Instalação de usinas hidrelétricas na Amazônia prejudicou comunidades ribeirinhas

Diversos pescadores tiveram que abandonar sua principal fonte de renda ou mudar para regiões com melhores condições por conta de mudanças no fluxo hidrográfico do Rio Madeira

Hidrelétrica
Hidrelétrica Santo Antônio, localizada no Rio Madeira (Imagem: Reprodução/Facebook/Página Santo Antônio Energia)

A implementação das usinas hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, ambas na Amazônia, prejudicou a população ribeirinha da bacia hidrográfica do rio Madeira. Essa é uma das conclusões de um estudo realizado por pesquisadores de diferentes instituições, incluindo a Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP (EACH).

A pesquisa feita por eles aponta que houve, por exemplo, impactos negativos na “organização e prática de atividades econômicas, como a pesca, agricultura e extrativismo”.

Os materiais utilizados para identificar as mudanças ocorridas foram analisados a partir de cinco dimensões e referem-se às comunidades de São Carlos, Cajubim Grande e Calama, localizadas no município de Porto Velho (RO).

Mapa
Localização das comunidades de Cujubim, São Carlos e Calama, além das barragens de Santo Antônio e Jirau

“Migração forçada” de trabalhadores

Um dos principais pontos destacados pelo trabalho foi que as mudanças nos fluxos hidrológicos do Rio Madeira (causadas pela construção das usinas de Jirau e Santo Antônio) influenciaram na produtividade pesqueira.

Em Calama, por exemplo, a pesca artesanal representava quase metade (47,8%) das atividades econômicas dos moradores. Mas, depois das barragens, houve uma redução significativa dessa prática: muitas pessoas mudaram de profissão ou migraram para territórios vizinhos em busca de melhores condições.

Segundo o engenheiro ambiental Guilherme Prado Alves, isso ocorreu também por conta da nova organização de pesca.

“Antigamente, havia algumas regras que os próprios pescadores definiam entre si, como a fila. Cada um tinha a oportunidade de lançar sua rede por um determinado período e isso garantia o estoque de peixes. Mas essa estrutura de governança informal acabou se enfraquecendo e se desfazendo em alguns lugares”, afirma.

A alimentação dos ribeirinhos evidencia de forma clara esse processo de declínio: antes, o consumo de pescado prevalecia em todas as regiões. Depois das hidrelétricas, porém, ele passou a ocorrer raramente ou de uma a quatro vezes por semana.

Compensação financeira inócua

Apesar dos impactos socioambientais causados pelas usinas já serem esperados, havia a expectativa de que o dinheiro arrecadado para compensá-los geraria melhorias para os povos ribeirinhos em áreas como saúde e educação. Contudo, isso não foi notado nas comunidades próximas à Jirau e Santo Antônio.

Uma comparação de entrevistas conduzidas em diferentes momentos (antes e depois da chegada das hidrelétricas) com famílias residentes desses locais mostrou que não houve mudanças significativas no nível educacional.

Além disso, o saneamento básico até piorou alguns aspectos. Em São Carlos, por exemplo, a porcentagem de indivíduos que informaram ter acesso à água tratada caiu de 100% para 72%.

De acordo com a mestre em Ciências (com ênfase em sustentabilidade) Silvia Sayuri Mandai, grandes projetos energéticos como esse exigem que diversos fatores sejam levados em consideração na hora de planejar uma compensação financeira.

Mas, nesse caso, a percepção de muitas pessoas foi de que houve uma baixa inclusão dos principais impactados. “Algumas pessoas falam que faltou informação, organização e espaços participativos para que fizesse sentido para elas”, conta Mandai.

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