Professor cria dispositivo para facilitar a observação de astros nas escolas

Dispositivo capaz de apontar e acompanhar objetos no céu noturno. Instrumentos de calibração parafusados na placa de acrílico na esquerda. Plataforma móvel acoplada à engrenagem; se move horizontal e verticalmente. Emissor de laser entre preso entre duas placas (pode ser substituído por pequena luneta).  Fonte: Arquivo pessoal.

Dispositivo criado pelo professor Ubiratan de Campos em seu mestrado no Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP para incentivar a observação do céu noturno nas aulas do Ensino Médio é composto por uma placa de informática, instrumentos de calibração e uma plataforma móvel em que pode ser acoplado um laser ou uma pequena luneta. O aparelho localiza e acompanha os astros em seu movimento, facilitando seu uso didático.

Para Ubiratan, que leciona Física no Ensino Médio, um dos maiores problemas no ensino de Astronomia é a desconexão entre os materiais didáticos e seu objeto de estudo. “Em um livro didático, parece que tem alguém lá de fora do sistema solar observando os planetas. O sol no meio, o resto dos planetas girando ao redor. Mas isso ninguém nunca viu”, afirma ele. A solução seria realizar mais observações do céu, o que nem sempre é possível, não só pela falta de orçamento para instrumentos, mas também pela dificuldade dos professores em se localizar e montar uma luneta. 

Seu dispositivo busca resolver ambos problemas. Ao mesmo tempo que custa bem menos que produtos similares, apenas R$ 511,00, ele também realiza este trabalho técnico automaticamente. Mas antes, precisa ser calibrado. 

A primeira grande dificuldade é encontrar o astro nos milhares de pontinhos no céu. “É como ir viajar para um lugar longe. É preciso ter uma referência: uma cidade, uma montanha, etc.”, afirma Ubiratan. No caso do dispositivo, este é o “ponto zero”, a partir do qual saberá em que direção mover-se, programando uma espécie de rota (ou uma série de movimentos) para ir do seu local de partida para seu destino.  Este é necessário pois as posições no espaço são relativas, não há frente ou trás, acima ou abaixo. Tudo depende do observador. 

Para defini-lo, usa-se um magnetômetro, peça semelhante a uma bússola, que localiza o norte geográfico e nivela o dispositivo com o horizonte. O ponto de encontro entre o norte e o horizonte se torna o ponto zero.

Após esta calibração, o professor deve selecionar qual astro deseja observar usando o software Stellarium. Este é um programa de código aberto, utilizado para observar virtualmente o céu noturno. Ele possui um imenso banco de dados, em que o usuário pode pesquisar pelo planeta ou estrela que procura. “Quando encontra o objeto, ele diz as características, como o nome e o brilho. Aparece também as coordenadas equatoriais e coordenadas horizontais, que alimentam meu dispositivo”, afirma o Ubiratan.

Interface do software Stellarium, observando virtualmente Júpiter. Nota-se a barra de pesquisa permitindo encontrar qualquer astro e as coordenadas e ângulo de localização do planeta, atualizados em tempo real. Fonte: Captura de tela do site oficial do programa.

Com essas informações, o dispositivo traça uma rota, a partir do ponto zero. O deslocamento é realizado por dois motores de passo, um responsável por mover o mecanismo no azimute (ângulos na horizontal) e outro na altura (ângulos na vertical). Como os motores movem-se cinco segundo no mínimo, é preciso que o código converta o ângulo proveniente do Stellarium, definindo o quando eles devem se mover para atingir o destino.

Com isso, o movimento é executado. Mas, segundo Ubiratan, ainda há um problema: “Se demorar para mirar o objeto, ele já foge do campo de visão”. Apesar de parecer o contrário, a Terra e os astros ao seu redor estão em um veloz movimento, seja ao redor de si, orbitando outro astro ou através do espaço. Com a posição do observador e dos objetos em constante mudança, é preciso ajustar também o telescópio para não perdê-los de vista. “A vantagem desse meu dispositivo é que ele não só aponta, mas acompanha”, afirma o professor. Veja o movimento de Júpiter no vídeo abaixo:

 

Conforme o deslocamento, os dados do Stellarium são atualizados, mudando o ângulo fornecido ao dispositivo. Quando esse ângulo é grande o suficiente para requerer um ajuste, o dispositivo se move novamente, recolocando o objeto no centro. Essa funcionalidade e software escrito pelo próprio Ubiratan, tornam o uso do dispositivo simples, mesmo sem conhecimentos técnicos.

Mesmo com as vantagens do dispositivo, Ubiratan afirma que ainda é apenas um protótipo. Infelizmente, seus testes em escola foram atrapalhados pela pandemia de Covid-19, e ele ainda necessitará de um código e montagem mais robustos antes de poder ser amplamente utilizado. Mesmo assim, já é uma grande vantagem para alunos e professores, permitindo que façam o uso do céu: um recurso didático universalmente presente, mas pouco utilizado. Segundo ele, só assim “as pessoas começam a entender como surgiram as ideias que nós vemos apenas nos livros”.

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