A China e os Estados Unidos, as maiores potências econômicas da atualidade, têm uma relação marcada por tensões diplomáticas e disputas comerciais desde a ascensão chinesa, que ameaça a hegemonia estadunidense, intacta desde o fim da Guerra Fria (1947 – 1991). Com a crescente demanda mundial por tecnologia, o desenvolvimento de modalidades como a Inteligência Artificial (IA) se tornou palco de disputa entre as nações, que visam consolidar seu poder geopolítico.
Luiza Nonato, autora da tese de doutorado Relações de poder na era da Inteligência Artificial (IA): a competição estratégica entre Estados Unidos e China pela liderança da IA, orientada pelo professor Yi Shin Tang e defendida no Instituto de Relações Internacionais (IRI) da USP, apresentou para a Agência Universitária de Notícias (AUN) detalhes sobre como a tecnologia é usada como elemento estratégico para o desenvolvimento econômico.
História: A relação entre China e Estados Unidos
As tensões entre China e Estados Unidos têm suas raízes no século XX, quando, no contexto da Guerra Fria, a nação asiática adotou um regime socialista com a ascensão de Mao Tsé-Tung, contrariando os interesses norte-americanos, que visavam consolidar o modelo socioeconômico capitalista em detrimento do socialismo soviético.
Ainda que os dois países tenham se aproximado após o governo chinês romper com a União Soviética, principal oponente dos EUA durante o conflito ideológico, o fato de a China permanecer sob um governo de esquerda é uma das razões para as atuais tensões diplomáticas entre as nações. “Os Estados Unidos encaram a China como uma ameaça aos valores democráticos e aos direitos humanos, um país que não respeita a privacidade, monitora cidadãos e minorias. Então eles fazem um alerta para o mundo como se a China fosse, de fato, uma ameaça para esse sistema que é dominado pelos Estados Unidos”, afirma Luiza.
Para além da questão ideológica, a relação entre os EUA e a China é marcada também por disputas comerciais, decorrentes do crescimento financeiro chinês a partir da década de 1980, que colocou a economia do país no posto de segunda maior do mundo. Desde então, o governo estadunidense considera a China uma ameaça à sua hegemonia no sistema internacional e tem tomado medidas de proteção econômica, como o aumento de tarifas, para conter o avanço de seus produtos em território norte-americano.
A disputa pela Inteligência Artificial
A Inteligência Artificial (IA) corresponde a sistemas que apresentam comportamento inteligente a partir de análises do ambiente e que atuam com um certo grau de autonomia. Também chamada de dual use technology (tecnologia de uso duplo), ela pode ser empregada para fins civis e militares. “Os países estão vendo a IA como o motor da economia do futuro, tanto para desenvolvimento econômico quanto militar. Isso fica muito explícito nos documentos dos próprios governos dos Estados Unidos e da China: eles colocam a IA como elemento estratégico do futuro, como se o país que não aderir ao uso da tecnologia fosse ser prejudicado”, aponta Nonato.
Dessa forma, o domínio sobre o desenvolvimento e a governança da IA constitui uma maneira de garantir a influência geopolítica de um país sob os demais, além da manutenção de seus interesses políticos e econômicos. “Quando as regulações e as regras sobre o uso da Inteligência Artificial começarem a sair, elas estarão mais atreladas ao modelo do país que vencer a disputa, seja o chinês ou o estadunidense. Então, quando, de fato, um derrotar o outro, ele irá fazer valer a sua visão de mundo”, explica a pesquisadora.
As consequências do conflito entre a China e os Estados Unidos atingem as demais nações do globo, que ficam sujeitas a medidas adotadas pelos países em embate, como sanções econômicas. “Tanto o governo chinês quanto o norte-americano podem aplicar retaliações comerciais que podem restringir o espaço para as nações que não estiverem ligadas ao modelo dominante”, aponta Luiza.
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