Na 21ª Conferência das Partes (COP21), 195 países adotaram o compromisso de reduzir consideravelmente a emissão dos gases estufas e, desse modo, desacelerar o aquecimento global. A fim de analisar o potencial brasileiro no cumprimento das metas do Acordo de Paris, a pesquisadora Carolina Cristina Fernandes, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP (FEA), realizou um estudo avançado sobre a articulação da governança brasileira e sua influência nas chamadas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC na sigla em inglês).
A pesquisa pode constatar que apenas a redução do desmatamento e a recuperação florestal seriam responsáveis por reduzir 37% do volume de CO², além de apresentar custos mais baixos. “Essas medidas são mais viáveis financeiramente, pois não requerem tanta tecnologia, como seria caso optássemos por alterar nossa energia e agricultura. Para substituir um combustível fóssil por uma energia limpa requer mais investimento do que plantar uma árvore”, comenta Carolina.
A NDC brasileira trazia oito metas, dentre elas zerar o desmatamento ilegal na Amazônia e o fortalecimento do Código Florestal. Mas, para a pesquisadora, existem três pilares que vem dificultando o processo: governança precária, falta de financiamento e pouco diálogo com os proprietários das terras.
A governança somos nós
O estudo mostra que a governança ideal não é composta apenas pelo governo. As ONG’s, biólogos, cooperativas e sociedade civil também são fundamentais para o processo. Entretanto, seria papel do Estado realizar a articulação entre todos esses níveis de governança. “É possível notar, até pelos fatos mais recentes, que o governo não conversa com a academia e não busca diálogo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), mesmo sendo uma instituição renomada. Falta um arranjo entre todos esses agentes para fluir”, comenta.
A ação das ONG’s, por exemplo, seria essencial na captação de recursos e monitoramento. Elas têm sido, inclusive, o ponto chave do processo de aproximação desses programas com a sociedade e contribuído com a conscientização. Segundo dados do IBGE publicados neste ano, em 2016 existiam 15.919 fundações e associações sem fins lucrativos na região amazônica, abrangendo os estados da região norte do País.
Contudo, para a pesquisadora a parte mais complexa do processo estaria em incluir os proprietários de terras. Por uma questão financeira, muitos recusam-se a respeitar o Código Florestal ou iniciar um processo de reflorestamento em áreas desmatadas. “A curto prazo você desmata, planta, vende e tudo bem. Mas com o tempo os custos serão altos”.
Grande parte do desmatamento no Brasil, é realizado por fins econômicos, visando a utilização do solo para a criação de gado ou plantações. O grande desafio, nesse contexto, está em estabelecer um diálogo capaz de alertar sobre os riscos e consequências do desflorestamento. “ A temperatura e regulação hídrica são essenciais para a agricultura, mas são bens finitos e dependem da preservação das florestas”, indaga a pesquisadora.
Floresta em pé também é ganho econômico
Um conceito muito conhecido em economia é a necessidade de gerar empregos para aquecê-la. No entanto, no trimestre de fevereiro a abril deste ano, o Brasil apresentava um índice de 13,2 milhões de pessoas desempregadas, segundo dados do IBGE.
Uma área pouco falada e com grande potencial para geração de emprego está no setor de produção de sementes e mudas. A proposta da pesquisadora é aquecer esse serviço e gerar uma maior demanda por parte do governo, que estaria atuando na restauração florestal. “Atualmente não temos um estoque para realizar toda recuperação necessária, o objetivo é que o aumento da demanda seja o que falta para que essa roda de produção comece a girar”
Um outro viés também importante para a economia está na geopolítica. Cada vez mais os países vêm se preocupando com a questão ambiental, sendo de extrema importância manter uma boa impressão nesse quesito. Carolina acredita que com a adequação do Brasil aos parâmetros ambientais, as exportações e acordos nacionais terão maiores chances de acontecer.
O comprometimento do Governo com a causa ambiental deve ser mantido mesmo com a mudança partidária, pois o êxito depende da continuidade. Teoricamente, não existem penalizações formais, caso o Governo vigente não tenha como prioridade o cumprimento do acordo, mas consequências devem ser esperadas. “É uma perda indireta, porque reflete nos contratos comerciais. Um exemplo atual é a o acordo do Mercosul com a União Europeia estar desestabilizado em razão da questão ambiental brasileira”.
Arrumando a bagunça
Como proposta, Carolina sugeriu a criação de uma Agência Reguladora das Mudanças do Clima (ARMC). Com o objetivo de cumprir o Acordo de Paris por meio de soluções já existentes, a empresa estaria diretamente vinculada ao Ministério da Casa Civil.
A fundação da ARMC seria o equivalente para resolver os problemas de governança, citados anteriormente. Mediante a metas e indicadores de monitoramento, a estatal agiria ativamente na restauração, recuperação e reflorestamento de áreas degradadas, visando a remoção de gases de efeito estufa da atmosfera.
Todavia, após dois anos, é recomendado que a ARMC se transforme em Autoridade Nacional das Mudanças no Clima (ANMC). Seria uma empresa com os mesmos objetivos e missão, mas com ligação ao governo federal e o Presidente da República, que por sua vez ficaria responsável por nomear profissionais competentes e com capacidade técnica para assumir os cargos.
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