Os representantes do gênero Sapajus de macacos-pregos são bastante cosmopolitas e estão espalhados por toda a América do Sul, desde florestas tropicais e fechadas, como Mata Atlântica e Amazônia, até ambientes mais abertos, como Cerrado e Caatinga.
Nesses dois últimos biomas, as populações de Sapajus assumem posições mais bípedes, o que leva Patrícia Izar, pesquisadora de comportamento animal do Instituto de Psicologia, a questionar: “eles são mais bípedes porque são geneticamente diferentes em termos de anatomia e propensão ao uso dessa postura ou porque eles se desenvolvem muito mais no chão e adotam muito mais essa postura?”
Perguntas nesse mesmo sentido vêm movimentando o projeto de pesquisa coordenado por Izar Plasticidade fenotípica de macacos-prego (gênero Sapajus): investigação sobre o efeito de trajetórias ontogenéticas distintas e de ativação contexto-dependente. O objetivo é entender o desenvolvimento do animal desde a fecundação até sua maturidade mediante seu contexto.
Uma das pesquisas mais recentes do projeto analisa filhotes de macacos-prego da espécie Sapajus xanthosternos em suas relações sócio afetivas com a mãe. Nele, Nayara Teles, bolsista de treinamento técnico do projeto, verificou que à medida que os filhotes crescem, eles se distanciam da mãe e passam a apresentar novos comportamentos. A pesquisa foi premiada no International Student Course in Behavioural Biology 2021 promovido pelo Institut Francilien d’Éthologie, em janeiro deste ano.
Teles acompanhou o desenvolvimento de dois filhotes machos e duas fêmeas da Reserva Ecológica de Una, no sul da Bahia. Ela observou um dia inteiro de cada semana do primeiro, segundo, terceiro, 15º, 21º, 27º e 33º mês de vida dos filhotes. O trabalho de Nayara bebeu do banco de dados do projeto, que coleciona gravações de macacos-prego desde 2013 e soma 50 mil vídeos.
Os dados coletados indicaram que comportamentos de amamentação, proximidade e carregamento no dorso eram mais frequentes nos primeiros três meses de vida do filhote. Depois, a prole vai se tornando independente da mãe com o desmame e o desenvolvimento de seu sistema locomotor, que o leva a ampliar sua rede social e a explorar seu habitat.
Mas o que realmente não era previsto nem por Teles nem pelos demais pesquisadores do projeto foram dados que sugeriam que infantes fêmeas recebem mais cuidados das mães do que os machos.
O favorecimento das filhotes fêmeas em detrimento dos machos pode ser explicado pela coalizão social, em que fêmeas investem mais em fêmeas. Um dos comportamentos praticados entre mãe e filho, a catação, além de promover a higiene, reduz tensões e assegura as relações dentro do grupo. As fêmeas têm os maiores níveis desse comportamento, que sinaliza uma aliança e troca de apoio entre elas.
Um estudo também focado na espécie de macacos-prego Sapajus xanthosternos levantou dados que indicam que a vigilância é uma fonte de estresse para espécies cativas, enquanto que para os selvagens é uma forma corajosa de se defender de predadores. Além disso, os seres humanos, que despertam curiosidade nas populações selvagens, não provocam o mesmo estranhamento nas cativas.
Isso explicita a plasticidade fenotípica, termo incluído no nome da pesquisa de Patrícia Izar. Ele se refere à capacidade de um conjunto de genes, ou seja de um genótipo, se desenvolver em resposta a diferentes contextos ambientais. O estudo hipotetiza que diferentes características visíveis, os fenótipos, não necessariamente correspondem a composições genéticas distintas, mas desenvolvimentos diferentes de um mesmo genótipo.
Em fevereiro de 2020, outra publicação do projeto, assim como o trabalho de Nayara Teles, se debruçou sobre o desenvolvimento dos jovens macacos Sapajus xanthosternos. Os pesquisadores notaram que não é possível estabelecer uma personalidade para os filhotes até os três anos de idade.
Contudo, a equipe encontrou uma tendência de queda na sociabilidade dos animais, ao longo de seu desenvolvimento. A sociabilidade é representada por comportamentos como catação, cuidados, toques, aproximação, e estalar os lábios. Já a ansiedade, marcado por padrões repetitivos de arranhar e se alimentar, cresce. Esse comportamento se torna algo mais consistente a partir do 9º mês, período que coincide com o desmame dos filhotes.
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