A seca sem precedentes no Vale do Peruaçu: ciência, preservação e o papel da sociedade

[Parque Nacional Cavernas do Peruaçu: Reprodução/Diego Bento]

No coração do Vale do Peruaçu, em Minas Gerais, cientistas desvendam os efeitos do clima em um cenário de aridez sem precedentes. Segundo o geólogo e professor do Instituto de Geociências da USP, Nicolás Strikis, a análise de espeleotemas – formações calcárias encontradas em cavernas – revelou que a região enfrenta sua seca mais intensa dos últimos 720 anos, evidenciando os impactos das mudanças climáticas globais. 

Em entrevista à Agência Universitária de Notícias (AUN), Strikis explica: “Os espeleotemas funcionam como pluviômetros naturais, registrando as chuvas do passado em suas camadas de crescimento”. O estudo, baseado em formações da Caverna da Onça, utilizou dados isotópicos para reconstituir o clima da região desde o ano de 1290. “A partir da década de 1980, começamos a observar uma tendência de seca inédita, acompanhando o aumento das temperaturas regionais e globais.” 

Esse cenário afeta não só o meio ambiente, mas também a população local, majoritariamente rural e dependente da agricultura familiar e do turismo. “A redução da vazão dos rios compromete atividades agrícolas e atrativos turísticos, como os banhos no Rio Peruaçu. Além disso, há um risco real de mudança de bioma, com o avanço da caatinga sobre o cerrado devido ao balanço hídrico negativo”, alerta o pesquisador. 

A pesquisa destaca ainda que o aumento da aridez no Vale do Peruaçu não pode ser atribuído apenas a fatores locais. “A seca é reflexo direto das mudanças climáticas globais, que alteram o sistema climático de forma ampla”, afirma Strikis. O fenômeno inclui o aquecimento do Atlântico Sul, que modifica padrões de precipitação e reduz a nebulosidade, contribuindo para o aumento das temperaturas na região. 

Enquanto as mudanças climáticas impõem desafios, iniciativas de preservação, como o reconhecimento do parque pela Unesco, representam oportunidades. “Esse reconhecimento chama a atenção para a importância de se preservar a região, fomentando políticas públicas e valorizando o turismo sustentável”, diz Strikis. Ele destaca ainda o papel do ecoturismo em fortalecer a economia local sem agredir o meio ambiente. 

Para o professor, a preservação passa por um senso de pertencimento. “O Vale do Peruaçu é nosso. Essa beleza e riqueza natural são nosso patrimônio. Desenvolver esse vínculo é essencial para entendermos a importância de proteger essa área e garantir um futuro sustentável para suas comunidades e ecossistemas.”

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