Um novo projeto do Centro de Biologia Marinha da Universidade de São Paulo (Cebimar-USP) está explorando o papel ecológico dos peixes-cirurgiões do gênero Acanthurus nos ambientes recifais rochosos subtropicais. A equipe, sob orientação do professor Fernando Gibran, da Universidade Federal do ABC (UFABC), analisa três espécies — Acanthurus bahianus, Acanthurus chirurgus e Acanthurus coeruleus — com o objetivo de entender melhor suas dietas e suas funções nos ecossistemas locais. Este estudo é parte de uma tese de doutorado conduzida por Bruna Maganhe, com coorientação de Kendall Clements, da University of Auckland.
Embora sejam considerados herbívoros, evidências sugerem que algumas espécies também se alimentam de detritos — resíduos que contêm uma grande variedade de micro-organismos e matéria orgânica. Gibran explica que estudar a ecologia nutricional desses peixes é essencial para entender a importância de cada tipo de item alimentar (algas, animais, detritos). Assim, é possível compreender melhor os papéis funcionais desses peixes como herbívoros e suas diferentes posições como consumidores na cadeia alimentar.
Para encontrar essas respostas, a pesquisa utiliza metodologias detalhadas, incluindo análises visuais e microscópicas dos conteúdos digestivos. Duas das espécies de Acanthurus estudadas, A. bahianus e A. chirurgus, possuem moelas e são mais aparentadas entre si. Essas moelas ajudam na trituração dos alimentos ingeridos e, possivelmente, no processamento mecânico de microalgas presentes no detrito junto com o sedimento. Em contraste, a espécie que não possui moela deve depender mais da fermentação para digerir macroalgas.
“Testes com enzimas e marcadores específicos nos ajudarão a identificar quais tipos de algas são efetivamente aproveitados por cada espécie de Acanthurus”, explica o pesquisador. “Tendo evidências de que tipo de herbívoros são, não apenas pelo que ingerem, mas também pelo que digerem e assimilam, podemos avaliar melhor seus papéis funcionais no fluxo de energia e na dinâmica e complexidade recifal”, complementa.
Zonas de transição
A pesquisa também considera a área de transição entre as Províncias Zoogeográficas Marinhas Argentina (temperada-subtropical) e Brasileira (tropical), onde esses ambientes recifais são afetados tanto pela Corrente do Brasil, quente e oligotrófica, quanto pela Corrente das Malvinas, fria e rica em nutrientes.
Durante a primavera e o verão, a região é influenciada pela chegada da Água Central do Atlântico Sul (Acas), que forma uma termoclina e eleva a concentração de nutrientes, favorecendo a produtividade primária na costa. Com o recuo da Acas no outono e inverno, as águas costeiras se tornam mais homogêneas devido à mistura provocada pelos ventos e correntes.
“Essas variações sazonais influenciam as condições oceanográficas e, possivelmente, a disponibilidade de recursos alimentares para os peixes. Assim, o estudo também testa se há consistência temporal nas dietas dessas espécies ou se elas têm flexibilidade conforme a oferta de alimentos”, explica o pesquisador.
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