. Segundo os pesquisadores, esse padrão sugere prática de pesca ou arrasto de redes ilegal.
Os sons de denúncia
Marcos explica que a estratégia de monitoramento adotada do parque de Alcatrazes junta duas coisas importantes na ciência: redução de custos e coleta de dados inéditos. Os hidrofones foram instalados no fundo do mar, com técnica conhecida como fundeio, e permitiram o monitoramento contínuo quando se pensa que ninguém mais está lá – sem importunação da vida marinha.
A análise acústica fornece informações que não são obtidas com facilidade. Equipe, embarcações e logística são alguns dos fatores que encarecem e complicam a vigilância do parque por meios tradicionais – patrulhas, por exemplo. Os dados, ainda que estudados após os eventos, proporcionam aos cientistas tendências estatísticas – como, quando e quantos barcos ou baleias passam lá por semana.
Ana Marini, autora principal do artigo e ex-aluna de Iniciação Científica, foi responsável por examinar os espectrogramas gerados a partir das gravações. “Fiquei impressionada! Em todos os dias de julho havia sons de baleias”, conta. Julho é o auge do período reprodutivo de várias espécies de cetáceos.
“Não é uma ferramenta só para Alcatrazes”, afirma o coordenador do projeto. Marcos defende que toda unidade de conservação marinha deve ter monitoramento acústico garantido por lei. Hoje, essa tecnologia não é mais cara. Ela permite que a fiscalização de áreas e espécies em cenários adversos, ermos, e nisso “o Brasil é um prato cheio”
Na malha fina
O artigo descreve três formas de visita no parque: pesquisa e monitoramento pelo ICMBio, turismo regularizado e “outras atividades” – possivelmente associadas à prática pesqueira não autorizada. Os resultados corroboram com essa ideia e apontam para uma maior ocorrência na madrugada de dias úteis. Para o professor, os invasores “casaram defeitos do monitoramento com a biologia”, ou seja, a inviabilidade do monitoramento 24h com o papel dos animais da região, que se tornam mais vulneráveis à pesca nas primeiras horas do dia.
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