O exercício aeróbico, aquele de intensidade leve a moderada, e que pode ser realizado por bastante tempo, como a caminhada, promove a redução da pressão arterial de hipertensos. A partir desse conhecimento, a pesquisa do aluno de doutorado da Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) da USP, Leandro Brito comprovou que o treinamento noturno dessa atividade é mais benéfico em relação ao realizado pela manhã.
O pesquisador explica que há dois fatores de maior impacto no controle da pressão arterial: o débito cardíaco e a resistência vascular periférica. O primeiro fator consiste na quantidade de sangue bombeada do coração para o organismo em um minuto. Já a resistência vascular periférica é a dificuldade que o sangue tem para passar pelos vasos sanguíneos, compreendida pela contração ou dilatação desses vasos. Leandro esclarece que o exercício não interfere no bombeamento do sangue, mas facilita a sua circulação pelos vasos. A consequência é a diminuição da pressão arterial.
Aluno do Laboratório de Hemodinâmica e Atividade Motora (Laham), Leandro havia estudado esse fenômeno em seu mestrado: “No estudo anterior, verificou-se que agudamente, ou seja, sob o efeito de uma sessão, durante à noite há uma maior redução da pressão arterial ocasionada pela maior diminuição da resistência vascular periférica. E, embora seja muito relevante estudar a consequência de uma única sessão, o que de fato importa é se a diferença entre os horários persiste no treinamento por muito tempo. Então foi uma sequência quase que natural estudar se o efeito é perpetuado após um período de treinamento.”
Assim, o estudo recrutou 50 homens hipertensos medicados de 30 a 65 anos distribuídos em 3 grupos: aqueles que se exercitaram pela manhã, os que praticaram a atividade pela noite e um grupo de controle. Enquanto os grupos de manhã e noite participaram de sessões de cicloergômetro (bicicleta), os indivíduos de controle fizeram alongamentos. A pesquisa avaliou a pressão arterial clínica e a arterial ambulatorial antes do estudo e depois de 10 semanas de treinamentos. Pressão arterial clínica é aquela medida na consulta médica, já a ambulatorial é uma medição realizada durante um período de 24 horas através de um aparelho eletrônico. As medições clínicas foram feitas em dois momentos do dia para todos os grupos, das 7 às 9h e das 18 às 20h.
Embora os indivíduos que praticaram os exercícios pela manhã também apresentaram redução da pressão arterial sistólica nas avaliações realizadas pela manhã, os dados apresentaram maiores mudanças nos indivíduos que praticaram o exercício durante a noite. Um exemplo determinante foi a maior diminuição da pressão arterial sistólica (máxima) na primeira avaliação, feita pela manhã. Além disso, a segunda medição do dia apresentou um padrão em que a pressão arterial sistólica foi reduzida apenas no grupo de praticantes da atividade física noturna. Dessa forma, ficou comprovado que ambos os horários de exercício trazem benefícios. No entanto, aqueles que praticam a atividade pela noite têm um benefício adicional na redução da pressão arterial.
Diante desse achado, Leandro explica que os próximos passos da pesquisa podem seguir vertentes diferentes. “Um aspecto a estudar é o mecanicista, entender os mecanismos que estão por trás do benefício clínico que encontramos.” Nesse sentido, um dos fatores citados é o mecanismo que funciona como um regulador de curto prazo da pressão arterial, a sensibilidade barorreflexa. O pesquisador explica que essa sensibilidade atua de acordo com a pressão sanguínea exercida sobre as artérias assim que o sangue sai do coração. “Há um comando para o sistema nervoso central no sentido de diminuir ou aumentar a pressão arterial. O hipertenso tem o ponto de operação [o ideal] alterado, trabalhando, assim, a partir da medida 14:9”. A perda dessa sensibilidade muda a resposta do organismo, que tem mais dificuldade para manter a pressão em nível adequado. Leandro esclarece que essa medição foi feita no presente estudo. A houve uma melhora mais significativa nos praticantes noturnos.
O pesquisador conta que a descoberta abre outro caminho de estudo, com o aprofundamento de questões clínicas, voltado para o teste de hipóteses em populações específicas. “Isso é um primeiro passo porque ninguém havia feito esse tipo de comparação ainda. Mas há a possibilidade de aplicação para pessoas com dificuldades de responder ao tratamento e até mesmo ao próprio exercício físico, do ponto de vista da pressão arterial”.
Portanto, Leandro elenca três exemplos de possíveis aplicações a serem testada em estudos futuros. O primeiro deles é dos hipertensos resistentes, que precisam tomar três ou mais classes de medicamentos anti-hipertensivos e ainda assim não têm a pressão controlada. Outro exemplo são os indivíduos não-dipper. Eles não têm a diminuição da pressão durante o período de sono, que deve ser de, no mínimo, 10% em relação aos valor médio de pressão desses indivíduos quando estão acordados. “Sem essa queda, o indivíduo tem maior risco de desenvolver problemas cardiovasculares no futuro, lesão de outros órgãos, como os rins, ou até mesmo morrer por evento cardiovascular. Essa classe responde menos ao exercício e, assim, fazer a prática noturna pode ser válida. O terceiro exemplo é de afrodescendentes: “diversos estudos mostram que essa população tem menor resposta ao treinamento físico (exercícios) em comparação às populações asiática e caucasiana.”
Em 2017, O estudo de Leandro, orientado pela professora da EEFE, Dra. Cláudia Forjaz, e o professor da Universidade do Oregon, John Robert Halliwill, recebeu premiação no 17º Simpósio de Educação Física do 37º Congresso da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo, como segundo melhor estudo de pesquisa clínica.
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