Dissertação de mestrado avalia variações ambientais na zona marinha do sul do Brasil

Acúmulos de lama no fundo do oceano podem servir como registro das transformações do planeta ao longo do tempo geológico

[Imagem: Pedro Balle/ USP Imagens]

No dia 03 de maio, a mestranda Caroline Aparecida Pereira Dias, do Instituto Oceanográfico da USP (IO-USP), defendeu a dissertação “Avaliação de variações ambientais através da composição elementar de sedimentos de mudbelts da plataforma continental sul do Brasil”. O trabalho se baseia na análise do material recolhido durante as expedições do navio oceanográfico Alpha Crucis ao longo da costa sul do Brasil, evento que foi noticiado no ano de 2019, em uma matéria da Agência Universitária.

As plataformas continentais são extensões submersas dos continentes que vão desde a zona costeira até a profundidade de aproximadamente 200 metros. Sujeitas a diferentes eventos e processos, causados tanto pelo ser humano como pela natureza, essas plataformas podem acumular diferentes tipos de sedimentos sobre suas superfícies, como os mudbelts – cinturões de lama, traduzido para o português. 

A partir da análise da composição química destes materiais, o estudo da mestranda conseguiu verificar as variações ambientais que ocorreram ao longo de, aproximadamente, dez mil anos e que correspondem a duas épocas geológicas: o Holoceno, nome dado para o intervalo que se inicia 11,7 mil anos atrás; e Antropoceno, nomenclatura proposta para o período dos últimos dois séculos, caracterizado pela intensa e crescente interferência humana nos ambientes naturais. 

Pontos de coleta dos sedimentos foram analisados na tese, ao longo do litoral sul brasileiro. Na imagem foram representados pelos triângulos 576, 564 e 557. [Imagem: Reprodução/Caroline Aparecida Pereira Dias]
Após a análise e a separação dos sedimentos retirados durante a expedição, foram notadas alterações correspondentes tanto a eventos naturais, quanto a eventos oriundos de intervenções humanas. Sobre os impactos antrópicos, a mestranda ressalta que várias atividades humanas, como a queima de combustíveis fósseis, a descarga de efluentes industriais e domésticos e a mineração, podem ter provocado variações nestas plataformas: “Observamos o enriquecimento de alguns metais presentes nos mudbelts desde a década de 1930, o que pode estar associado ao início da Revolução Industrial no Brasil”.

Variações nos fatores de enriquecimento do elemento níquel e no índice SPI (Sediment Pollution Index – Índice de Poluição de Sedimentos) em uma das bases de coleta de material, o que indica o enriquecimento de metais ao longo dos últimos duzentos anos [Imagem: Reprodução/Caroline Aparecida Pereira Dias]
Além disso, um outro fator que influenciou nos resultados da mestranda é a proximidade dos materiais recolhidos com o Rio da Prata. De acordo com Caroline, esse cenário pode ter relação com o fluxo de compostos provenientes de atividade humana na América Latina que foram depositados nesse rio: “Nós realizamos medições em testemunhos ao longo de todo litoral sul do Brasil e percebemos que quanto mais próximo do sul, ou seja, quanto mais próximo do Rio da Prata, mais alterações de origem antrópica havia na composição dos metais”. 

Segundo a pesquisadora, até mesmo compostos emitidos para a atmosfera podem influenciar os mudbelts. Para exemplificar isso, ela cita a grande utilização de compostos enriquecidos em chumbo na gasolina consumida na América do Sul entre as décadas de 1930 e 1990: “Há estudos que indicam que esse chumbo foi para atmosfera e acabou sendo depositado no oceano.”

Variação do nível do mar ao longo do Holoceno (anos AP = anos antes do presente) [Imagem: Reprodução/Caroline Aparecida Pereira Dias]
Caroline finaliza que as alterações observadas nos mudbelts servem de testemunho da interferência humana na zona marinha do sul do Brasil. A mestranda, garante, porém, que as concentrações de metais encontradas ainda não indicam níveis de contaminação na região, nem possíveis consequências negativas para os ecossistemas marinhos.

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