O fim da Guerra Fria, durante o início da década de 90, juntamente com o advento da internet e outras tecnologias, tornaram o mundo muito mais conectado, representando assim uma revolução no campo da comunicação. Tal revolução, a consequente integração internacional e a propagação do sistema capitalista pelo mundo demarcam o começo do processo conhecido como globalização.
Apesar de seu crescimento acelerado durante a primeira década do século XXI, ao longo dos últimos anos, a globalização vem enfrentando uma série de questionamentos e críticas a respeito de sua função e desempenho. Enquanto alguns argumentam sobre reformulações em sua estrutura, outros tecem críticas a respeito de seus reais benefícios, com alguns acontecimentos no mundo sendo reflexos disso, como por eventos como o Brexit, as declarações do ex-presidente norte-americano Donald Trump, ou mesmo pelo modelo de política externa brasileira, adotado pelo ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo.
Indagações sobre o papel e a influência da globalização nas democracias ao redor do mundo se tornaram as críticas mais recentes e incisivas sobre esse fenômeno. A busca por uma análise sobre outras perspectivas, e a descoberta assim de possíveis novas respostas para tais críticas formam a base da tese de doutorado de Marketa Maria Jerabek, em pesquisa elaborada no Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais no Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (IRI – USP), em conjunto com o King’s College London (KCL).
Muitos dos debates a respeito dos rumos da globalização possuem visões antagônicas, praticamente sendo divididas entre os pró-globalistas e os antiglobalistas. Os argumentos são muitas vezes binários, o que levou a pesquisadora a procurar novas abordagens sobre o assunto, propondo que, para a questão envolvendo globalização e democracia, uma análise multidimensional da relação de ambos deva ser utilizada.
Em “A globalização afeta a qualidade da democracia? Uma proposta para respostas mais sutis”, Jerabek analisa as diferentes dimensões da globalização, e como elas são de suma importância e relevantes em todas as determinantes que compõem os vários aspectos da qualidade da democracia.
“Olhar para dimensões diferentes é importante em dois sentidos: Primeiro, as diferentes dimensões da globalização não necessariamente andam de mãos dadas. Isso significa que, por exemplo, um país economicamente globalizado não é necessariamente globalizado da mesma forma nas dimensões políticas e sociais, e vice e versa”, explica Jerabek. “Brasil e Estados Unidos possuem níveis similares de globalização no que tange às finanças e comércio, mas o Brasil é ultrapassado pelos EUA na esfera cultura, política e principalmente na globalização da informação” complementa.
A pesquisa utiliza dados das democracias ao redor do mundo separadas em dois momentos distintos da história contemporânea: de 1970 a 1991, analisando informações de 57 países, e de 1991 a 2017, com um total de 115 democracias. O período pós Guerra-Fria concebeu um grande número de novas democracias, em diferentes estágios de desenvolvimento.
Os fatores analisados durante a pesquisa para a comparação entre os diferentes países foram liberdade de expressão, liberdade econômica, acesso e proteção igualitária e a qualidade das eleições. Aspectos da globalização como influências culturais, políticas, comerciais e de informação também foram levados em consideração.
Além disso, a qualidade da democracia pode evoluir de maneiras diferentes, visto que apesar dos aspectos que a compõem estejam interligados, eles não necessariamente são desenvolvidos de maneira igual. “Moldávia e Guatemala demonstram como os aspectos da qualidade da democracia podem ser desenvolvidos de maneira diferente. Enquanto ambos possuem níveis de liberdade econômica e qualidade das eleições, diferem muito no que diz respeito a liberdades individuais e acesso igualitário.
A pesquisadora propõe que apesar da qualidade das democracias serem de fato afetadas pela globalização, elas se dão por meio de fatores diferentes. “A liberdade de expressão, acesso e proteção igualitária são os fatores mais afetados pela globalização social. Entretanto, durante o período pós Guerra-Fria, tanto as democracias jovens e antigas se beneficiaram do aumento da disseminação da informação causada pela globalização”.
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