Nas madrugadas, as ruas são ocupadas por barulhos mecânicos de caminhões de lixo, que ocupam as vias em período de extremo silêncio. A coleta de lixo é imprescindível. Mas, e se existisse uma solução com menos ruído? E se essa solução tivesse vantagens ambientais? De fato, existe: os caminhões de lixo movidos a gás natural. Tema da publicação científica do professor Edmilson Moutinho dos Santos.
Atualmente, a frota de caminhões de lixo das cidades é movida a diesel, combustível derivado do petróleo e, portanto, sujeito às variações de preço e às pressões da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep). Além dos desafios econômicos, o diesel causa mais prejuízos ao motor, por ter mais elementos particulados, que danificam a estrutura, relata Edmilson.
O caminhão de lixo movido a diesel é barulhento. E emite mais gás carbônico, responsável pelo aquecimento global. Por isso, é digno de questionamento por que as prefeituras ainda optam por esse tipo de veículo. Principalmente quando há outra opção no mercado.
O gás natural veicular (GNV) é um combustível com preços mais estáveis, porque não entra na política petrolífera. As emissões de carbono são menores, o que impacta a qualidade do ar e, consequentemente, a saúde da população.
Mas o gás tem menor densidade energética. O que significa que um motor movido à GNV é menos potente e demanda maior quantidade de combustível. Assim, no cenário atual, é como se o consumidor estivesse comprando “elas por elas”, explica o professor do Instituto de Energia e Ambiente (IEE).
No entanto, ele ressalta que, com o aumento do uso de gás natural, a tendência é que essa situação mude. “Na medida em que há condições de trazer esse gás para o mercado, tende a ter uma vantagem de custo do preço do gás em relação ao preço do diesel. Vantagem acima dessa diferença de densidade.”
No momento, a opção de caminhões a gás ainda é mais cara e trabalhosa, uma vez que não existe grande oferta no mercado nem uma indústria organizada de manutenção. Mas há espaço para a mudança. Mudança esta que não se resume simplesmente a trocar o combustível. “É uma cultura nova”, diz Edmilson. Os motoristas precisam aprender a lidar com um novo veículo.
Gás natural pelo mundo…
O uso de gás natural em caminhões e ônibus já é uma tendência. A análise de experiências bem-sucedidas foi inclusive parte da pesquisa. Em cidades na Espanha, Canadá, Suécia e Estados Unidos, por exemplo, houve uma significativa melhora na qualidade de vida da população, que passou a conviver com menos ruído e menos poluentes.
Outra etapa da pesquisa foi consultar montadoras com atuação no Brasil. Dentre elas, a Iveco, Man, Mercedes e Scania já possuem tecnologia para sustentar veículos pesados – como ônibus e caminhões – tendo o GNV como combustível. Isso representa um grande passo, afinal, como explicou Edmilson, é preciso que se desenvolva projetos com uso de gás natural para que essa opção se torne viável economicamente.
… e pelo Brasil
“O nosso gás nunca será tão competitivo quanto o gás americano”, enfatiza Edmilson. A localização do Brasil impede que o país se torne um grande exportador de gás. Ele está fora do circuito mais importante, entre Ásia, Europa e Oriente Médio. A produção e a tecnologia utilizadas não são páreo para outros grandes produtores, como Rússia e Estados Unidos.
Assim, o mercado ideal para o GNV brasileiro é o nacional. O estudo desenvolvido por Edmilson, parte do setor de Pesquisa e Desenvolvimento da Arsesp (Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo), é inovador na medida em que propõe uma solução básica: a mudança na frota de caminhões de lixo. Uma solução ambientalmente correta e economicamente vantajosa.
“É uma tecnologia consolidada. A inovação está em propor isso para o ambiente brasileiro e vender a ideia de que é uma aposta bacana para as cidades. Não é nada que precise inventar, só é preciso convencer os gestores da cidade e a própria população”, diz o professor.
Além de resolver os problemas ambientais já citados, o uso do GNV é viável nos sentidos políticos e econômicos. O Brasil se torna menos refém das políticas da Opep e utiliza de uma tecnologia já disponível e bem-sucedida em outras partes do mundo.
“O que a gente mostra é que o gás é tecnicamente mais fácil, barato e rápido de implementar que outras soluções – como ônibus elétricos. Além disso, atende perfeitamente uma agenda climática e, principalmente, uma proposta ambiental local”, conclui Edmilson.
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