Software classifica grau de autismo de crianças

Técnica do rastreamento do olhar identifica local de maior incidência da visão e torna acessível o diagnóstico para famílias mais carentes.

Programa desenvolvido em parceria de Faculdade de Medicina e Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP foi criado com base nas características da fixação do olhar. (Foto: Ilay Pavlov - Unplash)

A classificação do diagnóstico autista, hoje, é dividida em grave e não grave. No entanto, ainda não é precisa o suficiente ao ponto de apresentar subdivisões. Segundo a psiquiatra e recém-mestre da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) Mirian de Cesaro Revers Biasão, por se tratar de uma população heterogênea, o paciente pode até apresentar o mesmo diagnóstico que um outro, porém, há uma tendência significativa de que apresentem diferenças clínicas e respostas distintas ao tratamento.

“Na prática, percebemos que casos considerados graves, por exemplo, são muito diferentes entre si. Assim, para fazer a pesquisa tanto de tratamento como de prognóstico fica muito difícil, pois como você obterá resposta à medicação? Será que a pesquisa não teve um resultado satisfatório, porque o grupo era plural ou porque realmente o remédio não é eficaz?” Esclarece, a pesquisadora.

Pensando em toda essa questão, Biasão resolveu desenvolver o seu trabalho de mestrado com as categorias do autismo, usando a técnica do rastreamento do olhar (eye tracking) e buscando entender melhor o funcionamento do cérebro do autista.

Eye tracking em ação

O rastreamento do olhar é uma ferramenta que avalia o direcionamento do olhar, para isso é utilizado um software e câmeras, capazes de verificar para onde a criança está olhando enquanto ela assiste ao conteúdo projetado na tela. “É uma ferramenta simples de ser aplicada e que se pode aplicar até remotamente, pois alguém coleta esses dados e os envia para análise”, explica a pesquisadora.

O desenvolvimento do estudo contou com a avaliação de 90 crianças de três a 16 anos, que foram atendidas no Programa de Transtornos do Espectro Autista (PROTEA)*, ambulatório especializado em autismo do Hospital das Clínicas. Os pacientes apresentavam diferentes graus para o diagnóstico e os níveis de funcionamento. Para saber a gravidade de cada caso, Mirian utilizou a Childhood Autism Rating Scale (CARS), uma escala diagnóstica que divide e pontua o grau do Transtorno do Espectro Autista (TEA) em leve, moderado ou grave. 

Para aplicar a técnica do eye tracking foi desenvolvido um software de análise de dados em parceria com a pesquisadora Jéssica Santos, que estava produzindo a sua dissertação de mestrado pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH). Ao reproduzir uma tela em que metade aparecia padrões geométricos e a outra, crianças brincando ou praticando yoga, a máquina identificava a região em que o olhar permanecia a maioria do tempo. 

Com base nisso, o caso era classificado como grave ou não grave. O computador, através de um mapa de saliência, em que se identificava para onde o paciente olhava mais, era capaz de fazer essa classificação sozinho com uma precisão de 80%.

Crianças com TEA tendem a prestar menos atenção nas cenas de interação social. (Arte: Ronny Overhate – Pixabay)

Aprendizados e expectativas

Para a mestre, o trabalho foi importante para entender a dinâmica da pesquisa e melhorar como clínica. “Existem tantas dificuldades que a gente encontra no caminho, como conseguir que os pacientes venham, que terminem todo o protocolo e até em entender melhor toda a questão da literatura acadêmica. Quando se lê um pleito, depois de fazer uma pesquisa, você passa a entender o que aquele pesquisador passou. Você fica com uma crítica sobre a literatura científica muito melhor e isso auxilia na prática.”

Biasão acredita que a ferramenta do rastreamento do olhar pode contribuir na identificação de subgrupos de TEA e na escolha do melhor tratamento para cada paciente. “São coisas muito importantes que, hoje, na clínica, não existem. O diagnóstico do transtorno do espectro autista depende da visão do especialista que, claro, quanto mais treinado, melhor fica, mas que são raros. Existem regiões muito carentes que não possuem nenhum, o que faz com que muitas famílias viajem quilômetros para levar os filhos à consulta médica”, destaca a pesquisadora.

Além disso, ela considera a independência de um avaliador um ponto importante. “Passa-se a ter um dado objetivo e quantitativo daquela criança, o que é uma informação bem relevante.” 

*Se tiver dúvidas ou quiser receber atendimento envie um e-mail para autismousp@gmail.com

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