
Dissertação de mestrado de Misleide Falbe, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP, apresenta novas abordagens para o tratamento de transtornos de ansiedade. A pesquisa revisou a bibliografia em busca de peptídeos, ou seja, proteínas, bioativos moduladores dos receptores GABA-A. A pesquisadora, que identificou a Alpha-Casozepina, ressalta que substâncias como a identificada promovem efeito ansiolítico sem os efeitos colaterais dos medicamentos convencionais, como dependência e tolerância.
O estudo focou em identificar peptídeos bioativos com potencial ansiolítico para oferecer uma alternativa aos tratamentos atuais, como os benzodiazepínicos. Esses são proteínas de interesse farmacológico por não só ampliar as opções terapêuticas, mas também proporcionar mais segurança aos pacientes por reduzir os riscos associados e melhorar a adesão ao tratamento em uma população cada vez mais preocupada com os efeitos colaterais dos medicamentos.
“Os peptídeos bioativos podem ser uma alternativa de baixa toxicidade. Seus produtos de degradação são aminoácidos, que não são tóxicos, o que gera uma aceitabilidade muito grande por parte da população”, defende Falbel.
Falbel destaca que, diferente de muitos medicamentos convencionais para ansiedade, “os peptídeos bioativos não geram resíduos tóxicos no organismo”. Essa característica é um dos principais atrativos dessa classe de compostos, que oferece aos pacientes uma alternativa terapêutica mais segura contra efeitos como tolerância e dependência e que pode reduzir o estigma associado ao uso prolongado de ansiolíticos.
Alternativas ao convencional
“Eles agem em receptores GABA A e, ao se ligarem a estes receptores, permitem a abertura de canais de cloro. O cloro, ao adentrar o canal iônico, negativiza a voltagem da membrana, o que gera uma hiperpolarização que significa efeito ansiolítico, ou seja, redução da excitabilidade central”, explica a mestre. Apesar do potencial deles, ainda não há produto disponível no mercado brasileiro. Para que isso aconteça, é necessário avançar em ensaios clínicos com humanos, uma vez que maioria dos testes feitos mantiveram-se em laboratório ou em animais.
“O problema se trata de uma base cultural”, explica Falbel. “A falta de consciência sobre a importância de desenvolver tratamentos menos tóxicos resulta em portas fechadas para pesquisas alternativas”. O desafio atual é expandir os ensaios in vitro para modelos clínicos em seres humanos. “Apenas assim poderemos avaliar seu potencial completo como alternativa segura aos ansiolíticos convencionais”, continua.
A equipe da USP da qual ela faz parte também investiga como alimentos probióticos com essas proteínas podem ser incorporados à dieta para auxiliar no controle da ansiedade. “O iogurte e outros produtos fermentados podem liberar esses peptídeos durante o processo de fermentação, atuando como coadjuvantes ao tratamento e melhorando o bem-estar sem substituições medicamentosas radicais”, explica.
Experiência pessoal como motivação
Durante a pandemia, a pesquisadora foi diagnosticada com transtorno de ansiedade, o que a motivou a mudar o foco de seu trabalho acadêmico. Originalmente, sua pesquisa no mestrado investigava iogurtes probióticos e suas propriedades benéficas. Com o diagnóstico, a pesquisadora decidiu direcionar sua pesquisa para entender melhor o que ocorre no cérebro de pessoas com ansiedade e explorar como essas moléculas de interesse poderiam aliviar esses sintomas.
Ela destaca o impacto que a nova classe de ansiolíticos baseada poderia ter na saúde mental pública. Com tratamentos menos agressivos e focados em compostos naturais, ela acredita que o estigma em torno dos medicamentos para saúde mental possa ser reduzido. “A demonização dos medicamentos tradicionais gera medo na população e um tratamento mais natural pode ajudar a reverter essa resistência”, afirma.
Com o avanço dos estudos em neurociência e bioquímica, a busca por tratamentos ansiolíticos mais seguros se torna cada vez mais urgente. A nutricionista destaca que a preocupação com os efeitos colaterais dos medicamentos convencionais precisam impulsionar novas abordagens terapêuticas. Segundo a pesquisadora, cerca de uma em cada três pessoas nos países em desenvolvimento, como o Brasil, apresenta algum transtorno de ansiedade e muitos recorrem a benzodiazepínicos; medicamentos eficazes, mas acompanhados por efeitos colaterais que podem levar à descontinuidade do tratamento.
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