Uma série de experimentos que comprovaram a ação da sinalização do GH (hormônio do crescimento) no sistema nervoso central, sobre a qual pouco se sabia com certeza até então, foi conduzida no Instituto de Ciências Biomédicas da USP. Há alguns anos o grupo de pesquisa tem estudado a importância da sinalização do hormônio do crescimento em populações neuronais responsáveis por regular o metabolismo.
Os neurônios nos quais o estudo foca são os chamados GABAérgicos e glutamatérgicos, os mais abundantes do sistema nervoso central. Os neurônios GABAérgicos produzem o Ácido gama-aminobutírico (mais conhecido por sua sigla em inglês – GABA), que é o principal neurotransmissor inibitório do sistema nervoso central. Isso significa que ele atua em ações relacionadas à agressividade e impulsividade humanas, inibindo o sistema nervoso central e causando sedação. Já os neurônios glutamatérgicos são produtores de glutamato, o principal neurotransmissor excitatório. Acredita-se que ele esteja envolvido em funções cognitivas como aprendizado e memória e sua função é contrária à do GABA, ele excita o sistema nervoso.
Inicialmente, foi feito um mapeamento dos neurônios GABAérgicos e glutamatérgicos responsivos ao GH presentes em áreas das regiões septal, amígdalas, hipotálamo e tronco encefálico de camundongos. Depois os receptores de GH dos neurônios foram desativados e foram feitos diversos experimentos para entender os efeitos da falta da sinalização do GH nesses neurônios no controle do balanço energético e homeostase glicêmica dos animais. “Os animais sem o receptor de GH nos neurônios GABAérgicos apresentaram maior peso corporal”, conta Willian.
Os testes foram feitos para avaliar a homeostase glicêmica, o gasto energético, o consumo de oxigênio, a quantidade de gás carbônico que os animais produziam e o quanto eles andavam. Em um deles, os camundongos receberam uma dose de uma droga análoga à glicose (2-Deoxi-d-glucose), a fim de simular uma situação de hipoglicemia. Esperava-se que os animais produzissem mais glicose para compensar o cenário simulado. Em outro teste os camundongos receberam apenas 40% da quantidade de comida à qual estavam acostumados por 5 dias. Depois, sua composição corporal e peso foram analisados.
Foi observado que os animais machos produzem mais IGF-1, uma proteína do fígado em resposta ao GH com papel importante no crescimento, desenvolvimento da musculatura, diminuição dos níveis de glicose no sangue, redução dos níveis de gordura corporal, alteração na oxidação lipídica e aumento da síntese de proteínas. Isso indica que nesses animais, os efeitos negativos do GH são minimizados.
Também foi observado que os neurônios responsáveis por controlar a produção do GH são os GABAérgicos e que em situação de restrição alimentar, os neurônios GABAérgicos que possuem receptor de GH são responsáveis por economizar energia. Esse resultado é parecido com o de outro trabalho publicado recentemente pelo grupo do laboratório. Nele, se observou que a sinalização do GH em neurônios AgRP é importante em situações de privação alimentar, porque esses neurônios são responsáveis por diminuir o gasto energético nesse tipo de situação.
No fim, os camundongos sem receptor de GH nos neurônios glutamatérgicos apresentaram um peso menor em comparação com os outros grupos. O motivo para isso ainda está em estudo. Os animais machos sem receptor de GH nos neurônios glutamatérgicos também apresentaram maior consumo alimentar e maior gasto energético. Segundo Willian, a literatura da área prevê que animais sem o receptor de GH em todo o corpo também costumam apresentar maior consumo alimentar. Em comparação com os resultados obtidos, pode ser que a falta da sinalização do GH nos neurônios glutamatérgicos seja o responsável por esse aumento no consumo alimentar.
“O aumento do gasto energético pode ser uma compensação do organismo devido ao maior consumo alimentar desses animais.” De acordo com nossos resultados, a sinalização do GH nos neurônios glutamatérgicos é importante para a regulação da homeostase glicêmica, consumo alimentar e a resposta contra-regulatória à glicoprivação, explica o pesquisador.
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