
As primeiras 72 horas de amamentação são as mais importantes para a criança no desenvolvimento do corpo contra infecções: esse leite produzido pelas mães nos primeiros dias – chamado colostro – passa para o recém-nascido células de defesa essenciais ao sistema imunológico. E em mulheres obesas, há uma característica especial: ele contém melatonina a mais, hormônio que regula a saciedade e ajudaria o bebê na prevenção da obesidade.
Na Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, essa foi uma descoberta inesperada durante o doutorado de Tassiane Morais. Ela estudou o colostro de mulheres em sobrepeso ou obesas e o impacto de possíveis mudanças em sua composição para o bebê.
A descoberta mostra que o corpo da mãe cria formas de prevenir o sobrepeso e as transmite ao filho. A melatonina é geralmente liberada em alta concentração à noite, ganhando o apelido de “hormônio do sono”. Assim, regula o metabolismo – nossa capacidade de liberar energia – e do relógio biológico, que determina nossos horários de sono e atividade.
Existem vários mecanismos de ação para um mesmo hormônio. Estudos mostram que a melatonina também possui ação positiva nos níveis de colesterol, regula o apetite e tem potencial para inibir a produção de células que armazenam a gordura do corpo, os adipócitos. “E aumenta a proteção do leite. A amamentação deve ser incentivada porque o bebê receberá quantidade diferenciada desses hormônios”, explica Tassiane.
Foram, no total, 109 amostras de colostro cedidas por mulheres que realizaram o parto no Hospital Universitário (HU) da USP. Entre elas, 61 estavam em excesso de peso. Tassiane levou em conta a classificação da Organização Mundial da Saúde (OMS) para considerar o sobrepeso ou obesidade: o Índice de Massa Corporal (IMC), que calcula o índice de gordura no corpo em relação à altura.
Eram mulheres entre 18 e 35 anos e que não tiveram partos prematuros, entre 37 e 41 semanas de gestação. Ter todos os exames de gestação negativos também foi um critério essencial, pois evitaria a intervenção de outras doenças. Por fim, Tassiane procurou mães que realizaram todo o pré-natal e não tinham restrições alimentares, como diabetes ou intolerância a lactose.
Mudança nas defesas celulares
Enquanto os hormônios se encontram essencialmente no líquido, os macrófagos, células de defesa do corpo, fazem parte da estrutura celular do leite. E a resposta imunológica, ligada ao desempenho dos macrófagos, era menor no colostro de mães com excesso de peso.
Foram várias simulações de infecção para medir o percentual de fagocitose em leites de mães com sobrepeso e normais. A fagocitose é o processo de ingestão e destruição de micróbios pelos macrófagos. Quanto maior, melhor a resposta das células a uma doença. “Coloquei a amostra pra fazer fagocitose. E, no excesso de peso, a atividade é menor”, explica.

Isso não significa que filhos de mulheres obesas terão menos proteção contra doenças. A pesquisadora considera que ainda é delicado afirmar, já que as simulações foram feitas in vitro, ambientes controlados e isolados de laboratório, e não em crianças – que têm contato com micro-organismos diversos, fruto dos espaços e pessoas que convivem.
Entre descobertas, Morais ainda considera que a melhor indicação é o incentivo ao aleitamento materno em todas as situações. O efeito de “primeira vacina”, como é conhecido o colostro, continuaria independentemente do peso da mãe. E é benéfico na proteção de outras doenças crônicas.
Para ela, a principal importância é perceber que o aleitamento materno protege a criança sempre, e como são necessárias campanhas pró-amamentação. “A obesidade causa impacto no leite materno, e é uma área pouco explorada, mas dentro dela podemos achar respostas como uma estratégia de intervenção da própria obesidade”, conclui.
Faça um comentário