A odontologia tradicional no Brasil aconselha a substituição de tratamentos dentários restauradores pré existentes, em detrimento de seu reparo. Esse foi o pontapé inicial para a dissertação de mestrado do pesquisador Ubiratan D’oro Junior, uma Análise da formação acadêmica e técnicas de reparos de restaurações pré existentes na rede de atenção em saúde bucal, na Faculdade de Odontologia da USP. Seu campo de estudo foram as Unidades Básicas de Saúde de Curitiba, cidade em que mora.
O objetivo era analisar 58 UBS, espalhadas por cinco distritos da capital paranaense. Ubiratan escolheu se limitar aos hábitos de profissionais que trabalhavam há mais de 12 meses na unidade selecionada. O pesquisador destaca a burocracia que enfrentou até que conseguisse começar a aplicar seu método. Ele teve que pedir autorizações ao comitê de ética de Curitiba, em um processo que se arrastou por meses e encurtou o período de dedicação ao estudo. Por isso mesmo, lamenta, não conseguiu explorar o espaço amostral que considerava ideal.
Ubiratan também se surpreendeu com a homogeneidade do protocolo curitibano. Escolhendo distritos com realidades sociais distantes, tentando absorver resultados diversos, viu cenários positivos em termos médicos, por mais que algumas unidades enfrentassem problemas com segurança.
Mas Ubiratan se disse satisfeito com as descobertas que fez em seu mestrado: apesar de não serem diretamente instruídos na faculdade, a maioria dos cirurgiões-dentistas prioriza recuperar e não substituir restaurações bucais. Para o pesquisador, a maior importância desse protocolo é o conforto acrescido ao paciente, já que o procedimento de remover a restauração é bem mais invasivo que o de apenas consertá-la.
Segundo estudos do doutor alemão Philipp Kanzow, no país germânico quase todas as Universidades já incluíram em seu programa orientação acadêmica para o reparo das restaurações, mesmo sem estabelecer parâmetros de diagnóstico ou qual a técnica a ser empregada diante dos defeitos. E essa é uma das maiores bandeiras levantadas por D’Oro: a de que as universidades brasileiras façam da reparação parte do currículo de formação da odontologia.
Ele explica que apenas a Uninove tem uma disciplina do gênero no Brasil, com uma doutora da faculdade compondo sua bancada de avaliação. Na USP e em outras universidades tradicionais, a matéria de dentística restauradora abrange tipos de materiais e condicionamento de tecidos, mas não tem uma aula específica de reparo.
Nas 10 unidades que acompanhou em Curitiba, com a autorização dos supervisores, ele observou que apenas um profissional se recusava a fazer reparos, um dentista da escola mais antiga da odontologia, próximo da aposentadoria.
A maioria dos profissionais nas Unidades Básicas tinham pelo menos uma pós-graduação, e se preocupavam com o material que utilizavam. Em algumas delas, para ter maior qualidade, os dentistas investiam do próprio bolso, mostrando parte da precariedade envolvida no setor público.
Bons materiais são uma questão sensível quando se fala de reparo. Ultrapassado, o amálgama é uma liga metálica que faz parte da velha guarda da profissão, e dificulta a visão de certos problemas no dente, como cáries. Hoje em dia, a referência na área é a resina composta. E a baixa adesão entre os materiais faz com que seja difícil reparar aliando amálgama e resina.
D’Oro defende que não optar pelo tratamento de substituição é prezar pela saúde bucal do paciente, a rapidez e longevidade do tratamento. Levando para um nível social e econômico, há economia de material e menor tempo de trabalho, já que a anestesia não é necessária no reparo.
O pesquisador vislumbra o estabelecimento de um protocolo que ofereça mais segurança ao profissional na hora do atendimento, determinando e ensinando as melhores formas de lidar com uma restauração, e incentivando que ela não seja feita repetidas vezes.
Como a USP exige exclusividade para o doutorado, e Ubiratan mantém um consultório em Curitiba, ele optou por não dar continuidade ao estudo no momento. Mas o pesquisador continua frisando que a ampla aceitação dos pacientes a iniciativa é um sinal de seus benefícios. “Não existe um preconceito com o procedimento de reparo, com uma breve explicação os pacientes aceitam de forma natural. A gente só vai remover o que precisa, e o stress é muito menor”.
Faça um comentário