O Parkinson é muito associado ao tremor nas mãos e pés e instabilidade motora geral, mas pouco se fala sobre os outros diversos prejuízos ao corpo. Com foco no controle cerebral da respiração, o laboratório da professora e pesquisadora Ana Carolina Takakura tem buscado estratégias farmacológicas para amenizar os efeitos da doença que ultrapassam sintomas motores.
Especificamente, os problemas respiratórios são associados à Doença de Parkinson (DP) desde sua descrição pelo próprio James Parkinson, em 1817. No trabalho, o inglês relata, dentre os sintomas apresentados por pacientes, algumas dificuldades de respiração. Entre a comunidade científica, sempre se acreditou que alterações respiratórias eram decorrência de uma situação enfrentada pelo paciente, conta a professora. “Ele apresentava pneumonia porque ficava muito tempo deitado. Apresentava apneia, mas não se sabia se isso era por conta da idade, motivo recorrente”, exemplifica Ana.
Indo além disso, o laboratório, da área de Farmacologia do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP, propôs como novidade o estudo da relação direta entre alterações respiratórias – seja a apneia do sono, sejam infecções como a pneumonia – e o controle da respiração realizado pelo cérebro.
O que se sabe das causas da DP está relacionado à deficiência de dopamina (um composto químico que transmite informação entre neurônios – um neurotransmissor) em uma região chamada substância negra. Essa área do cérebro está muito envolvida com o controle motor, o que evidencia os sintomas clássicos da doença. Um dos objetivos da pesquisa foi observar efeitos não motores que prejudicam igualmente a qualidade de vida dos pacientes. A partir disso, investigar se outros núcleos do cérebro – como os que controlam a respiração – também estariam sofrendo degeneração.
Projeções de neurônios
Até agora, o que se observou foi uma redução na frequência respiratória de animais modelos do Parkinson. Em situações tanto de repouso quanto de aumento de gás carbônico (CO2) – hipercapnia –, espera-se que o animal respire mais, mas a resposta está prejudicada; ele não atende tão intensa e claramente quanto o grupo controle. Essa última situação é importante, porque é semelhante ao que acontece na situação de apneia do sono. Quando isso ocorre, estruturas do sistema nervoso central (SNC), sensíveis ao aumento de gás carbônico, normalmente são ativadas, retomando a respiração do indivíduo. No modelo experimental da DP utilizado pela professora, o núcleo respiratório envolvido na detecção do CO2 está prejudicado.
No entanto, nem todas as regiões envolvidas no controle da respiração estão afetadas, o que trouxe dúvidas quanto à influência direta da alteração na substância negra. A professora explica que a substância negra se localiza em uma região anterior à dos núcleos respiratórios, que ficam no bulbo. E comenta que é preciso haver a morte na substância negra para que então os neurônios respiratórios sejam afetados: “se ela [substância negra] não for lesada, não há morte nos neurônios respiratórios”.
O que se investigou foi o quão diretas eram as projeções dos neurônios da substância negra para os da região bulbar, principalmente para a região que detecta as alterações de gás carbônico. E os resultados apontaram para a existência de projeções indiretas via outros núcleos que também estão degenerados.
Papel de prevenção
“A lesão da substância negra ocorre muito antes do que a lesão desses núcleos respiratórios, existe uma janela temporal”, explica a pesquisadora, que indica um intervalo de cerca de 20 a 30 dias em ratos entre a modificação na substância negra e a nos núcleos respiratórios.
Então, a partir da indução do animal ao comportamento da DP – feita com a injeção da droga 6-hidroxidopamina, que lesa a substância negra –, as alterações respiratórias somente surgirão em estágios mais tardios, com o desenvolvimento da doença. Daí a importância do papel da prevenção, de se buscar algum tratamento que antecipe e previna os problemas. “Se eu evitar as alterações respiratórias será que eu vou dar uma sobrevida maior para esse paciente já diagnosticado?”, questiona a professora de modo sugestivo.
Quanto aos tratamentos, os levantamentos ainda estão no início. O primeiro deles envolve o uso de um anti-inflamatório, já que tem se analisado o papel da inflamação nos núcleos respiratórios nesse modelo de Parkinson. Além dele, o grupo também começou a estudar o ômega 3, que também trabalha no combate à inflamação.
Existe ainda uma terceira terapia, que é a optogenética. Nela, há a possibilidade de tornar os neurônios remanescentes sensíveis à estimulação luminosa. É colocada uma fibra óptica na região respiratória do cérebro do animal que, ao ser acendida, promove uma resposta de ativação dos neurônios e uma melhora da respiração. Pretende-se, no futuro, testar um fármaco que possa substituir o laser ou a luz, fazendo o mesmo papel de reativação.
De todo modo, parte da pesquisa concluiu que o tratamento mais comum e indicado para o Parkinson, a levodopa, ajuda a controlar as alterações motoras, mas não reverte as modificações respiratórias. Importante, então, ter pesquisas na área da farmacologia que busquem alternativas para todos os tipos de sintomas da DP.
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