A doença de Alzheimer, problema neurológico degenerativo bastante conhecido por causar perda de memória em idosos, pode ser diagnosticada precocemente por biomarcadores. De acordo com uma pesquisa desenvolvida na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP), exames para verificar a presença de determinadas estruturas no cérebro dos pacientes são capazes de diagnosticar Alzheimer de maneira antecipada.
O diagnóstico precoce, feito antes da fase de demência, caracterizada pela deficiência cognitiva persistente e progressiva, pode auxiliar em um melhor tratamento e, assim, impedir que a doença se desenvolva, atingindo um estágio avançado de degeneração. “Quanto antes o diagnóstico, melhor será a perspectiva em relação a impedir o dano. E, até mesmo, se o diagnóstico for feito em uma fase antes do aparecimento dos sintomas clínicos, você pode evitar com que eles apareçam. Estamos falando de uma prevenção da demência”, explica Orestes Forlenza, pesquisador e professor associado do Departamento de Psiquiatria da Universidade. E, apesar desse impedimento da progressão ainda não ser totalmente possível, o professor aponta que é nesse sentido que a pesquisa caminha e vem cada vez mais avançando.
Esse aspecto também é bastante importante porque, segundo Orestes, até pouco tempo a presença de demência era um pré-requisito para o diagnóstico da doença de Alzheimer. “Recentemente isso foi revisto e as novas classificações já reconhecem a possibilidade de diagnosticar a doença antes de ocorrer demência. Então, você pode detectar um transtorno dito neurocognitivo leve, ou seja, um comprometimento menor, que ocorre antes da fase demencial”, explica o professor. Isso, por sua vez, foi um passo essencial para possibilitar a identificação de biomarcadores que sugerem a presença da doença.
No entanto, também é importante ressaltar que não necessariamente a presença de transtornos neurocognitivos leves e discretos indica um caso de Alzheimer no paciente, já que trata-se de uma condição muito presente no idoso. “Estudamos há vários anos o comprometimento cognitivo leve e ele não é sinônimo da doença de Alzheimer, mas entre esses indivíduos estão aqueles que vão desenvolver”, diz o professor, que pesquisa o assunto há 12 anos. Para ele, é importante que se reúna os recursos clínicos com os marcadores biológicos. Ou seja, é essencial associar os marcadores biológicos com o perfil sugestivo de sintomas da doença na sua fase pré-demencial, diagnosticados por médicos por meio de exame psíquico e neurológico das funções cognitivas. “Assim, é possível reforçar a impressão diagnóstica de que aquele estado clínico provavelmente é devido a doença de Alzheimer”, completa.
Funcionamento dos biomarcadores
No caso dos biomarcadores voltados a doença, eles podem ser colhidos tanto por imagem cerebral, como por exame do líquor, um líquido cefalorraquidiano que banha o cérebro e a medula. Assim, ao se fazer uma análise, caso haja a identificação de algumas estruturas cerebrais, que apresentam uma taxa metabólica menor em relação a outras, são altas as chances do paciente de fato estar em uma fase precoce da doença. Trata-se da chamada “Equação ATN”, sigla que significa amilóide, tau e neurodegeneração. Em outras palavras, se os exames evidenciarem a presença de amilóide (substância glicoproteica), acúmulo de tau (proteína encontrada nos neurônios) e a ocorrência de neurodegeneração, significa que o paciente apresenta a tríade que costuma indicar Alzheimer. Segundo Orestes, a eficiência desse diagnóstico é de 95%.
Esses exames e a identificação dos biomarcadores são importantes para evitar diagnósticos equivocados da doença, além da realização de tratamentos desnecessários e ineficientes. “Os estudos foram mostrando que existem pessoas que só apresentam amilóide, e só esse biomarcador não é o suficiente para dizer que trata-se da doença de Alzheimer. Porém é um indicador de que um processo patológico relacionado a doença está ali presente”, explica. Assim, sem uma análise de todos os marcadores biológicos de forma conjunta, acabaria ocorrendo uma grande quantidade de casos de falsos positivos.
Tratamentos e imunização
Atualmente, existem tratamentos farmacológicos e não farmacológicos para a doença, uma cura ainda não foi encontrada. No Brasil, o Sistema Único de Saúde oferece, de maneira gratuita, alguns medicamentos. Nenhum deles impede uma evolução do Alzheimer, mas podem amenizar ou retardar os efeitos da demência. Além disso, alguns treinos e exercícios de memória e cognitivos indicados por profissionais também proporcionam benefícios.
Os biomarcadores, por sua vez, podem guiar ainda a criação de uma imunização contra a doença, evitando que pessoas tenham Alzheimer, já que eles possibilitaram a identificação das estruturas cerebrais envolvidas na patologia. O desenvolvimento de drogas capazes de impedir a progressão da demência também é possível graças aos marcadores biológicos. “No nosso horizonte, existem algumas drogas candidatas a terapia modificadora da doença. Conhecendo bem o processo patológico e o que causa a morte neuronal, você pode desenvolver recursos terapêuticos para modificar esse processo e tentar interromper a degeneração”, completa Orestes.
Afetando o dia a dia
Por ser uma doença que afeta de forma progressiva as funções cerebrais, ela interfere totalmente na forma de vida das pessoas, por causar a perda da autonomia. ”Na medida em que o Alzheimer progride, a pessoa se torna dependente de alguém para cuidar dela e fazer as coisas que deixou de ser capaz. É uma doença com altíssimo custo direto e indireto, porque não só a pessoa deixa de ser produtiva, mas outra também vai deixar de ser para cuidar daquela que adoeceu”, diz Orestes.
A doença é conhecida principalmente pela perda de memória, mas pode apresentar também outros sintomas como dificuldade para falar, coordenar movimentos e ainda incontinência urinária e fecal. Dependendo do estágio da doença, esses sintomas podem aparecer ou não, ou ser mais ou menos intensos.
Assim, trata-se de uma patologia que afeta a realização de tarefas diárias simples — como até mesmo se alimentar, andar e falar, em casos mais avançados da doença. Comumente, ela se inicia de forma leve e vai se agravando com o passar do tempo e, essa progressão costuma acontecer de forma lenta, pois o processo degenerativo leva em média de 8 a 12 anos para instalar-se completamente. “É uma doença socialmente muito impactante”.
Ótimas informações sobre a perda da função cognitiva!!!