Pesquisa estuda o primeiro caso de mutualismo entre espécies de formigas do mesmo gênero

Pesquisa desenvolvida no Departamento de Psicologia Experimental do Instituto de Psicologia da USP (IPUSP) pode ser uma descoberta inédita para a ciência do comportamento animal

Ninhos mistos com indicação de espécies [Imagem: Reprodução/Thalles Rocchel Bezerra Muniz]

A hipótese inédita levantada pelo pesquisador Thalles Muniz propõe o primeiro caso registrado de interações de cooperação entre espécies diferentes de formigas do mesmo gênero. Coletadas no município de Ilhéus, no sudeste da Bahia, as três espécies de formigas S. subedentata, S. schulzi e S. denticulata do gênero Strumigenys estão sendo observadas no laboratório de Psicologia e Comportamento Animal da USP.

Trata-se de um caso diferente da “regra comum” da família Formicidae. A professora e orientadora da pesquisa, Ronara Souza revela que “a regra básica da formiga é: ela é fechada na mesma colônia, com a própria rainha e as próprias operárias que trabalham naquela mesma colônia. Então, é como se fosse uma sociedade fechada e protegida. Mas, a formiga nunca funciona só pela regra.”

De todas as estimadas mais de 20 mil espécies de formigas existentes, apenas 3% vivem a partir da relação interespecífica do parasitismo, na qual uma tira vantagem da outra. Ronara explica que, nesses casos, trata-se de uma adaptação evolutiva em que uma espécie cria estratégias, sejam químicas, de comunicação ou de comportamento, para burlar a defesa inicial de colônias de outra espécie e conseguir entrar. Assim, essas formigas parasitárias garantem a sobrevivência e sucesso na reprodução.

3.A: S. schulzi; 3.B: S. denticulata; 3.C: S. subedentata; durante as análises de comportamento por microscópio e vídeo, as espécies são diferenciadas pelo tamanho da mandíbula [Imagem: Reprodução/Thalles Rocchel Bezerra Muniz]
A possibilidade estudada por Muniz vai muito além disso e traz a chance da espécie ter evoluído para um tipo de relação benéfica para ambas as partes envolvidas. “Ainda não há nenhum registro de que, em sociedade com espécies diferentes de formigas, as duas têm um benefício”, explica o pesquisador, “em alguns casos, o que acontece é: uma se beneficia e a outra não tem nenhum prejuízo, por exemplo, quando elas têm tamanhos muito diferentes, a menor pega resíduos da outra, mas não gera impacto nenhum.”

Durante a pesquisa, as colônias coletadas foram armazenadas em ninhos artificiais, filmadas por longos períodos e os comportamentos e interações entre as espécies foram observados considerando as variáveis de disponibilidade de comida, quantidade de larvas e organização. O que o pesquisador constatou é que as duas espécies fazem todas as funções de forrageamento, proteção do ninho, limpeza e transporte de larvas, o que caracteriza uma relação ecológica de benefício mútuo (mutualismo).

Ninho artificial confeccionado com mistura de gesso e carvão [Imagem: Reprodução/Thalles Rocchel Bezerra Muniz]

Além de definir que tipo de relação ecológica há entre as duas espécies, o pesquisador quer saber também de que forma essa divisão de tarefas é feita. “Para haver a relação de mutualismo, existem várias possibilidades. Todos podem fazer as mesmas tarefas, pode ser que umas façam mais uma tarefa do que outras (em frequência ou por mais tempo). E é isso o que Muniz está buscando entender”, comenta Ronara.

Para isso, o pesquisador analisa 12 colônias por meio de gravações microscópicas de 10 horas cada uma. Assim, ele contabiliza as interações (quantificando duração e frequência para cada espécie) nesse período e busca um padrão para construir dados concretos. As interações entre as rainhas de cada colônia também são consideradas, mas a hipótese geral que está sendo comprovada e analisada é de que não haja comportamentos agressivos entre as espécies, mas de cooperação.

A defesa da dissertação de mestrado ocorrerá em agosto de 2024 e será aberta ao público. Fique atento no site do Instituto de Psicologia da USP (https://www.ip.usp.br/site/defesa/) para não perder.

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